Petrobras: Delação ou extorsão premiada? (erro
evitável) PARTE II
05. A
corrupção mata ou mutila vidas. A corrupção grossa (tal como a praticada
pela troyka maligna acima definida) “mata mais, muito mais que o pé de chinelo
enlouquecido pela falta de oportunidades e sobra de drogas. O corrupto
provavelmente teria pena de sua vítima se a visse, até porque ele não atira nem
apunhala. Ele não mata com seus atos, mas com sua omissão. É omitindo comida,
remédios e educação que ele chacina. Mas não será um sinal de nosso
desenvolvimento moral começarmos a chamar de hediondo também esse tipo de
atitude, em que a pessoa pode até ser caridosa no micro, mas – no macro –
destrói a república e mata ou mutila vidas?” (Renato Janine Ribeiro Valor
22, 23 e 24/11/14). Não há dúvida que temos que reagir (sociedade civil e
instituições de controle) contra a corrupção assim como
contra (desde logo) os grandes corruptos. Mas, de que forma?
06. Respeito
ao Estado de Direito (sob pena de nulidade). No Brasil vigora o modelo de
Estado que é chamado de democrático de Direito. Conciliar a repressão com os
direitos e garantias fundamentais é o único caminho civilizatório que pode nos
livrar do fascismo, do nazismo e do estado policialesco. Esse é o
incomensurável desafio. Do que os defensores e acusados estão reclamando?
Alberto Toron (Folha 24/11/14), que é defensor de um dos acusados,
responde: (a) O STF está legitimando uma irregularidade na Operação Lava Jato
ao permitir que o juiz federal Sergio Moro proíba réus de citar políticos
acusados de receber propina; (b) o processo tem que tramitar no STF porque há
autoridades políticas envolvidas (até aqui o STF coonestou uma farsa); (c) não
há como separar os políticos no escândalo da Petrobras; essa separação [para
manter o processo com o juiz Moro] é superficial, já que todos integram o
“circuito do crime”; (d) é inaceitável que a Justiça vete [à defesa] o acesso
às delações, porque isso significa “usar provas secretas” (inacessíveis pelos
advogados dos réus; todos réus têm direito de saber o teor da acusação para se
defender);
07. O
mesmo defensor acrescenta: (e) é inconcebível prender sem que os suspeitos
saibam do que são acusados; (f) a Operação Lava Jato do ponto de vista das
provas é igual a Guantánamo, que tinha provas secretas (ou seja: é coisa do
direito penal do inimigo praticado hoje intensamente pelos EUA); (g) a prisão
está sendo utilizada para promover a coação (donde haveria então extorsão
premiada); (h) primeiro se prende, para depois se investigar (a prisão, no
entanto, no plano constitucional, é exceção, não a regra; a presunção de
inocência é civilização); (i) para prender é preciso que a ordem pública seja
gravemente abalada; (j) a segunda instância está dizendo amém para os abusos do
judiciário de primeiro grau; (k) nós advogados (agrega Toron) “que temos
experiência com o juiz Moro, temos uma profunda reserva em relação à forma como
ele conduz as investigações, porque se trata de um juiz acusador”.
08. Necessidade
de punição da corrupção. Os tribunais superiores vão ser chamados para
analisar e decidir sobre cada um dos pontos que acabam de ser alinhados. Se não
encontrarem máculas nas investigações e decisões de primeiro grau, finalmente
os mais poderosos do crime organizado político-empresarial serão devidamente
punidos. E por que punir com rigor e proporcionalidade essa grossa corrupção?
Renato Janine Ribeiro (Valor 22, 23 e 24/11/14) responde (e com ele
estamos, em quase tudo, de acordo): (a) a república é coisa pública, bem comum.
A conduta mais antirrepublicana que há é vulnerar, atacar, destruir o bem
comum, sobretudo por meio da corrupção; (b) a corrupção é uma versão do
patrimonialismo (que na tradição ibero-americana significa considerar o
patrimônio público como privado); todas as vezes que essa confusão favorece um
político, é patrimonialismo; (c) não é verdade que todos somos corruptos (a
grande maioria não concorda com isso); (d) o fato de que o brasileiro seja
leniente com a corrupção (mas isso está mudado ultimamente) não pode significar
a impunidade de ninguém; (e) não vamos desresponsabilizar os corruptos dizendo
que ela é da “cultura brasileira”.
09. O
mesmo articulista ainda agrega: (f) os atos de corrupção são distintos (agradar
um policial não é a mesma coisa que formar um “clube” ou um “cartel” para
pilhar [sem dó nem piedade] o patrimônio público); (g) é preciso investigar o quanto
que o roubo (a corrupção) dos grandes influencia a descrença na decência nos
pequenos; (h) uma coisa é roubar (corromper) o patrimônio privado, outra
distinta é destruir o patrimônio comum (republicano); (i) quando se rouba (se
corrompe) o patrimônio comum são muitas as vítimas afetadas (que são
prejudicadas na área da saúde, educação, transportes etc.); (j) a corrupção
impede que doentes sejam salvos, que hospitais deixem de funcionar, que
hospitais existam sem médicos, que crianças e adolescentes sejam educados; (k)
os grandes corruptos mutilam ou abreviam muitas vidas; (l) a corrupção é
extraordinariamente deplorável porque nela “a pessoa vê o sofrimento de outra e
é indiferente a ele, ou até sente prazer graças a ele; isso é desumano. Isso é
desumanidade”; (m) o corrupto “não vê à sua frente as crianças desnutridas, as
pessoas miseráveis porque privadas de educação, os mortos de doenças curáveis
que são vítimas da corrupção”.
10. Em
suma, o mal da corrupção deve ser enfrentado. E como a Justiça penal funciona
seletivamente (seus recursos são escassos), pelo menos que funcione bem perante
o crime organizado político-empresarial, que conta com potencialidade de nos
transformar num país apropriado pelos métodos mafiosos.
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