sexta-feira, 29 de março de 2013




Programas, planos e projetos para quem?
Autor: José Alberto Tostes

            Participei na semana de várias bancas de avaliação que incluem a realização de seminários, bancas de qualificação de mestrado e trabalhos de conclusão de curso. O que havia de comum entre os temas, a discussão sobre projetos e programas internacionais, nacionais, regionais ou locais. Os programas abordados estão relacionados às diversas políticas como: Calha Norte, Programa Ultraperiferico da União Europeia e o Plano Nacional de Ordenamento Territorial. Um dos pontos que destaquei em relação aos inúmeros planos, programas e projetos é a distância dos princípios estabelecidos e o fim a ser alcançado.
Um dos pontos mais importantes na abordagem de qualquer documento está vinculado ao propósito do alcance na esfera local, ou seja, na ponta, onde tudo deveria teoricamente ser alcançado, quase sempre documentos oficiais trabalhados em esfera macro, como é o caso do Programa da União Europeia para as chamadas ultraperiferias são propostas que apresentam encadeamentos consistentes do ponto de vista técnico, mas considera tais áreas subservientes aos interesses de quem propõe, porém, as proposições são muitas vezes unilaterais na abordagem, a Guiana Francesa, é um exemplo clássico. A população destas regiões ultraperifericas não tem a oportunidade de opinar sobre este tipo de programa. Os “vizinhos” destas regiões são tratados na sua essência como superperiféricos, na prática, o resultado tem sido um conjunto de entraves institucionais.
Os programas institucionais de largo alcance, como a proposta para as áreas ultraperifericas como sugere a União Europeia deveria estabelecer minimamente os canais de diálogos institucionais prevendo a similaridade de proposições que reduzissem as grandes diferenças de concepção política institucional. Concretamente isso representa muito para o estado do Amapá e Guiana Francesa, no caso da Guiana, não existe a oportunidade para inserir novas concepções. O programa é unificado para todas as regiões, desconsiderando uma suposta ideia sistêmica das políticas internacionais que acabam envolvendo interesses diversos, políticas idealizadas pressupõem estabelecer níveis de diálogos para aperfeiçoar ações idealizadas.
No caso da União Europeia esta visão é muito pragmática, fica reduzido aos “vizinhos” se adequarem a este contexto. Entretanto, deve-se considerar que do lado brasileiro que inclui o Amapá, existe uma autonomia relativa em conduzir os reais interesses de uma cooperação internacional ampla. Os atores locais estão muito distanciados deste contexto, nestes últimos anos, estive atuando no município de Oiapoque, por muitas vezes estabelecemos a conexão com a Prefeitura de Saint George e com a Agência de Desenvolvimento da França. Para ambos os lados, Oiapoque e Saint George, há um consenso, não são ouvidos quando se trata de discutir os interesses efetivos da fronteira.
Nesta situação, a questão global não dialoga com os atores locais, os prefeitos são reféns de um cenário adverso, burocratas de plantão tentam idealizar uma visão generalizada, mas não sistêmica sobre a realidade na fronteira, isolando as políticas macro institucional esteja mais próxima do real. Nesta direção, abordei durante a semana a ênfase sobre a necessidade de se compreender melhor a escala local. Sobre o programa Calha Norte, é válido ressaltar que a origem deste programa esteve diretamente relacionado a defesa militar do território, nos últimos anos teve mudanças metodológicas no alcance, inclusive vislumbrando a discussão sobre a perspectiva de desenvolvimento regional.
Sobre o programa Calha Norte, quando se trata de estado do Amapá, o volume de recursos viabilizados para somente quatro municípios ficou em torno de 11 milhões de reais, tratando-se de impulsionar o desenvolvimento, algo pífio, pois se tratam de investimentos secundários como creches, serviços de drenagens, postos de saúde, etc. Podemos refletir que tais investimentos são puramente secundários para considerar a vertente do desenvolvimento. Portanto, este programa no caso do Amapá, não tem impulsionado o desenvolvimento. O volume de recursos acessados é reduzido, também evidencia a pouca capacidade dos gestores em pleitear e obter um volume maior de investimentos. Qual é o problema destes programas? O maior problema está relacionado às questões institucionais: há um enorme distanciamento entre o programa e a finalidade; não há perspectiva de realização de níveis de qualificação para compreender o programa como algo importante para proporcionar o desenvolvimento; os programas não dialogam com outros programas, também pouco considera a realidade institucional do lugar.
Qual a relação entre o programa da União Europeia e o Calha Norte? Basicamente ambos desconsideram a visão sistêmica institucional, apesar do programa da União Europeia ser mais abrangente, se equivoca quanto aos resultados práticos. Para que tais programas, planos ou projetos tenham êxito, é importante pensar nas escalas e nos níveis de atuação, a partir do momento em que os programas são unificados e desconsideram uma realidade especifica, as chances de resultados efetivos são reduzidas, muitas vezes encontram profundos obstáculos para serem superados.
Sobre o Plano Nacional de Ordenamento Territorial elaborado pelo governo brasileiro, não houve nenhum tipo de cobrança mais efetiva para que todos os estados cumprissem a meta de elaborar o plano estadual, tão pouco foi dado aos municípios à oportunidade de abrir linhas de financiamento para concluir os planos diretores paralisados por falta de recursos. Os municípios são reféns de um modelo “cruel”, a União e os estados concentram a maior parte do volume de recursos, e os municípios que absorvem uma “avalanche” de problemas, não conseguem se sequer, acessar os recursos de programas, em tese deveria servir de suporte para o desenvolvimento. Os programas por enquanto, tem a face do burocratismo, exacerbado e exagerado, só aumentam as desigualdades sociais e regionais, bem como, transformam áreas ditas periféricas e ultraperiféricas em objeto de estudo em algum tipo de anomalia. A minha impressão, é que apesar da ampla revolução comunicacional, estamos com imensa dificuldade de conexão entre o global e o local. Então, qual a finalidade dos programas, planos e projetos?

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