Breve análise sobre os professores no Brasil
Vida de professor não é fácil, e parece que os governantes, sobretudo, ainda não perceberam isso - ou não se importam, pela constatação um tanto óbvia de que, com a valorização e disseminação de oportunidades escolares a todos, num ambiente propício ao desenvolvimento do pensamento crítico, esses homens de terno estariam varridos quase que automaticamente de seus cargos.
Neste último feriado, dia 1 de agosto, professores da rede pública do Estado do Amapá declararam greve por tempo indeterminado. Desta vez, a luta da classe docente busca a atenção do governo para o projeto de lei que incorpora 100% da regência dos professores ao salário da categoria, deixando. Não caberá a nós, aqui, discutir a validade ou não das exigências específicas dessa greve. O ponto é outro, mais amplo.
No entanto, uso a seguinte explicação (bem específica) para puxar meu gancho: de acordo com o jornalista-internauta Matheus Madeira, da cidade de Tubarão, em seu blog, "a regência de classe", agora reivindicada em 100% pelos docentes do Amapá para os seus salários, "foi um artifício encontrado há alguns anos para incentivar os professores a permanecerem na sala de aula, já que os baixos salários estavam desmotivando a classe e cada vez mais profissionais buscavam atividades extra-classe, como as diretorias e o trabalho em bibliotecas. A regência seria uma forma de compensar o estresse da atividade de professor".
E que estresse! Esse texto é para tratar exatamente sobre esse outro aspecto do mundo em crise que os mestres enfrentam rotineiramente: a desvalorização e "perseguição" por parte das escolas e dos alunos.
Muito poderia ser citado aqui para ilustrar a situação de um professor no Brasil. Carga-horária escravizante, porque, caso contrário, o salário, que já é insuficiente e não condizente, seria irrisório; a obrigação de uma adequação cega às exigências de escolas particulares; ter de suportar a pressão (maior até que a colocada sobre os alunos) por resultados de vestibular; desvalorização social da profissão; cursos de licenciatura defasados por conta da depreciação do ofício... Enfim, a lista é grande. E parece urgente apontar, testemunho maior desse quadro tão triste, a subordinação forçada do professor a instituições e indivíduos a quem, na verdade, ele mesmo é que deveria educar e conduzir, não o contrário.
Acontece que experimentamos neste século a inversão de papéis entre mestre e aprendiz. Não que desejássemos ter sempre o aluno no papel de "aquele sem luz", sem conhecimento algum, e muito menos queremos voltar às palmatórias, sabatinas e joelhos no milho. Mas é certo que a régua agora esteja na mão de pirralhos caprichosos?
Uma das situações mais odiosas que vivenciamos hoje, nesse quadro invertido de subordinação e insubordinação, autoridade e autoritarismo, conhecimento como poder e dinheiro como poder, é quando um professor perde seu cargo em determinada escola particular, por exemplo, porque algumas crianças resolveram se unir e apresentar queixa ante a direção/coordenação do colégio, sabotando o profissional. O professor é então demitido. Justa causa? Não sei... Ao final das contas, a queixa desses alunos era algo como: "A aula dele é tão chata!". Só mesmo no Brasil...
A situação é tão comum, ao ponto de já nem nos sensibilizarmos. Mas, se você for parar para pensar, perceberá como é absurdo reivindicar a demissão de alguém simplesmente com base no "eu pago o salário dele, eu quero, eu mando!".
Se uma aula for, de fato, considerada chata pelos alunos, talvez o último na lista de culpados seja o professor. Pense melhor: e se os próprios alunos formarem uma horda tremendamente desinteressada? E se o sistema imposto pela escola sobre a didática do mestre for, na verdade, metodologia ineficiente e tediosa?
Essa metodologia imposta está quase sempre vinculada à sede de resultados, que acaba por atropelar os mecanismos mais livres e eficazes de aprendizagem. Hoje, as aprovações no vestibular representam uma parcela gorda de publicidade e, consequentemente, movimentam o mercado. Escolas particulares são empresas, não é mesmo? Educação tornou-se também mercadoria. E, muitas vezes, numa empresa, se esquece a questão humana...
Pois bem, com essa corrida "vestibulística", a maioria dos colégios hoje tem infligido sobre a didática dos professores, sufocando-os, a sede por aprovação, por notas altas em exames universitários, enquanto o mais importante (transmissão e absorção reais de conhecimento) acaba eclipsado pela urgência de treinar os alunos a marcarem mais bolinhas num cartão-resposta em menos tempo que o "adversário".
Já está institucionalizado e sedimentado esse sistema-bitola no Brasil. Poucas escolas escapam. E imagine se não nos tivéssemos focado quase que exclusivamente no universo dos problemas dos colégios pagos... O texto não acabaria hoje! Mas vale ressaltar que, nas escolas públicas, embora seja um mito pernicioso a ideia de que não há aprovações ao ensino superior, os índices de rendimento são baixíssimos. Culpa do professor? Também não.
Culpa desse abismo social, moral, psicológico em que estudantes de menor renda estão encerrados: ao mesmo tempo em que tentam estudar, têm de lidar com problemas como os de criminalidade em seus bairros, falta de segurança, fome, medo...
Enfim, conclui-se que a situação dos professores é mais grave do que costumamos considerar. Sobre esta classe e estrato da sociedade trabalhista, se equilibram e se refletem praticamente todas as mazelas da realidade brasileira. Tendo isso em vista, devemos, pelo menos, parar de torcer os narizes ao ouvirmos falar da próxima greve de professores... Um recesso é pouco diante do universo de precariedades e omissões que eles conseguem conciliar enquanto realizam diariamente o seu trabalho-missão-pesadelo.
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