sexta-feira, 21 de março de 2014

ENTRELINHAS

Arley Costa - Professor da Unifap, Doutor em Ciências pela USP, diretor do SINDUFAP

É possível ser feliz?

O casal exalava amor por onde passava. Cruzaram olhares ainda na faculdade e nunca mais se largaram. Os dois conseguiram, cada um em sua profissão, estabelecer uma carreira sólida e bem sucedida. Ao longo dos anos, construíram bela casa e uma condição financeira estável. Compreenderam que o momento era ideal para o nascimento do filho tão sonhado.  Suspenderam o controle de natalidade e a gravidez aconteceu. Alegria contagiante irradiava de seus rostos após a confirmação da gestação. Eram a imagem da felicidade.
Tudo seguia bem, até o obstetra desconfiar de uma alteração, solicitar exames e confirmar que a criança nasceria com síndrome de Down. A notícia, apresentada pelo médico aos pais como uma lástima, despencou sobre o casal como uma bomba. Sem mais informações ou equipe de apoio, a família  vê-se só, diante do fato. As dúvidas parecem brotar do chão como ervas daninhas. As respostas, por sua vez, de tão rarefeitas, parecem não existir. O comentário do médico de que, cerca de um nascimento a cada 600 é de pessoas com síndrome de Down e que, em geral, está associado à idade da mãe, não ajudou muito. De fato, deixara a mãe ainda mais atordoada, achando que a culpa fora sua em adiar o nascimento do filho. Entre o choro, a busca por informação na internet e a insônia durante a noite, as perguntas se sucedem. O que pode fazer uma pessoa com síndrome de Down? Quais suas capacidades? O que posso fazer pelo meu filho? Nós seremos felizes, sendo pais de uma criança com síndrome de Down? E a pergunta mais recorrente de todas: Meu filho será feliz? 
Afortunadamente há respostas para essas e muitas outras perguntas que povoam a imaginação de mães e pais surpreendidos pela notícia de que o filho será diferente de como sonharam. Em 2014, a Coordown, uma associação italiana de apoio a pessoas com Síndrome de Down criou um belíssimo vídeo (http://bit.ly/1ddl3JA) que busca responder algumas dessas perguntas. O vídeo é narrado pela fala entrecortada de várias crianças com síndrome de Down de diferentes nacionalidades. 
O texto oriundo do vídeo é: "No dia 9 de fevereiro, recebemos este email de uma futura mãe: 'Estou esperando um bebê. Descobri que ele tem síndrome de Down. Estou assustada: Que vida terá o meu filho?' Hoje, responderemos a ela assim… Querida futura mãe, não tenha medo. Tua criança poderá fazer muitas coisas. Ele poderá abraçar você. Poderá correr ao teu encontro. Poderá falar e dizer que te ama. Poderá ir para a escola como todo mundo. Poderá aprender a escrever e poderá escrever para você, se um dia estiver longe. Porque, sim, ele poderá viajar também. Poderá ajudar o pai dele a consertar sua bicicleta. Poderá trabalhar e ganhar seu dinheiro. E com esse dinheiro poderá te convidar para jantar fora ou alugar um apartamento e morar sozinho. Às vezes será difícil, muito difícil. Quase impossível. Mas não é assim para todas as mães? Querida futura mãe, seu filho pode ser feliz. Como eu sou. E você será feliz também". Ao final do vídeo, uma menina vira e pergunta: "Certo, mãe?" e um abraço lindo, terno e afetuoso deixa claro que essa felicidade existe.
Uma pessoa com síndrome de Down, como qualquer outra, pode viver uma vida feliz. Mas é preciso interagir com a vida. Nada de esconder o filho ou negar a ocorrência da síndrome. Coloque seu filho no colo, de frente para o mundo e passeie com ele. Leve-o a todos os lugares que você iria com seus outros filhos. Diga a quem perguntar que ele é uma criança com síndrome de Down. Busque informações o máximo que puder. Esclareça aqueles que se aproximarem e perguntarem. Tente não se inquietar ou sofrer com os olhares que alguns cravarão sobre sua criança. Busque apoio para o desenvolvimento de seu filho desde a tenra idade. Terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos, fisioterapeutas e diversos outros profissionais podem colaborar muito para o desenvolvimento de seu filho. 
Prepare-se para o momento de ingresso na escola. A inclusão, embora importante, ainda é embrionária e isso causará algumas dificuldades. Escolas, direção, corpo técnico e professores, mesmo naquelas escolas onde há interesse em fazer a inclusão acontecer, ainda estão descobrindo os caminhos. Todas as experiências têm mostrado que a escola regular é o melhor ambiente para o desenvolvimento das crianças com síndrome de Down, não apenas como local de socialização, mas como espaço de aprendizagem de fato. Individual e coletivamente participe das discussões e da implantação sobre inclusão onde quer que venha a se estabelecer. 
Busque e ingresse em uma associação sobre síndrome de Down e participe dos eventos em sua cidade. O dia 21 de março (21/3) foi escolhido para ser o Dia Internacional da Síndrome de Down como uma referência à trissomia do cromossomo 21. Há muito o que conquistar no sentido de construir uma sociedade inclusiva onde o indivíduo com síndrome de Down seja respeitado em sua individualidade, como qualquer pessoa. A inclusão é um elemento importante na consecução da autonomia, independência e felicidade das pessoas com síndrome de Down e seus pais. Lutemos pela inclusão porque é direito de todas as pessoas serem vistas não por suas limitações, mas por suas capacidades! Juntos, podemos fazer isso possível! Quanto à felicidade, com ou sem síndrome de Down, seu filho será feliz! Você será feliz! Certo, mãe?

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