sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Apagões elétricos
Dano emergente e lucro cessante


Reinaldo Coelho
Da Reportagem

 
Empresario Paulo Melem indignado com a CEA 
Vivemos atualmente em uma sociedade dependente da eletricidade. Em todos os segmentos da população, a eletricidade é usada continuamente.

Na Zona Rural é comum vermos uma antena parabólica instalada nas casas dos moradores indicando a presença de um aparelho de televisão. Aparelhos elétricos como chuveiro, ferro de passar roupa, geladeira, TV, aparelho de som, telefone são comuns nos lares brasileiros. Podemos imaginar como seria difícil a nossa vida sem o uso desses aparelhos.
Na maioria das empresas vemos computadores, caixas usando código de barras e cartão de crédito para pagamento. Tudo isso interligado à rede elétrica e à internet. Todos esses dispositivos são dependentes da eletricidade. Também vemos o uso intenso da eletricidade nos hospitais, nos sistemas de comunicação (rádio, televisão e internet), na administração pública, nos sistemas de transportes, na produção e conservação de alimentos.

No setor industrial o uso da eletricidade também é fundamental. É difícil imaginar uma indústria sem motores elétricos que fazem movimentar os diversos equipamentos.

Na década de 50, Macapá sofria com os apagões programados, pois a energia do então Território do Amapá era produzida por usinas termelétricas movidas a óleo diesel e as maiorias dos empresários tinham de possuir geradores próprios. Isso foi resolvido com a construção da Usina Hidrelétrica do Paredão, foi um salto para a modernidade na década de 70.

A partir daí o Amapá, com a transformação em Estado, procurando o seu desenvolvimento econômico, foi incluído na expansão do Linhão de Tucuruí e a construção de três hidrelétricas, sendo uma no município de Porto Grande, outra em Ferreira Gomes e a de Santo Antonio em Laranjal do Jari.

Porém o gargalo energético se manifestou na distribuição da energia pela velha CEA, a nossa complicada e endividada Companhia de Eletricidade do Amapá que constantemente vem mantendo desligamentos zonais, além da energia oscilante, causando queima de eletroeletrônicos.

Entretanto, o maior prejuízo está recaindo nas empresas que necessitam da energia elétrica para executarem suas atividades produtoras. Os que têm mais somados esses problemas são os comerciantes e produtores de gêneros alimentícios.

Um caso emblemático foi o ocorrido em dose dupla na Chácara São José, localizada no Distrito de Fazendinha (Macapá). A empresa atua no ramos de piscicultura, suinocultura e eqüinocultura. O seu proprietário, Paulo Roberto Melém, recebeu a reportagem indignado com a situação a qual passou entre os meses de julho e agosto.
60 mil Tambaquis de 200 gramas mortos
Ele narrou que depois das sucessivas quedas de energia sofridos no mês de julho, aconteceu um apagão durante três dias, o que lhe causou a morte de 60 mil tambaquis de 200 gramas, por falta de ventilação, ou seja, os aradores queimaram deixando de renovar a oxigenação dos tanques.

“Infelizmente é esse tipo de irresponsabilidade que temos que cobrar. Não podemos mais aguentar, é assim que vocês querem desenvolver o Estado paralisando os pequenos empresários, fazendo a gente demitir, nos fazendo fechar as portas, mas vocês não vão conseguir, vocês vão ver do que são capazes de fazer os pequenos empresários unidos, nós vamos nos unir contra essa situação absurda  da falta de energia”, desabafou o empresário.

Os fatos

Nos dias 19, 20 e 21 de julho ocorreu um apagão no Distrito de Fazendinha. A Piscicultura São José tinha em seu viveiro 70 mil tambaquis do tamanho de 200 gramas, ou seja, de 90 dias de criação, para eles chegarem aquele tamanho, foi gasto R$ 55 mil de ração, algo em torno de 30 toneladas. “A partir daquele tamanho é feito uma pré-seleção e eles são distribuídos em outros tanques para crescimento e engorda. Essa é uma fase muito delicada, pois nesse momento o peixe precisa de muito oxigênio, renovação de água e sol. E para garantir que isso aconteça e funcione 100%, utilizamos os aeradores. Possuímos dois deles que atendem uma área de 5000m2, aumentando assim a capacidade de oxigenação dos tanques. E o que aconteceu? No dia 19 de julho faltou energia por voltas das 14 horas e começou uma oscilação intermitente, os aeradores “torraram”. As bombas de 7 mil cavalos foram todas “queimadas” informou criador de peixes.


De acordo com Paulo Melém sua primeira providência foi acionar a empresa de distribuição de energia, no caso a CEA. “Eu tenho foto do meu celular com contatos (veja foto). Por volta de 23:00 horas comecei a fazer as ligações e não fui atendido.


De acordo com a legislação, tanto que a empresa tome conhecimento da situação, ela deve imediatamente mandar uma equipe para verificar a situação relatada e autorizar o reparo dos danos, principalmente quando se trata de animais vivos.

Sem manifestação da CEA o empresário teve  que providenciar o mais rápido possível a solução dos problemas causados pelo apagão. Contratou com um técnico particular que providenciou os consertos, porém, mesmo assim não pode evitar a grande tragédia, que ele narra indignado.

“No outro dia, amanheceram meus 65 mil tambaquis mortos pela falta de oxigênio. Pois, a noite o nível de oxigenação vai para praticamente zero e o aerador segura, porém estava queimado. Meu prejuízo foi de 15 toneladas de peixe, financeiramente um peixe nesse tamanho custa R$ 4, totalizando R$ 260 mil. Porém, se eles cumprisse o ciclo de nove meses para o  crescimento e engorda, teríamos   140 toneladas de pescado que vendidos a R$ 8 resultaria em R$ 1.120 milhão. Esse quantitativo corresponde a 80% da nossa produção/ano”.



Piscicultura

Paulo Melém, economista, especialista em gestão pública explicou que atuar na piscicultura é um dos melhores investimentos, pois peixe se vende em qualquer local em qualquer hora, ele é a base alimentar do cidadão amazônico. “É um negócio muito lucrativo. Para iniciar fiz pesquisa de mercado e constatei esse fato. Pode produzir 300 toneladas de peixe/ano, que tudo será consumido pelo amapaense. O quantitativo de consumo de peixe aqui no Amapá é diferente do sudeste, a média é pequena. Na Amazônia é a base alimentar” disse Paulo.

Empreendedorismo rural

A reportagem analisou junto com o produtor Melém o início das atividades da sua empresa rural. “Com referência ao meu empreendimento, que foi iniciado em 2007, com seis tanques, conseguimos chegar hoje a uma escala de produção de 150 toneladas/ ano, podemos assim dizer que em nível de produção a Piscicultura São José é uma das maiores do Estado” declara Paulo.

Ele relata que tem abastecido o mercado macapaense e utilizado a estrutura montada pela PESCAP, pertencente ao Governo Estadual. “Na Semana Santa o governo estadual, anunciou a colocação de 100 toneladas de pescado para a venda nos postos da PESCAP, 50 toneladas foram da nossa piscicultura, isso ao preço de R$ 8 o quilo do Tambaqui vivo. O GEA entrou com essa estrutura. Porém, ao mesmo tempo em que ele entra com essa estrutura, a Companhia de Eletricidade do Amapá (CEA) não nos garante a regularidade de produção” declara.

“Recentemente conseguimos licença ambiental, para abrirmos mais 10 tanques, e procuramos executar essa ampliação com meios de baixar o custo dos serviços. Temos todas as licenças ambientais, tenho autorização do DNPM, tenho parceria com os oleiros, eles cavam os tanques e pegam a argila licenciada e leva para produzir as telhas e tijolos com destinos a construção civil. Isso reduz meus custos para a escavação, pois só cavei seis tanques, pois cada um custa em torno de R$ 40 mil e com a parceria economizei nos custos do empreendimento e que chega à mesa do consumidor, pois barateia o quilo do peixe” finalizou Melém.


Denúncias

Pedro Melém convocou a imprensa e denunciou o descaso da CEA com os pequenos e médios empreendedores. “Constantemente procurei a CEA e nada foi resolvido então comecei a por a “boca no trombone”. Pedi um laudo de uma empresa especializada, no caso a PESCAP, pois os melhores engenheiros de pesca estão atuando na instituição. Tenho esse laudo do PESCAP, que confirma que as normas são seguidas, que é realizado análise de água a cada seis meses obrigatoriamente. A Embrapa é nossa parceira,  não tive como esperar a CEA para consertar a bomba, pois lido com material vivo, sem  bomba morreriam mais peixes. Juntei todas as notas dos serviços de consertos, de acordo com informação eles só ressarcem se eles observarem. E com esse laudo me preparei para acionar a CEA administrativamente e pedir o ressarcimento, eu quero o que perdi, pois o conserto de uma bomba custa R$ 450” declarou Paulo.

Repeteco

Porém o pior estava por vir, tudo se repetiu no dia nove de agosto, a empresa São José recebeu uma remessa de 50 mil alevinos às 20hs e mais uma vez tinha acontecido um apagão, entre as providências anteriores o proprietário adquiriu  um gerador pequeno. “Para prevenção em vista ao apagão de julho e passamos a colocar os alevinos no tanque, e mais uma vez não tínhamos como ligar o aerador, estava queimado novamente. O resultado qual foi? A mortandade total da remessa recém adquirida. Mais R$ 15 mil de prejuízo, parece que não é nada, porem daqui a 12 meses teríamos 100 toneladas em média” informou.

Esses prejuízos que além de doer no bolso do empreendedor, trás problemas aos que dele dependem. “Tenho nos quadros da empresa dez funcionários, com carteira assinada. Com mais esse prejuízo me veio à indignação. Eu tinha um empréstimo do FNO de R$ 100 mil peguei uma parte desses recursos e comprei um gerador maior, porque não dá mais para confiar. Porém a CEA terá de me repor os prejuízos” cobra Paulo.




Biodigestor

A Chácara São José além de piscicultura trabalha com eqüinocultura e suinocultura, de acordo com Paulo Melém, devido às circunstâncias catastróficas acelerou a montagem do projeto de instalação de um Biodigestor para produzir biogás e biofertilizante. Um biodigestor é um sistema simples para conseguir resolver as questões energéticas e ambientais, bem como realizar uma gestão adequada dos resíduos, tanto humana e animal. “Temos 200 porcos de raça que fornecerão os detritos para a produção do biogás e o meu gerador deverá receber um adaptador para funcionar com o diesel e o biogás. Então essa será minha saída, para não depender da energia elétrica incerta fornecida pela CEA e terei gás de graça, que irei transformar em energia. O gerador deverá ter três pontos, um para o biogás, outro para o diesel, o terceiro da CEA” relatou Paulo.

O pior de tudo é que a empresa não realiza um planejamento, pontuado os locais críticos, onde a energia é essencial para a produção industrial, causa prejuízo do dono da quitanda ao grande produtor. E não envia uma comunicação aos seus consumidores, detalhando mensalmente os dias e horas dessas interrupções, para que as pessoas pudessem se prevenir. “Meu vizinho Pedro Bastos tem uma olaria aqui próximo com quatro fornos parados há dias. Como a sua produção é de aproximadamente 40 milheiro por dia/forno, o prejuízo é enorme, e  ele  emprega  mais  de 150 pessoas que dependem da produção para terem seus salários. Ele não tem perda material, mais tem prejuízo econômico” informou.

No Pólo hortigranjeiro do PA da Fazendinha, existem 560 produtores, que dependem de irrigação para molhar suas hortaliças, se ficarem sem molhar um dia perderão tudo. “Hoje faltar energia no Pólo da Fazendinha e no Pólo Industrial é prejuízo econômico para os  empresários e para o estado e município que não arrecadam” disse.

“Eu estou procurando uma alternativa, pois a piscicultura para mim é uma fonte renda, uma garantia de subsistência. Sustento dez pais de famílias com todas as garantias sociais e previdenciárias. Peixe vende, aonde for ele vende. O cidadão compra no Mato Grosso do Sul o tambaqui a R$ 6,50 e ele paga por quilo para chegar congelado aqui a R$ 8 e é vendido de R$ 14 a R$ 18 o kg. Porque o peixe de lá chega a 2 a 3 kilos? Por que o produtor tem dois mil hectares, sendo mil de lâminas d’água e mil de plantação de arroz, cevada, etc... E tem sua fábrica de ração. Aqui temos condições de vendermos a R$ 8 o kilo. O entrave é a falta de investimento na industrialização local da ração, que serviria para baratear o preço do peixe.

O Amapá já tem produção suficiente para industrializar a fabricação de ração local. O setor agrícola cresceu muito. Na produção de soja de 2013 foi colhido 70 mil sacas. Já a produção de farinha estagnou, pois ainda se mantém numa produção artesanal. A soja, o milho e o sogo, que são a base para se fazer uma ração de qualidade, já são produzidos no Amapá.

Paulo explica que conseguiu “suframar”, através da Área de Livre Comercio de Macapá e Santana (ALCMS), a sua empresa. “As 60 toneladas que adquiro em Anápolis (GO), já vem com 14,05% de desconto. E vem a CEA e me quebra no nascedouro do meu empreendimento” reclama Paulo.


Paulo lembra que o Amapá já teve uma grande produção avícola, que abastecia o mercado local. “Eram muitas as granjas que criavam as aves e vendiam in natura para os amapaenses, com a vinda dos Supermercados, começou a ser importado frangos de outras unidades e com o preço exorbitante da ração, elas foram fechando e hoje dependemos totalmente da importação desse segmento. O mesmo aconteceu com o leiteiro, o município de Amapá, produzia leite e o industrializava, transformando em iogurte, faliu. Porém com a piscicultura isso não acontecerá” finalizou Paulo.

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