sexta-feira, 6 de março de 2015

Autor: José Alberto Tostes

A falácia das políticas urbanas no Brasil: Até quando as cidades irão suportar?


                     Quando discutimos sobre políticas urbanas no Brasil vamos chegar as seguintes conclusões: muito embora tenham ocorrido inúmeros avanços nas últimas três décadas em relação aos direitos de todos os usuários, há um enorme distanciamento, entre o que está descrito nos textos dos diversos documentos como leis, decretos, portarias, resoluções normativas e tantos outros, o que se conclui é que o problema no Brasil não é a ausência de legislação, mas o planejamento, o cumprimento e a fiscalização eficaz de todos os requisitos previstos através destes distintos instrumentos legais. 
                    Neste artigo, vamos comentar como tal distanciamento tem sido nocivo para alcançarmos o desenvolvimento equilibrado nos municípios e cidades brasileiras. Devemos lembrar, foi a partir da Constituição Brasileira de 1988 que foi garantido os capítulos específicos em direção da política urbana no país, posteriormente a partir de 2001 e 2003 com a efetivação do Estatuto da Cidade e a criação do Ministério das Cidades avançamos em direção da real tentativa de encontrar os meios para elaboração e execução de políticas urbanas mais integradas, duradouras, consistentes e continuadas, entretanto, apesar dos instrumentos norteadores, tudo aquilo que está no papel não tem sido suficiente, se não for devidamente combinado com outros mecanismos, assim destacados: qualificação de mão de obra, políticas públicas integradas, planejamento e gestão compatível com a realidade do lugar, orçamento público transparente, políticas setoriais de acordo com as grandes metas nacionais e regionais.
                   O que se vê na atualidade, é um abismo entre o que propõe a politica urbana descrita nos instrumentos legais e o sistema de planejamento e gestão no Brasil definido pela União, estados e municípios. As políticas habitacionais, acessibilidade e mobilidade urbana e transportes são muitas vezes antagônicas entre si, há casos, dentro do mesmo governo que se contrapõem as metas oficiais estabelecidas, até hoje, a politica de financiamento de novos conjuntos habitacionais é realizada sem estar conjugadas com as políticas que integram a cidade, sendo assim, programas como “Minha Casa, Minha Vida” é tratada como a redenção dos problemas de acesso a moradia, não é bem assim, existem múltiplos casos pelo Brasil afora, de concepções insuportáveis que só aumentam a segregação urbana.
                   Outro fator decisivo para isso, quando nos referimos à aplicabilidade de políticas urbanas, constata-se o distanciamento das ações entre os governos federal, estadual e municipal, como nem sempre falam a mesma linguagem política, cada ente, se posiciona de uma forma, contribuindo para aumentar a segregação e os vazios urbanos. Cada lei tem a sua peculiaridade, o Estatuto da Cidade, na prática já fosse um Estatuto das Metrópoles, na sua essência tenta definir princípios importantes para serem assegurados, mas como todo documento legal, são ideias que precisam ser aplicadas em médio e longo prazo, sem isso, será sempre um instrumento de prateleira com pouco uso. A prova disso é a maneira como o governo federal tratou a questão dos planos diretores, dos planos setoriais e agora mais recentemente o Plano Municipal de Resíduos Sólidos.
                    O problema da exigência de planos, programas e projetos por parte do governo é travada pela pouca capacidade de planejamento e gestão por parte da grande maioria dos municípios brasileiros, o resultado é o não cumprimento de metas e ações previstas dentro do prazo estabelecido. Todos os anos, os congressistas destinam recursos para distintos municípios de seus estados de origem, se isso fosse feito com base em todos os instrumentos legais de planejamento, se evitaria muitos desperdícios de recursos públicos.
                   Então, chega-se a conclusão que o problema não são as leis e os instrumentos legais que permeiam a orientação e ocupação do território urbano e rural, mas a completa incapacidade para fazer frente às múltiplas demandas existentes no país. A política urbana na prática tem sido conduzida pela pressão política, social e econômica, quando concretamente, deveria ser o contrário, daí resulta a pouca eficácia de um instrumento tão importante quanto o Estatuto da Cidade. Na Amazônia, pesquisa recente, mostrou que mais de 60% de todos os prefeitos dos municípios da região alegaram nunca ter lido o documento ou pelo menos conhecer os princípios importantes.
                     As políticas urbanas ficaram reféns do poder especulativo, do capital volátil, dos interesses escusos e dos grandes projetos privados, o remédio para isso é bastante amargo, significa ir em direção contrária de uma ordem estabelecida de forma perversa no Brasil. Enquanto os governos não derem conta que os problemas estão nos municípios, não vamos avançar na aplicabilidade de políticas urbanas sérias e bem realizadas. O exemplo está no cotidiano das cidades, corta-se uma via pública como se fosse algo banal, coloca-se um semáforo em uma esquina, só porque lá já ocorreram vários acidentes, muda-se o trajeto de uma via por entender que irá reduzir o fluxo de veículos no lugar, e assim por diante. A política não é urbana, é de fazejar, aquilo que chamamos de planejamento está longe, onde tudo isso irá alcançar, não se sabe, porém o que estamos percebendo em muitos anos, é o estado caótico das cidades, dos bairros, das quadras, das vias etc.
                    Outro importante aspecto a ser considerado é que no Brasil, em que pese se afirmar que vivemos em uma “democracia”, na prática é uma democracia de conveniência para quem está no poder e dá as cartas, sem Reforma Política e sem Reforma urbana, pouco avançará a aplicabilidade de políticas que abracem a cidade de fato como deveria. Os políticos elaboram as políticas neste país, são os primeiros a burlarem os instrumentos legais, a sociedade assiste passivamente tudo, pouco se envolve, as consequências são evidentes, politicas públicas e urbanas enfraquecidas, com reduzida aplicação, o que temos de forma efetiva são politicas frágeis, temporárias e cercadas de uma enormidade de problemas. A política econômica deste país não considera em nada a qualidade de vida nas cidades, colocam-se todos os anos milhões de novos veículos nas vias e estradas, sem, no entanto, pensarem nos transportes públicos, espaços alternativos e outros meios de garantir a qualidade de vida urbana, até quando tudo isso irá ocorrer, isso já sabemos, nos restar perguntar: até onde as cidades irão suportar?


                       


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