CAESA: PRIVATIZAR
É O MELHOR PARA OS AMAPAENSES?
Reinaldo
Coelho
O critério para
privatizar estatais é de outra natureza. Começou a ser aplicado no fim do
século XIX no Japão e a partir dos anos 1980 na Europa. O princípio é o de que
o Estado somente deve exercer atividades empresariais se o setor privado não
for capaz de fornecer bens e serviços essenciais ao desenvolvimento e à
segurança nacional.
Eram
os casos de atividades como as de bancos, transporte ferroviário, mineração,
energia elétrica, telecomunicações e outras. Elas exigiam níveis de
investimento superiores à capacidade do setor privado, inclusive do sistema
financeiro, em prover o seu respectivo financiamento.
O setor público, mesmo
quando há inequívoca competência de gestão, tende a gerar ineficiências ao
operar empresas. Isso se deve à troca frequente da sua administração nas
mudanças de governo e aos custos de transação associados ao setor público, como
é o caso da observância de regras de concorrência pública típicas do governo.
Afora isso, as estatais
podem sofrer a interferência dos governos da hora, como ocorreu na Petrobras
durante o período petista, particularmente no governo de Dilma Rousseff. A
empresa quase quebrou por causa da corrupção e do controle dos preços de seus
produtos para disfarçar os efeitos inflacionários da desastrosa política
econômica de então.
A privatização da Companhia
Amapaense de Água e Esgoto (CAESA)s deve ser decidida pelo critério de
oportunidade e não porque a empresa dá lucro ou prejuízo.
Uma pergunta que deveria ser
feita para os amapaenses e com apresentação das vantagens que a privatização
deverá trazer para o consumidor, que hoje sofre com a deficiência do serviço
prestado, a inconstância da distribuição da água, com qualidade duvidosa e do
não atendimento a maioria dos bairros periféricos, que se obrigam a usar o poço
amazônico, com água contaminada pela ameba e oriundas das áreas alagadas e de
ressacas.
O governo federal lançou, em
setembro de 2016, o Programa de Parceria do Investimento (PPI), que regulamenta
o processo de concessões e privatizações para os próximos anos. Em março de 2017, foram anunciados mais 55
projetos do PPI, entre eles a desestatização de 14 empresas estaduais de
saneamento.
Privatizar distribuição de
água
Estava prevista para o
primeiro semestre de 2018 a entrega, ao capital privado, das companhias de água
e esgoto do Acre (Depasa), Amapá (Caesa), Santa Catarina (Casan), Alagoas
(Casal), Ceará (Cagece), Maranhão (Caema), Paraíba, (Cagepa), Pernambuco
(Compesa), Rio Grande do Norte (Caern) e Sergipe (Deso). Já Embasa (Bahia),
Agespisa (Piauí), ATS (Tocantis), Cosama (Amazonas), Cedae (Rio de Janeiro),
Cosanpa (Pará) e Caerd (Rondônia) estão previstas para serem privatizadas no
segundo semestre de 2018. O que não aconteceu.
Essa pauta de privatização é um programa de
governo iniciado no governo de Michel Temes e executado pelo Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o planejamento faz parte do
Programa Nacional de Desestatização, gerenciado pelo Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), e prevê colocar o controle de
autarquias para a iniciativa privada.
Através do pregão eletrônico
AARH nº 15/2017 – BNDES fez a contratação de serviços técnicos especializados
para a estruturação de projetos de participação privada, visando a universalização
dos serviços de fornecimento de água e esgotamento sanitário relativamente ao
Estado do Amapá e à Companhia de Saneamento do Amapá - CAESA, conforme as
especificações do Edital e de seus Anexos. O BNDES comunicou aos Licitantes que
o certame em referência, com o Aviso de Licitação publicado no DOU do dia
23/02/2017, seção 3, página 133, foi homologado pela Diretoria do BNDES, em
03/05/2017, tendo sido adjudicado seu objeto ao Consórcio formado pelas sociedades
PRICEWATERHOUSECOOPERS CORPORATE FINANCE & RECOVERY LTDA, LOESER E PORTELA
ADVOGADOS, EGIS – ENGENHARIA E CONSULTORIA LTDA e PWC STRATEGY &
CONSULTORIA EMPRESARIAL LTDA, pelo valor global de R$ 5.319.900,00 (cinco
milhões, trezentos e dezenove mil e novecentos reais). Rio de Janeiro, 05 de
maio de 2017. Pedro Ivo Peixoto da Silva. Gerente da Gerência de Licitações 4
do AARH/DELIC.
Segundo o governo do Amapá,
a privatização da Caesa vai possibilitar a ampliação do sistema de
abastecimento de água e esgoto no estado e gerar economia para a gestão
estadual. De acordo com dados da Secretaria de Planejamento do Amapá (Seplan) o
valor anual de R$ 24 milhões arrecadado pela Caesa não é suficiente para cobrir
os custos de funcionamento.
Pelas informações efetivadas
pela Seplan/Amapá a primeira etapa foi a assinatura de um termo de operação
técnica, feito em 2016 com o BNDES para iniciar os estudos de viabilidade de
concessão, que vai avaliar o mercado local e dizer qual modelo é melhor para
atender a população. Se for viável, iniciarão o processo de privatização.
Um dos pontos importantes
para que a opção pela privatização da estatal é os valores necessários para ampliação
do sistema de água e esgoto para o Amapá, seria necessário o valor aproximado
de R$ 810 milhões. E os resultados da análise realizada pelos técnicos da
Seplan e da Caes atualmente o governo não tem como arcar com esse custo e a
privatização iria atender essa capacidade. Caso não seja apontado como viável
pelo estudo, o governo vai estudar outras formas de fazer esse processo. Pois a
Caesa vem atendendo de forma superficial a sociedade.
Uma das vozes que o Amapá
possui na sua defesa e dos seus habitantes é a do Juiz Federal João Bôsco que é
contra privatização da Caesa por acreditar que, se fora do foco político, tem
condições de cumprir bem sua função social
Conhecido por aplicar a
justiça social voltada para o coletivo e responsável pela realização de grandes
obras no Amapá, o magistrado federal defende a nomeação de dirigentes
especialistas para que empresas públicas possam cumprir sua função social.
“Sou honesto, a Caesa não
poderia ser entregue ao loteamento político; é um grande erro. Você vê que em
São Paulo, Minas Gerais, Distrito Federal e Paraná as companhias de água
funcionam, porque não há loteamento político, e se tem não dá pra perceber. O
que sufoca de morte essas empresas, tipo Caesa, sempre foi loteamento político.
Sou contra a privatização; se o Estado não loteasse politicamente seria uma boa
empresa; só que no Amapá há loteamento político em tudo; é uma tristeza, me
indigna, porque brincam com a coisa mais importante do mundo que é água; temos
que ter pensamento próprio; funciona bem em vários estados e por que não
funciona aqui? Não se loteia politicamente algo tão importante como saúde,
educação e água. Tanto que quem privatizou hoje está voltando a estatizar, como
em Londres, por exemplo”, analisou.
BNDES
lança edital de estudo
Processo para concessão do
serviço de saneamento foi iniciado no Amapá começo em fevereiro de 2017 com o BNDES
lançando o edital para propor modelos de desestatização da Caesa. Medida é
necessária para ampliar serviços em todo o estado, afirmou o governo estadual amapaense.
O BNDES na ocasião lançou seis
editais para dar início ao processo que pode levar à concessão ou privatização
das empresas de saneamento nos estados de Pernambuco, Maranhão, Sergipe,
Alagoas, Pará e Amapá.
O BNDES já tinha
pré-qualificou consórcios de consultores para atuarem nesses projetos de concessão.
Os seis editais selecionarão os
consórcios que vão fazer os estudos técnicos e sugerir aos estados qual o
modelo de desestatização indicado.
Posteriormente, se os
projetos forem acatados, serão lançados os editais para a execução da
concessão.
“Ao final disso, vamos fazer
um leilão para a modelagem final. Pode ser uma concessão, parceria,
privatização. Cada estado terá um modelo diferente pois cada estado tem uma
situação diferente”, disse a presidente do banco.
O prazo da concessão de
saneamento vai variar de acordo com o estado, mas, geralmente, ele é de 20
anos, falou. Ela ainda acrescentou que pelo menos outros quatro editais para a
área devem ser lançados.
Na
contramão
Essa entrega das empresas
públicas ao capital privado pelo governo federal está na contramão do que
ocorre em centenas de cidades ao redor do mundo. Estudo elaborado por 11
organizações não governamentais descobriu ao menos 835 casos de
remuncipalização ou reestatização de serviços de água e esgoto em mais de 1.600
localidades de 45 países. Dentre os exemplos estão capitais como Paris, Berlim,
Barcelona, Budapeste, Viena e Buenos Aires.
Abusos do setor privado e
violações trabalhistas; encarecimento dos serviços prestados e um desejo da
população pelo controle de recursos essenciais são enumerados no estudo como
fatores para a retomada desses serviços para as mãos do Estado.
“Trazer serviços públicos
locais para o controle público é uma questão democrática importante,
especialmente serviços essenciais como energia ou água. Significa maior
transparência e melhor supervisão do cidadão. No contexto das mudanças
climáticas, pode contribuir para liderar nossas cidades em direção à eficiência
energética, ao desenvolvimento das energias renováveis, à conservação de nossos
recursos naturais e ao direito à água”, declarou Célia Blauel, vice-prefeita de
Paris e presidente da Eau de Paris, uma das ONGs envolvidas no estudo.
“Estamos vendo nesses países
desenvolvidos a retomada dos serviços de saneamento que foram privatizados e
que não deu certo. Mas as empresas sabem que tem como negociar com governos
fracos e corruptos, como o nosso, a preço vil”, afirma o estudioso sobre
recursos hídricos, Renato Tagnin.
ADEUS
OURO AZUL?
Há um ano, precisamente no
dia 24/01/2018 o então presidente Temer
promoveu entrega da água ao setor privado. Na contramão do que ocorre em países
desenvolvidos, onde há uma tendência pela retomada dos serviços de água e
esgoto, governo atual tem acenado com incentivos para que setor privado adquira
controle das maiores empresas de saneamento do país
A portas fechadas na Suíça –
No dia 24 de janeiro de 2018, em meio ao Fórum Econômico Mundial – evento que
reúne anualmente a elite financeira global em Davos, nos Alpes Suíços –, o
presidente Michel Temer reuniu-se com representantes de corporações que têm a
água como ativo essencial, como James Quincey, da Coca Cola, e Carlos Brito,
presidente global da Ambev. Temer também se encontrou, a portas fechadas, com o
chairman da Nestlé, Paul Bulcke, segundo noticiou a Folha de S.Paulo.
A suíça Nestlé – com marcas como Acqua Panna,
Nestlé Pureza Vital, Perrier, Petrópolis, São Pellegrino e São Lourenço – é a
maior multinacional de água engarrafada do mundo, detendo jazidas aquíferas em
diversos países, dentre eles o Brasil. A corporação é dona, por exemplo, de
fontes no município mineiro de São Lourenço, onde trava, há anos, batalha
contra a população e o Ministério Público devido ao controle e o esgotamento de
poços na região.
“Quem detém o controle
desses recursos, detém o poder e pode aumentar os valores criando a escassez.
Há várias formas de criar escassez, como ocupar terras onde chove bastante e
onde os aquíferos estão disponíveis, e também ocupando pontos chave de gestão,
como a infraestrutura de saneamento”, resume Renato Tagnin.
O documentário Ouro Azul -
As Guerras Munidas pela Água (2008) denuncia as investidas das grandes
corporações mundiais pelo controle de jazidas de água. https://www.youtube.com/watch?v=mQyoUDfhFVo
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