Equinócio das Letras
Leno Serra Callins
Uma
nova esperança
Há
muito, muito tempo, numa galáxia muito, muito distante... Essa conhecida
abertura remete a uma franquia símbolo da cultura pop, criada por George Lucas
e, agora, pertencente à Disney. Estou falando de Star Wars ou, como foi
traduzido para o bom português, “Guerra nas Estrelas”, uma franquia iniciada no
cinema e que tem o meu apreço desde a minha infância, mas que, diferentemente
do que alguns possam imaginar, não é conhecida por todo mundo.
Menos
conhecida ainda é toda a variedade de obras existente além dos filmes, cada vez
mais numerosos. Livros, séries animadas, jogos e muitas outras obras existentes
em diferentes mídias integram o chamado “universo expandido” de Star Wars,
universo esse que, hoje, se divide nos selos “lendas” e “cânone”. Basicamente,
a diferença é que todas as coisas classificadas como “lendas” são produções de
antes de a Disney comprar os direitos autorais de Star Wars e que não foram nem
serão aproveitadas como parte da história válida (canônica) dentro do universo
ficcional em questão.
Como já
disse, a franquia tem o meu apreço desde a minha infância e, dos filmes, eu
parti para os jogos e acabei chegando às histórias em quadrinhos e livros desse
fascinante universo ainda na época em que a Disney não detinha os direitos
sobre ela. Foi assim que eu conheci toda a riqueza que um universo ficcional
pode ter, ao ponto de os povos e espécies de tal realidade não apenas possuírem
idiomas próprios, como eles terem o seu vocabulário e gramática detalhadamente
apresentados.
Uma
dessas línguas, falada pelas pessoas da cultura guerreira conhecida como
“mandaloriana”, chamou a minha atenção e me levou a pesquisar a respeito de
outras línguas existentes em universos ficcionais. Comecei procurando outras
dentro da galáxia muito, muito distante onde as histórias – e, agora, lendas –
de Star Wars se passam, mas essa busca rapidamente me levou para as línguas existentes
em outras realidades fictícias, como, por exemplo, na das obras de J. R. R.
Tolkien.
O
fascínio que as línguas élficas da Terra Média despertaram em mim foi muito
grande, afinal de contas, elas foram cuidadosamente construídas, parecendo-se realmente
com línguas reais e, o mais impressionante: possuindo histórias, o que lhes
reforçava a vivacidade. Aliás, Tolkien acreditava que uma língua precisava
disso para permanecer viva, de histórias, tanto que “Tolkien uma vez declarou
que o esperanto teria sido mais bem sucedido se houvessem mitos para
acompanha-lo”. Li isso no “Curso de Quenya”, um PDF facilmente encontrável na
internet, ainda nessa época em que eu procurava assiduamente por línguas em
obras de ficção. Fiquei me indagando a respeito dessa língua mencionada por
Tolkien e, enfim fui pesquisar.
Essa
pesquisa me levou ao curso de Letras, queria construir línguas como as de
Tolkien e como o esperanto de Zamenhof, mas, para isso, eu precisaria entender
de linguística. Todavia, toda essa jornada pessoal acabou me levando da
linguística de volta para a literatura, pois, no curso supracitado, acabei
entrando em contato com duas tristes realidades: a maior parte do povo
brasileiro não lê e a maioria dos brasileiros é constituída por analfabetos funcionais.
Como e para quê, então, construir línguas em universos fictícios e
enriquecê-las com histórias próprias se a população para a qual eu faria isso –
os falantes de português – nem mesmo utilizam plenamente a sua própria língua?
Foi,
então, que voltei minha atenção não apenas para a própria língua portuguesa,
como também para as produções literárias nacionais e, sobretudo, para as
relacionadas ao Estado do Amapá, integrantes da chamada “literatura amapaense”,
nomenclatura, aliás, que eu prefiro não utilizar, mas a explicação para isso eu
darei noutro texto, pois este é para falar, um pouco, do hábito de leitura.
Retomando.
Ao voltar minha atenção para as produções literárias relacionadas ao Amapá,
também me senti estimulado a produzir e voltei a escrever, não apenas contos,
que já escrevia antes da faculdade e para os quais eu pretendia construir uma
ou duas línguas, como também poemas. Até, então, eu não tinha uma relação lá
muito próxima com a poesia e, ao começar a ler mais poemas e, consequentemente,
a versificar – muito mais experimentalmente do que qualquer outra coisa – eu
também comecei a ir aos eventos culturais relacionados.
Neles,
pude observar diversas coisas, dentre as quais, a principal é que a quantidade
de pessoas que os frequentam não é das melhores. Além disso, é muito mais fácil
encontrar as mesmas pessoas do que alguma cara nova. Nem mesmo os estudantes da
área de Letras, que deveriam marcar presença em peso nesses eventos, costumam
dar as caras.
Isso
fez com que eu me atentasse para outra triste realidade: a cultura local não é
devidamente valorizada. Claro, existe uma série de fatores que levam a isso,
mas, um dia, dedicarei um texto apenas para essa questão, que, inclusive, teve
um episódio bem recente, envolvendo a Miss Amapá 2018, Williene Lima, e o
marabaixo.
Todavia,
um fato é que existem iniciativas culturais espalhadas por aí, quase todas
muito tímidas, mas que, certamente, devem ser divulgadas. Por exemplo, no que
tange ao hábito de ler, surgiram clubes de leitura nos últimos anos em Macapá,
cada um possuindo uma proposta própria e, geralmente, realizando encontros
mensais, os quais, além de gratuitos, também costumam sortear brindes entre os
participantes.
Dois
desses clubes são o “Leia Mulheres” e o “Lítera-Amapá”. O primeiro se encontra
mensalmente na livraria Leitura, no Garden Shopping, e celebrará um ano de
existência no último sábado deste mês, no dia 26 de maio. O segundo, cuja
diretoria eu integro ao lado de outras pessoas, como a poetisa amapaense Drilly
Manfre, se reúne nas tardes do último sábado de cada mês (excepcionalmente, o
encontro deste mês será dia 19) no auditório da Biblioteca Pública Elcy
Lacerda.
Quanto
às propostas, o clube de leitura “Leia Mulheres” possui um nome bem
autoexplicativo, mas, para não deixar nenhuma dúvida: ele procura promover a
leitura e o debate de livros escritos por mulheres, pretendendo, assim,
valorizar as escritoras, visto que o mercado literário costuma ser visto como
hegemonicamente masculino.
O clube
“Lítera-Amapá”, por sua vez, não se restringe a qualquer gênero ou outra
característica dos escritores ou dos livros, procurando alternar entre livros
nacionais, internacionais e “amapaenses”. Por exemplo, o livro de abril foi
“Dom Casmurro”, de Machado de Assis, e o de maio é “O Estrangeiro”, de Albert
Camus. O de junho certamente será de algum autor local.
Aliás,
por falar em junho, a partir desse mês outra proposta do “Lítera-Amapá” sairá
do papel, sendo executada também na Biblioteca Pública Elcy Lacerda: a promoção
de um sarau temático no segundo sábado do mês. Desde já, sintam-se convidados e
apareçam aos encontros dos clubes de leitura. Até a próxima.