A mordaça, a burrice e a paixão cor de sol
A imprensa de oposição tem enfrentado nos últimos
meses, mais severamente, situações análogas aos tempos mais duros da ditadura
militar. A dificuldade de conviver com opiniões contrárias tem se refletido em
ações truculentas executadas por tentáculos ligados ao sistema que vem tentando
sufocar quem não compactua com a atual gestão. Já tiraram programas do ar,
impediram de citar nomes além de derramar todos os dias um volume absurdo de
processos nos estúdios e redações dos veículos de oposição em um comportamento
que deixaria Franco e Pinochet de queixo caído.
Mas o último acontecimento equiparou os personagens
locais a um Costa e Silva e até mesmo Médici ou até o próprio Kadaff.
Simplesmente determinaram a suspensão de uma programação de TV até 5 de
outubro, dia da eleição no mais avesso do avesso dos raciocínios. A decisão é
liminar e não deve se sustentar quando os recursos forem analisados por alguém
com lucidez, imparcialidade e bom senso, elementos que devem guiar a Justiça.
A Declaração de Princípios Sobre Liberdade de
Expressão, aprovado
pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos em seu 108º período ordinário
de sessões, celebrado de 16 a 27 de outubro de 2000 diz em seu parágrafo 5 que:
A censura prévia, a interferência ou pressão direta ou indireta sobre qualquer
expressão, opinião ou informação através de qualquer meio de comunicação oral,
escrita, artística, visual ou eletrônica deve ser proibida por lei. As restrições
à livre circulação de ideias e opiniões, assim como a imposição arbitrária de
informação e a criação de obstáculos ao livre fluxo de informação, violam o
direito à liberdade de expressão.
Se
isto não for mesmo uma “ditadura branca” com nuances encardidos, somente este
parágrafo já seria suficiente em poupar a Justiça do Amapá desta aberração
ridícula, arbitrária e reacionária. Vivemos em tempos de liberdade e respiramos
ares de democracia que custaram muito caro. Tantos e tantos tombaram, outros
convivem com sequelas terríveis tanto físicas quanto psicológicas, mas
libertaram o Brasil dos grilhões da tortura e da opressão. Democracia é
conviver com ideias diversas e saber respeitá-las. Quando uma gestão, seja ela
estadual, municipal ou federal destoa disso querendo fazer valer somente o que
tem como certo, nos ronda o fantasma obscuro e sombrio da opressão. O
jornalista é acima de tudo um ser inquieto que vive do pensamento e da
formulação de ideias. Jornalistas questionam e têm por hábito querer ver o que
existe do outro lado da cortina. Tem horror e nojo de ditadores que os rondam
empunhando mordaças. É preciso separar o jornalista, das criaturas rasteiras
que vendem a língua ou alugam a caneta em troca de migalhas. Amordaçar a
imprensa para se poupar de críticas alimentadas pelo próprio povo é um ato
acima de tudo, burro. E a burrice é outro fator que enoja quem pensa. Mas pior
que a burrice é aceitá-la e compactuar com ela. Mesmo que ela venha camuflada e
apaixonadamente vestida em tons cor de sol.
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