FRATERNIDADE,
SOCIEDADE E SAÚDE: DILEMAS QUE QUESTIONAM.
A
Campanha da Fraternidade (CF) no Brasil tornou-se um período de reflexão
e um instrumento de manifestação da ação evangelizadora da Igreja Católica,
buscando entre os cristãos e as pessoas de boa vontade a viverem o espírito de
solidariedade. Surgiu em 1962, impulsionada pelo espírito renovador do Concílio
Vaticano II, que durou entre 1961 a 1965, explanando temas seculares e de
relação com problemáticas do mundo temporal e da sociedade.
Como no tema
de 1996, Fraternidade e Política passaram a ser a tônica das campanhas,
analisando, discutindo, denunciando e dando incentivo e sugestões para uma
melhor convivência social. Com o tema de 2015—“Fraternidade: Igreja e
Sociedade”—busca não só a renovação da vida da Igreja, mas também
contribuir com a transformação e humanização da sociedade: da melhoria das
estruturas, do incentivo a uma relação ética e moral entre os fiéis, do
aprimoramento e aproveitamento das vivências e experiências concretas e da
atuação oportuna e consciente dos cristãos e instituições da sociedade civil na
vida sócio-política do país.
Falar em
sociedade no seio da Igreja deixou de enfatizar temas focais e domésticos. Os
temas passaram a ser mais conjunturais e estruturantes, ou seja, que interferem
na vida concreta do cidadão e da
sociedade. Em relação à saúde, várias experiências, como na CF/2012
(Fraternidade e Saúde Pública), mostram que existem saídas para o momento que
vivemos. Nesse ano o lema foi: “que a
saúde se difunda sobre a terra”. Indicava mais ação e implantação do óbvio
e consolidação dos princípios do SUS, na universalização e equidade na oferta
dos serviços.
Hoje, com o lema “Eu vim para servir”, a Igreja
reflete não só a real implantação das garantias constitucionais do SUS, mas
também questiona a postura e posicionamento dos executantes investidos de
autoridade (gestores, governantes, parlamentares e políticos católicos e não
católicos) em interferir oportuna e concretamente nessa mudança. É difícil
buscar essa coerência entre Fé e Política, entre vivência pessoal e atuação
político-social. Mas é isso que a Igreja Católica visa, estimula e busca: a dialética
e o equilíbrio de contrários e a quebra de paradigmas erroneamente instalados
nas instituições de saúde.
Não
acompanhei os resultados do relatório final da CF/2012 sobre saúde pública. Mas
uma coisa é certa. O sistema de saúde oficial brasileiro (SUS) estagnou; os vícios e relações corruptas
se institucionalizaram; políticas e conquistadas populares foram descumpridas
(Conferencias de Saúde); os resultados e indicadores do SUS pouco avançaram nos
últimos 20 anos. As denuncias da mídia e das instituições fiscalizadoras de
descumprimento das políticas públicas foram, em grande parte, ignoradas pelos
poderes constituídos; e as interpelações
de instituições como Pastorais Sociais , CNBB, OAB, ABI e Conselhos
Federal e Regional de Medicina pouco adiantaram. Isso significa que a sociedade
se mobilizou, exigiu mudanças, mas seu grito não chegou a mãos de homens de boa vontade. Isso mostra o
descompasso e afastamento dos agentes públicos e das instituições com as
aspirações do povo.
Grandes autoridades “defensoras” dessas
mudanças, que ocuparam as ruas e palanques pela redemocratização do país e
pelas “Diretas Já”, na década de 80, hoje ocupam listas de denunciados e
possíveis indiciados em atos de crime de corrupção. Vida separada da Fé.
Atuação política separada da religião. Falta de coerência e de convicção
político-ideológica. Exemplos de crise moral e ética das consciências. Em
termos religiosos pecados pessoais e institucionais (Cf. Ef 5, 8-13), que
jamais fogem da luz divina.
Estreitamente
falando, pensamos que “servir” é apenas um ato isolado e mesquinho de dar
esmola, de contribuir com dízimos, de ter pena esporádica e dar um tostão ou um
pedaço de pão, para amenizar a dor da consciência; de ir à missa em busca do
sagrado e ignorar o sofrimento humano ao seu lado; de falar e discursar em
palanques e depois trair e contradizer o que disse.
A fé viva,
revigorada, renovada e questionadora do Ressuscitado
Jesus é algo maior, mais sublime e transformador. É uma conduta que surge no espírito, no
coração e na consciência e se expressa nos pensamentos, nas atitudes, nas
normas, nas leis, na ordem, no convívio social e na atuação política dos fiéis
envolvidos e na própria discussão político-administrativa. Como diz São Paulo
na carta a Tiago: “Meus irmãos, o que adianta alguém dizer que tem fé, se não tiver obras?” ( Cf. Tg 2,14-17).
Com o lema
da CF/2015, “Eu vim para servir”,a
Igreja chama atenção não só de seus fiéis católicos. Inclui os demais membros
da sociedade civil que possuem boa vontade para melhorar e renovar as estruturas,
visando o bem comum, ou melhor, pede para revermos nossas posturas e escolhas e contribuamos para uma sociedade
mais democrática, solidária e sustentável. Chama os fiéis para serem “ sal, luz
e fermento no mundo” (Cf. Mt 5,13-16). Conclama os excluídos (opção
preferencial pelos pobres) não ao anarquismo, ao fanatismo, a homofobia, à
desordem, mas os convida para uma caminhada que busque ambientes saudáveis e de
paz, de concórdia, de negociação e de vivência mais igualitária, partindo dos
mais necessitados ou marginalizados.
Com seu
Magistério, sua Doutrina Social (Dimensão Social da Fé Cristã), os documentos
Pastorais e as orientações do CELAM, a Igreja busca o diálogo com as outras
denominações religiosas (ecumenismo) e da sociedade civil. Busca, enfim, a paz
e o bem-estar social incentivando a prática de medidas permanentes e duradouras.
Com esse lema nos interpela a não esquecermos: “ Javé, o Deus solidário e libertador, optou pelos pobres, ao ouvir o
clamor dos oprimidos e descer para libertá-los das garras do imperialismo dos
faraós do Egito” (Cf. Ex. 3,7-10). JARBAS DE ATAÍDE.
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