sexta-feira, 28 de março de 2014

ARTIGO DO TOSTES

José  Alberto Tostes
tostes.j@hotmail.com / josealbertotostes.blogspot.com

Cidade, pobreza e moradia no contexto amazônico: a visão através dos indicadores - Parte II



No artigo anterior debatemos sobre um  conjunto de reflexões sobre a natureza do espaço urbano na região amazônica. Discutimos a participação dos gestores no processo relacionado às assimetrias regionais, os desdobramentos e implicações para os municípios e cidades da região. Nesta segunda parte, enfocamos o problema especifico relacionado às enfermidades e a questão dos indicadores em toda região. Os pontos levantados para a região amazônica são apenas fragmentos da realidade brasileira, portanto, é uma abordagem para evidenciar questões para serem analisadas e debatidas por todos os segmentos sociais e políticos.
De acordo com DATASUS, somente no ano de 2012, de um quadro de 35 endemias verificadas na região, 24 são provenientes da desestruturação do ambiente urbano, o que permite avaliar que estamos tratando o efeito e não a causa. Durante parte do ano, chove muito na região, é significativo o número de doenças provenientes do ambiente urbano, situação que piora a partir do momento em que um número considerável de habitações são consideradas inadequadas, ou de acordo com o Ministério das Cidades, Caixa Econômica e outras instituições como IBGE que classificam de diversas formas o processo de ocupação urbana em áreas úmidas, precárias, sub-formais ou desestruturadas.
Sempre quando se discute os temas nacionais importantes, ocorre logo o paralelo sobre a visão ufanista do local, de que naquela região é pior do que na outra e vice-versa, durantes anos, é verdade que este ponto de vista ficou acirrado em função das "brigas" coloquiais por feudos e loteamento de cargos públicos. A uniformidade das políticas nacionais foi sempre outro fator que colocou o debate sob a síndrome da desconfiança. Como é possível perceber um Brasil tão diverso da mesma forma? Entender esta lógica parece ter permeado o comportamento dos agentes institucionais em todo o país.
No caso da região amazônica, estamos diante de um cenário complexo: áreas com grande extensão territorial, terras indígenas, estradas e rodovias, projetos hidrelétricos, madeireiros, agroflorestais, minerais, entre tantos outros. Na grande maioria dos municípios os maiores problemas estão relacionados de acordo com IBGE as condições de acesso ao saneamento básico,  bem de supra importância, que é água, dados do próprio IBGE atesta que para cada ponto oficial de água tratada na região, existe pelo menos 02 ou 03 pontos de água obtido através do rio, lagos, igarapés, poços amazonas e poços semi-artesianos, boa parte desta água é consumida sem nenhum tipo de análise, contribuindo para um quadro de doenças crônicas como: diarreia, tifo, problemas de gastrites, do intestino e inflações estomacais. Conforme o próprio DATASUS, parte destas doenças se transformam em enfermidades graves, o que sobrecarrega o sistema de saúde em todo o território nacional.
Então, a pergunta importante para se fazer é a seguinte: o Brasil precisa de mais médicos ou de categoricamente urbanizar as cidades com qualidade? A pergunta não tem objetivo desmerecer o setor de saúde, tão pouco uma classe tão importante como a do setor médico, mas apenas fomentar o debate, boa parte dos nossos problemas é estrutural. No caso amazônico, a situação se agrava pelos indicadores relacionados à economia, saúde, educação e questões ambientais e de infraestrutura, tais indicadores só crescem desfavoramente todos os anos, além de todos os itens citados, os fatores de violência e a problemática social se agravou intensamente nas duas últimas décadas.
O que fazer diante de um cenário preocupante para a região e para todo o Brasil? Esta pergunta deve ser feita a toda sociedade civil. Os índices de capital social na região amazônica também são reduzidos, significa que prevalece o poder econômico dos grandes grupos para fazer valer os interesses corporativos e capitalistas. As capitais amazônicas absorveram nas últimas décadas a sobrecarga de grandes projetos, sem conseguir transformar o cenário adverso provocado pelos impactos urbanos, sociais e culturais. 
Um item que vem sendo muito utilizado na região tem sido a judicialização de tudo, episódio que demonstra a clara fragilidade dos poderes constituídos para conseguir amenizar os problemas existentes. A participação da Justiça e do Ministério Público cresceu assustadoramente quando se trata de discutir temas que são de responsabilidade do legislativo e do executivo. Os índices institucionais, econômicos, sociais e ambientais dos municípios amazônicos de acordo com o trabalho da Incubadora de Políticas públicas da Amazônia (projeto IPPA) coordenado pela UFPA/NAEA com a participação de todas as universidades federais da Amazônia atestaram através de estudos sistematizados e consistentes, entre os anos de 2000 a 2010 os municípios da região tiveram os índices bem abaixo da média nacional.
Portanto, o contexto da pobreza e moradia na região não irá ser superado apenas com investimentos como os programas: "Minha Casa, Minha Vida" e o "PAC", será preciso compreender a realidade regional integrada ao contexto nacional, minimizar impactos futuros.  Outra reflexão importante a ser analisada, trata-se dos dados registrados no Portal da Transparência do Governo Federal a respeito da aplicação dos recursos oriundo dos mais diversos programas nas áreas de educação, infraestrutura, meio ambiente e saúde. Os desvios de finalidade são imensos, só configuram o fato, a pobreza na região não é apenas relacionada às questões de renda, também é de caráter ético e moral, implicando no agravamento das condições de vida, tanto nas áreas urbanas como nas áreas rurais.

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