quinta-feira, 2 de julho de 2015

SAÚDE EM FOCO



JORNAL ESTRANGEIRO DESTACA O SUS E ESQUECE A SAÚDE DA POPULAÇÃO

Dando sequencia à análise das práticas de gestão do SUS, como as feitas no artigo anterior sobre o destaque dado pela OMS sobre o SUS e das suas contradições em relação à deficiência de assistência decorrente da falta de investimento no setor da saúde pública, vamos comentar um documento divulgado pelo The New England  Journal of Medicina. No artigo anterior foram mostrados os dados orçamentários do Sistema Integrado de Administração Financeira (SIAFI) do próprio governo e da World Haealth Statistics 2014, sobre os valores de investimentos nos últimos 10 anos.
Chamaram-nos atenção os comentários e a publicação sobre o SUS no milenar periódico The New England  Journal of Medicina, que desde 1812 divulga pesquisas e os avanços da Medicina mundial. O artigo, publicado em 12/06/2015 por James Macinko e Matthew J. Herris faz um trajeto histórico do SUS desde a sua fundação no Ceará na década de 90 até a implantação da Estratégia Saúde da Família (ESF), considerando esse programa como um fato "notável" na saúde publica mundial. O que nos parece na prática é o que o jornal enaltece as teorias contidas nas normas e preceitos da legislação, oriundos da Constituição Federal de 1988, como a questão da universalização da saúde, dizendo que nossa prática pode ser aprendida e difundida a nível mundial. Contudo, ignora a verdadeira realidade da saúde local.
No entanto, apesar do destaque ao nosso sistema oficial de saúde, os pesquisadores citados elogiam o sucesso do programa ESF e, ao mesmo tempo, tecem comentários de que o "atendimento básico a comunidade funcionaria se feito de maneira adequada", exigindo  "um planejamento sólido, visão de longo prazo, compromisso político e financiamento". Aqui nesses pontos o artigo se contradiz ao elogiar a nossa prática cotidiana, vivenciada pela população que cada vez fica mais desassistida, devido à falta de gestão e investimento. Apesar da publicação cientifica ser importante e de prestigio mundial, a avaliação positiva do SUS e da saúde brasileira não acompanha a realidade das comunidades locais que possuem os serviços básicos deficientes e de outras que não possuem nenhum serviço de saúde, como na Amazônia e no agreste nordestino.
A maior constatação que comprova essa discrepância da avaliação do periódico e da realidade da gestão da saúde pública brasileira são os cortes históricos nos gastos e as quedas de investimentos na última década, como mostrados no artigo anterior, justamente no período avaliado pelo semanário internacional. "Essa perda acumulada ao longo de pouco mais uma década ultrapassa a casa de R$ 120 bilhões", como destaca o editorial do Jornal Medicina do CFM, de abril/15,como o título "A saúde no Vermelho". Como o Brasil pode servir de modelo para o mundo e para países mais pobres se os próprios legisladores e gestores, que criaram o SUS, são os primeiros a legislar em causa própria, retirando dinheiro do SUS e exigindo verbas para emendas parlamentares? Mas foi o que fez o Governo Federal que acatou o chamado Orçamento Impositivo, reduzindo e atropelando o orçamento da saúde e as solicitações populares contidas na Emenda Constitucional 29 ,chamada "Saúde + 10".
Enquanto o artigo do jornal estrangeiro afirma que o ESF foi elaborado para "atender vários aspectos da assistência pela saúde básica e reflete as melhores práticas de atendimento", não é isso que se constata nos pequenos municípios, cujas Prefeituras possuem dificuldades para montar equipes do programa saúde da família (PSF), e quando consegue o faz de maneira incompleta, sem a presença do Médico. Aponta que em 2014 existiam "29 mil equipes de PSF, que incorporavam 265 mil agentes comunitários, com o acréscimo de 30 mil  agentes de saúde bucal, atendendo cerca de 120 milhões de brasileiros". Destaca a presença dos agentes comunitários e dos agentes de saúde bucal, no entanto desconhecem que em muitas dessas equipes não existem Médicos e nem Odontólogos. Com equipes formadas, mas incompletas, as prefeituras não conseguem arcar sozinhas e nem acessar os recursos federais para contratação, que é feita de maneira temporária e em situação de precarização, sem segurança aos profissionais, que não moram no local e nem permanecem em horário integral, onde mais se  precisa desses dos serviços médicos.
A avaliação positiva sobre a saúde brasileira, enfocando os resultados do SUS e da exaltação do PSF, contrasta com o subfinanciamento do setor público da saúde, "a desvalorização da assistência, com falta de planejamento e gestão errática que desestimula  médicos e demais profissionais de saúde que atuam no SUS". Enquanto no período de "2000 a 2013 os estados e municípios aumentaram o investimento de 40% para 57%, a União apresentou decréscimo de 60% para 43%", numa clara manifestação de precarização do setor, conforme comenta o Jornal Medicina do CFM (edição 243, Abril/2015).
Diz o periódico que o "Brasil tem feito rápidos progressos rumo à cobertura universal da população através de seu sistema nacional de saúde, o SUS". Mas o que ocorre na verdade é um déficit financeiro progressivo e permanente que enfraquece a prestação dos serviços enaltecidos pelo artigo científico, cujos municípios e Estados não conseguem suplantar as deficiências e cortes, tendo como conseqüência "o fechamento de leitos, a desativação de hospitais, a crise no seguimento filantrópico da assistência e a sobrecarga nas contas públicas dos estados e municípios, que precisam se desdobrar para garantir o atendimento da população", como comenta Carlos Vital, Presidente do CFM.
Assim como foi dito anteriormente a OMS e o periódico reconhecem e destacam que os "serviços de saúde oferecidos pelo SUS são financiados com recursos públicos, inclusive medicamentos". Mas é fato que eles não retornam em serviços de qualidade e para o abastecimento das unidades com equipamentos e medicamentos, o que é reclamado constantemente pela população, que tem que suplementar com consultas particulares, planos de saúde e compra de medicamentos a custo caríssimo, penalizando duplamente o contribuinte que já paga os impostos.

Portanto, ao contrário do que diz o estudo que enfoca o SUS e o PSF como exemplo a ser copiado pelas nações, a gestão da saúde no Brasil, os governantes, os legisladores, os parlamentares e os gestores dos serviços estão dando mau exemplo para a comunidade internacional, levando milhares de cidadãos a manifestações e movimentos sociais reivindicatórios, pedindo que seus direitos á uma saúde de qualidade sejam oferecidos tanto nas cidades quantos nos locais mais longínquos do pais. Aqui no Amapá essa realidade não é diferente e para saber concretamente sobre o diagnóstico situacional da saúde publica no estado, jamais deverá basear-se em estudos não respaldados como esses. Temos técnicos capacitados que avaliam criticamente as informações de saúde nos Conselhos de Saúde, nos Conselhos profissionais e nos dados emitidos pelo IBGE, IPEA e nos levantamentos periódicos do CFM. Não precisamos de estudos maquiados que nada contribuem para a saúde.

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