POUCA ÊNFASE ÀS PLANTAS MEDICINAIS NO
XVII CONGRESSO MÉDICO AMAZÔNICO
Já faz alguns anos que ocorre o
Congresso Médico Amazônico, evento científico
no campo da ciência, da saúde e da Medicina, que se repete desde 1939. Com
o tema “ A Evolução da Saúde na Amazônia: 100 anos de História de Camillo Salgado a Camillo Vianna”, ocorreu em Belém, de 14 a 17.08.14, o XVII Congresso Médico Amazônico. Os temas foram os mais
diversos: as pesquisas científicas de doenças tropicais, epidemiologia das
doenças e agravos, impactos na saúde e no meio ambiente dos grandes projetos
amazônicos e atuação dos institutos de pesquisa, como Evandro Chagas, assim
como temas livres e dissertações de alunos das instituições de ensino
universitário (CESUPA, UNAMA, UEPA e UFPa).
O destaque do evento, que participei, foi a
comemoração dos 100 anos da Sociedade
Médico Cirúrgica do Pará(SMCP), homenageando os renomados ex-presidentes
Camillo Salgado e Camillo Viana. Este último foi meu professor e orientador de estagio
nos chamados “porões” da Santa Casa de Misericórdia do Pará. Foi meu orientador
do TCC de graduação em Medicina, quem me incentivou a gostar dos temas da ecologia, em particular as plantas
medicinais. A ele dediquei homenagem na minha tese de Pós-Graduação em Plantas
Medicinais, em 2006. É meu grande ídolo defensor e conservacionista da Amazônia, mais do que Chico Mendes. Neste
XVII encontro entreguei ao Mestre Camillo um esboço de meu futuro livro sobre
plantas medicinais, a ser lançado em 2015.
Apesar dos temas serem atuais e relevantes, causou-me
estranheza a homenagem à Camillo Vianna, ícone da ecologia e defensor das
florestas e da fauna, e ser dado pouco destaque a um dos temas estudados por
ele: as plantas medicinais da Amazônia. Dos 1000 artigos científicos, apenas
0,9 % falaram do tema. Não houve nenhuma palestra, conferencia e nem mesa
redonda sobre o assunto. Ouvi comentários
apenas numa palestra de Pediatria na atenção primária em saúde, onde a
palestrante em vez de dizer Fitoterapia (tratamento com plantas) falou
Homeopatia.
Os temas sobre pesquisas pré-clinicas com plantas medicinais
se resumiram a 8 trabalhos, expostos em
baneres, e 1 sobre a aplicação da massoterapia. Tinha mais estand sobre produtos tecnológicos das
empresas patrocinadoras e nenhum dos produtos naturais retirados da floresta. Não
vi nenhum trabalho realizado pelo Instituto de Pesquisa do Amapá(IEPA) e nem
pela Universidade Federal do Amapá(UNIFAP).
Tivemos um trabalho do setor de Controle de Qualidade do LACEN/AP, sobre
as laminas de pesquisa de malária encaminhada ao Laboratório pelos municípios
amapaenses em 2012.
Entre os estudos com plantas citamos: Estudo das alterações
eletroencefalográficas provocadas pelo extrato etanólico das folhas de Clibadium sp. (Cunambi), com ação
ictiotóxica, usada pelas populações ribeirinhas para a captura de peixes,
buscando a validação de novos fármacos anticonvulsivantes(UFPa); Alterações
eletroencefalográficas induzidas pelo
extrato da raiz de Spilanthes acmella
oleraceae (L.) R.K. Jansen (Jambu), também visando testes de drogas
anticonvulsivantes(UFPa); Avaliação do metabolismo oxidativo de ratos portadores do tumor de Wlaker 256 frente à
utilização do extrato de Uncaria tomentosa (Unha-de-gato),
objetivando comprovar sua ação anticancerígena(UEPA); Anonacina, uma toxina
presente na graviola (Annona muricata),
aumenta a fosforilação da proteína TAU
no cérebro de modelo animal de Taupatia humana, cuja utilização pode aumentar a neurodegeneração, exigindo cautela
em seu consumo(UFPa).
Levantamento de estudos sobre os efeitos da Carapa
guianensis (Andiroba), como repelente, larvicida, acaricida,
antiinflamatório, analgésico e mecanismos imunológicos, cuja comprovação dos
efeitos levaria a uma maior preservação do conhecimento tradicional das
comunidades e estimular a agricultura
familiar(CESUPA); Efeito cicatrizante gástrico do extrato etanólico de casca de
Himatanthus sucuuba (Sucuuba) em
ratos, cujos resultados mostram efeitos superiores do que no grupo controle e
correlação com a análise histológica(UFPa); Polpa de Crescentia cujete (Cuieira) como agente cicatrizante, com
comprovação do efeito em concentrações e doses menores(UFPa).
Com isso vemos que o avanço e a previsão de Coutinho
(2001) apud LAMEIRA O.A.;
PINTO,J.E.B.P.(2008), de que a “Amazônia, em 2050, será capaz de produzir US$
500 bilhões em medicamentos e cosméticos, a partir de plantas medicinais e
aromáticas”, é uma meta não difícil de alcançar, porém ainda com poucos
investimentos e pesquisas na área, como ficou demonstrou no XVII Congresso
Médico Amazônico. A academia faz a sua
parte, com poucas tecnologias. Os pesquisadores se esforçam para concluir seus
estudos com dificuldade e poucos recursos. Porém, os gestores não estão
sensibilizados e nem esclarecidos sobre as inovações e utilização racional e
sustentável dos recursos da natureza na saúde publica.
O que o Dr. Camillo Vianna ensinava nos porões da Santa Casa
(Enfª São Francisco de Paula), no Centro Rural Universitário de Treinamento e
Ação Comunitária ( CRUTAC) e na Sociedade
de Preservação aos Recursos
Naturais e Culturais da Amazônia (SOPREN) , órgãos que fundou nas décadas de 70
e 80, serve hoje não como lembrança de um passado, mas como comprovação e
realidade no presente. Descreveu a Síndrome Anêmico – Parasitaria (SAP), a potozoose e a paramarose, doenças dos
seringais. Mas também ensinava e valorizava os tratamentos naturais aprendidos
com os mateiros, caboclos, ervateiros, parteiras e outros curadores populares, remédios
esses que chamava de “puçangas”, mostrados em trabalhos científicos escritos
(VIANNA, 1982).
As novas gerações de profissionais da saúde deveriam se
espelhar em cientistas visionários como o Mestre Camillo, hoje com 88 anos, que
mesmo sendo professor da medicina clássica e acadêmica, enriquecia e ilustrava
suas aulas e estágios de férias com fatos e conhecimentos tradicionais das
populações caboclas e ribeirinhas da Amazônia. Uma sugestão para o próximo
XVIII Congresso Médico Amazônico: um Encontro Paraense de Plantas Medicinais em
Saúde Pública, que ainda não realizou nenhum evento desse tipo. O Amapá está na
frente de todos os estados da Amazônia, já tendo realizado 4(quatro) seminários
de plantas medicinais em saúde pública, sendo o último em 2007. Esqueceu-se suas decisões e deliberações, como
o Programa de Fitoterapia do Amapá(PROFITAP), que foi engavetado pelos gestores
da época. Talvez tenham desprezado um dos melhores programas de saúde pública
na área do Norte do Brasil. E o Mestre Camillo ainda está vivo para testemunhar
a concretização de seus ideais. Mãos na terra amapaenses!! JARBAS DE ATAÍDE, Macapá-AP, 14.08.2014, 100 anos da SMCP.
Camillo Vianna em homenagem no XVII CMA, ladeado por ex-alunos e colegas
médicos. Sobre a mesa o rascunho do livro do autor deste artigo.
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