
Gil Reis*
Um dos meios mais essenciais ao
desenvolvimento de qualquer país é o conhecimento de sua história, sob pena de
enfrentar os mesmos problemas sempre, uma espécie de “moto contínuo histórico.”
No Brasil, há a necessidade premente
de conhecimento de sua própria história, principalmente a história do agro. Tal
história tem sido preservada pela tradição oral e por artigos e crônicas, nunca
fazendo parte das obras dos melhores historiadores.
O conhecimento é extremamente
necessário em um momento em que boa parte das novas gerações tem origem urbana
e imagina que tomate, cebola, alho, carnes de todos os tipos, queijo, vinho e
demais produtos agrícolas surgem por magia nas gondolas dos supermercados.
Culpa nossa, que esquecemos a história
e não ensinamos a origem dos produtos agropecuários aos nossos filhos.
Apenas e tão somente para colaborar
com o resgate da história do agro brasileiro, e também para evitar que vivamos
o moto contínuo histórico, republico artigo escrevi há 12 anos:
“SER
PECUARISTA NA AMAZÔNIA OU SIMPLESMENTE AMAZÔNIDA NÃO É FÁCIL!”
Ser pecuarista na Amazônia não é uma
das tarefas mais fáceis, principalmente agora que os governos o elegeram como
“bola da vez”.
Há alguns dias um amigo do Pará, que
tem uma empresa de engenharia e também é pecuarista, queixou-se numa conversa
que tivemos:
– Gil, não aguento mais tanta pressão.
É o governo, o trânsito, os clientes, os operários e tudo mais. Acho que vou
largar tudo, mudar-me para a minha fazenda e dedicar-me a cuidar dos bois.
– Vá com calma, verifique primeiro se
a fazenda ainda é sua ou se algum dia já foi sua – respondi.
Essa é a triste realidade do estado do
Pará, onde vários movimentos, autodenominados de “sem-terra” invadem quase que
diariamente as propriedades rurais.
Fala-se muito em desenvolvimento
sustentável. Contudo, às vezes, é muito difícil passar das ideias às ações.
Tomemos como exemplo o Pará. Por quase
duas décadas, o Iterpa (Instituto de Terras do Pará) deixou de emitir títulos
de terra. Ou seja, não reconheceu os títulos emitidos por cartórios antigos e
ignorou a propriedade de terras cuja posse, muitas vezes, ultrapassa 70 anos.
O
pecuarista é obrigado a desenvolver as pastagens em apenas 20% da propriedade,
por causa da legislação ambiental”
A falta de títulos de propriedade
emitidos por órgão competente enseja uma série de problemas, deixando, por
exemplo, que as terras ficam à mercê de invasores, grileiros e bandidos. Um
programa, sério, de desenvolvimento sustentável passa, inevitavelmente, pelo
processo de regularização fundiária.
Não bastasse esse fato, o pecuarista é
obrigado a desenvolver as pastagens e a criar o rebanho em apenas 20% de sua
propriedade, por causa da legislação ambiental. É dessa forma que se quer proteger
o meio ambiente.
Apesar de toda a perseguição, a
pecuária do Pará se desenvolveu nos últimos anos e possui, hoje, um invejável
rebanho (à época da publicação deste artigo, o estado tinha cerca de 18 milhões
de cabeças*).
Entretanto, a despeito do competente
trabalho da Adepará (Agência de Desenvolvimento Agropecuário do Estado do
Pará), que conseguiu erradicar a febre aftosa com a vacinação, a carne
produzida no estado continua sofrendo com barreiras sanitárias de alguns
países.
A alternativa encontrada pela cadeia
produtiva foi exportar o “boi em pé”, ou seja, o boi vivo, para países como
Líbano e Venezuela e aí surgiu um novo problema: a construção de um logradouro
turístico para abrigar diversos restaurantes em área do porto de Belém (único
porto destinado a cargas gerais). Em razão disso, o Ministério Público moveu
ação pedindo a proibição do embarque do boi por causa do “mau cheiro”. A
Justiça atendeu o pedido.
A exportação de boi vivo não está entre os motivos do aumento do preço da carne”
Mesmo assim, o Pará se tornou o maior
exportador de gado vivo do Brasil, responsável por aproximadamente 97% dos
embarques. E a reação veio imediata. A começar pelo governo do estado, que
taxou a exportação do boi em R$ 22,00 por cabeça embarcada, além de já cobrar
ICMS no transporte dos animais destinados ao mercado externo. Ambas são cobranças
inconstitucionais.
Algumas organizações, não se sabe com
que intenção, também começaram a ganhar espaço na mídia para acusar a
exportação do gado vivo como responsável pelo aumento do preço da carne. E o
povo começou a acreditar na mentira.
Ora, qualquer pessoa que entenda um
pouquinho de pecuária sabe que a exportação de boi vivo não está entre os
motivos do aumento do preço da carne. Aliás, proporcionalmente ao abate, a
exportação de boi não é significativa. 2007 foi o ano recorde em exportação de
gado, quando o Brasil embarcou cerca de 1% do volume de abate.
Pesquisas mostram que a distorção no
preço da carne não ocorre devido à ação do pecuarista ou do frigorífico. Menos
ainda por causa da exportação do gado vivo, mas, sim, na distribuição e no
varejo. Em vários estados, alguns supermercados chegam a aumentar o preço da
carne fornecida pelos frigoríficos entre 36% e 115,67%.
O Greenpeace parece querer se tornar a consciência universal ecológica”
Há informações de que a organização internacional Greenpeace estaria promovendo campanha contra os produtos amazônicos. O mundo deveria estar preocupado com o volume de recursos angariados por essa organização. Pela atuação e badalação, o seu orçamento anual deve ser maior do que o de muitos países do terceiro mundo. Pelo poder que vem adquirindo, o Greenpeace parece querer se tornar a consciência universal ecológica.
Para completar, o Ministério de Meio Ambiente inventou a figura do “boi pirata”**. O assunto, se não fosse tão trágico e perigoso à propriedade privada, seria cômico. O que deve achar o cidadão da cidade ao se preparar para comer o seu churrasco? Que se trata de um boi de perna de pau, um boi falsificado?
Mas, deixemos de lado um pouco o pecuarista da Amazônia e falemos desse povo tão sofrido que é o amazônida.
São 25 milhões de brasileiros (número de 12 anos atrás) tentando sobreviver e desbravar uma das regiões mais difíceis e perigosas do mundo. A maior parte veio para cá atendendo apelo do governo federal de “integrar para não entregar”.
Fala-se muito em desmatamento, o que é inegável. Todavia, vamos as razões do fato:
*Onde o Brasil e o mundo acham que vivem os amazônidas? Nas capitais da Amazônia? Engano. Boa parte dos 25 milhões de habitantes da região vive no meio rural, ou seja, na floresta, produzindo para o seu sustento e de sua família e, ainda, para alimentar o Brasil e o mundo.
Existem bandidos e irresponsáveis na Amazônia? Claro que sim, como existem por igual no país inteiro.
Entretanto, os empresários e o povo da Amazônia são sérios, decentes e empreendedores, dotados de consciência de cidadania que desafia a de algumas regiões.
O amazônida vive acuado e perseguido por milhares de ONGS internacionais e por um parlamento e um governo federal intervencionistas”
Fala-se muito em desmatamento, o que é inegável. Entretanto, é preciso que se diga que a Amazônia não é um território de loucos e desvairados que querem destruir as suas próprias terras.
Se formos observar com cuidado o mapa do desmatamento, verificaremos que o aumento e o descontrole ocorreram com o advento dos tais sem-terra, que invadem as propriedades, destruindo e devastando as reservas florestais exigidas por lei.
O amazônida vive acuado e perseguido por milhares de ONGS internacionais e por um parlamento e um governo federal imaginativos, intervencionistas, cheios de “boas intenções” e sem qualquer noção do que é viver e sobreviver na Amazônia. Ainda mais sob a exploração de um “imperialismo brasileiro”, que só vê na região riquezas a serem exploradas.
Existem conflitos agrários com mortes? Claro que existem, como também existem conflitos com mortes por cachaça, por mulher, por honra e tudo mais. Aqui é área de colonização, para cá vieram pessoas boas e pessoas más.
O governo federal tem intervindo na Amazônia a seu bel prazer, como se a região fosse o quintal da casa dos governantes da hora. Tem criado reservas de todos os títulos e aí se configura a reforma agrária como um mito. O amazônida que deseja ter a sua terrinha, aguarda, até hoje, que Brasília um dia pense em uma reserva para efeito de reforma agrária e assentamento daqueles que efetivamente são da região.
O amazônida é o campeão mundial da preservação florestal. Há 60 anos, o Brasil era detentor de apenas 7% de toda a floresta nativa do planeta terra. Hoje, possuímos 28%”
Quando falo de amazônida, refiro-me também aos povos indígenas da região, contra os quais o governo vem, cruelmente, praticando “política de exclusão social” sob a capa de “reservas indígenas”. Muito bonita a desculpa de preservação cultural, deixando o índio em condições sub-humanas de vida.
A memória das pessoas é muito curta e o conhecimento da história do Brasil é inexistente. O brasileiro é o produto da mistura de europeus, índios e negros. Aí está o belíssimo povo que surgiu, mas nem por isso deixamos esquecidas as nossas raízes culturais.
O amazônida é o campeão mundial da preservação florestal. Há 60 anos, o Brasil era detentor de apenas 7% de toda a floresta nativa do planeta terra. Hoje, possuímos 28%.
Depois de conversar com vários segmentos da sociedade amazônica, cheguei à conclusão que o amazônida está disposto a encabeçar um grande movimento e constituir um fundo para iniciar um grande programa de reflorestamento em parceria com a Grã Bretanha, Estados Unidos, França, Itália e outros países que ao longo dos últimos 60 anos devastaram as suas florestas.
Algumas pessoas têm badalado muito sobre a Amazônia. Fica a impressão de que o amazônida é um perigoso devastador, um desmatador, um inimigo. Vamos parar com isso: o amazônida é um brasileiro como outro qualquer. Apenas com coragem suficiente para viver e desenvolver a Amazônia.
Os amazônidas pedem àquelas pessoas que habitam o nosso lindo planeta se abstenham de falar ou emitir juízo sobre a Região Amazônica e seu povo sem antes conhecê-los.
*Em 2019, o rebanho bovino e bubalino do Pará era de 20,5 milhões de cabeças, segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa)
**Hoje o Ministério do Meio Ambiente (MMA) adota uma postura totalmente diferente daquelas de 2009
Nenhum comentário:
Postar um comentário