Arquitetura
do medo: tudo o que olhamos no entorno nos apavora
Autor:
José Alberto Tostes
De acordo com estudos realizados pelas Nações Unidas
e OMS (Organização Mundial de Saúde) nas últimas décadas o comportamento do ser
humano em todo o Planeta vem mudando substancialmente em relação a forma de
organização social e a maneira de viver coletivamente. É cada vez mais comum os
investimentos em sistemas de segurança para garantir a chamada “paz em
família”. Somente a indústria da área de segurança alcança índices
inacreditáveis em relação ao movimento de pessoas e equipamentos, são bilhões e
bilhões de dólares, equipamentos cada vez mais sofisticados para proporcionar
algum tipo de segurança. O certo é que o contexto contemporâneo também alcançou
a área de arquitetura.
Hoje em dia é muito comum de acordo com relatos do setor da indústria da
construção civil, os clientes desejarem casas ou apartamentos que estejam
cercados de uma parafernália eletrônica e de outros dispositivos como câmeras,
cercas elétricas, portas automáticas, entre tantos outros. No caso da
arquitetura tem contribuído para que os muros sejam cada vez mais altos,
isolando a paisagem interior da casa da parte externa, contribuindo para a
perda de integração com a paisagem na sua totalidade. A mudança de
comportamento vem acrescida de outros fatores de igual importância: o
crescimento das populações urbanas; o aumento do desemprego; aumento do consumo
de drogas; aumento gradual dos elevados índices de violência.
A sociedade contemporânea se refugiou na arquitetura do medo, de acordo com a
associação das empresas imobiliárias nunca se construiu tantos condomínios
fechados, isolados e completamente apartados da vida social externa, se
formando verdadeiras cidades com características Big Brothers, com
câmeras em tudo e qualquer lugar. De acordo com a Associação das empresas
imobiliárias, quando um cliente procura um imóvel para comprar ou um
apartamento , um dos primeiros pontos que ele averigua está relacionado a
segurança interna e externa, assim como o entorno urbano, algo vinculado a
psicose dos tempos atuais.
Portanto, a arquitetura do medo também provocou nos últimos vinte anos a
mudança na concepção do espaço interno da casa. Em períodos anteriores era
muito comum o cliente solicitar ao arquiteto a preferência pela cozinha na
parte de trás da casa, passados alguns anos, a preferência nos dias atuais está
para a localização da cozinha na parte lateral e ou na frente da casa, pois
este espaço ganhou uma atenção bem maior que o espaço da sala de estar ou
jantar. O que se percebe é uma mudança de comportamento que também foi motivada
por questões de segurança em relação ao meio externo.
A arquitetura do medo apresenta outra faceta para
ser avaliada com algum cuidado, com o aumento dos dispositivos de isolamento,
ocorre na mesma proporção a perda dos valores de troca externa: o isolamento da
vizinhança; a perda de identidade entre as pessoas, e por fim, a baixa
interação social entre os diferentes grupos. Tão grave quanto o sentimento pela
insegurança foi aos poucos perder as relações que sempre existiu quando se vive
em comunidade. Diante de tal cenário, é importante refletir o que vem
produzindo a arquitetura do medo em toda a sociedade?
É evidente que assim como espaço interno por trás dos
muros tem gerado insegurança, o espaço externo público também vem mudando a sua
configuração social, pode-se dizer que neste caso, é o espaço público do medo.
As praças, lugares públicos abertos, paradas de ônibus e feiras também vem se
tornando escasso. Outros estudos mostram que a preocupação com a segurança
reflete na mudança de atitude nas escolhas dos locais frequentados, troca-se a
feira pelo supermercado, as lojas de ruas pelo Shopping Center, e
assim por diante.
Estaria a sociedade contemporânea assumindo um risco ainda maior de se refugiar
em um tipo de sociedade cada vez mais elitista, pois para investir na
arquitetura do medo é fundamental ter recursos para gastar em dispositivos cada
vez mais caros. As cidades sempre foram marcadas pela relação das trocas
simbólicas entre os grupos e pessoas. Para corroborar com este quadro, deve-se
salientar que a internet vem contribuindo para que a sociedade venha se
tornando um paralelo entre a vida real e o mundo virtual. É comum, por todos os
lugares, você vê as pessoas almoçando, jantando e ao mesmo tempo estarem
digitando, é como se fosse uma necessidade plena das funções orgânicas do
corpo, algo preocupante quando se trata de avaliar o que estamos nos tornando.
Então, a arquitetura do medo vem produzindo outras mudanças de acordo com
especialistas, seria a redução gradual das dimensões da casa, fato que estaria
relacionado a forma mais adequada do controle espacial de toda a área.
Verdadeiramente,vive-se um momento paradoxal, de pensar sobre o que é viver em
comunidade no novo milênio. Contraditoriamente o antídoto contra a violência é
a própria organização dos grupos sociais, melhorando os níveis de qualidade de
vida, reduzindo índices de pobreza, dando condições de acesso à educação e saúde. Em nada irá resolver a
arquitetura do medo, se tudo o que olhamos no entorno nos apavora.
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