BARBARA COSTA
POLIANA INVERTIDA
Sempre fui muito Poliana ao contrário. Tudo está
razoavelmente bem porque nunca perco de vista a convicção de que tudo pode
sempre dar muito errado.
"Cautela! Cautela!", brada o meu coração, e embora
eu nem sempre o escute, ainda assim, como religião, nutro esse pessimismo
estoico e resiliente que me serve de boia a todo instante. E de que modo não é
este um pensamento deprimente eu explico: é que assim nunca me frustrarei,
desavisada, com a possibilidade de que algo que tem tudo para dar certo - e
está mesmo dando certo - acabe por dar desastrosamente errado, porque, afinal,
a possibilidade do desastre e do fracasso nunca foi esquecida por mim. E às
vezes o fracasso até mesmo me alenta, porque todo fracasso é meio que um
descanso, e eu amo estar aí, à-toa na vida.
É claro que tenho medo de fracassar, e exatamente por isso
(olha só como a teoria é redondinha!) nunca perco a possibilidade de vista.
Porque ter tanto medo do que pode não dar certo já me faz obcecar com a ideia
da frustração, e, assim, obcecada, a própria primeira ideia da possibilidade da
falha já me amortece à segunda concepção concreta da falha real. De modo que,
alimentando o medo de doer, não dói tanto, já se está vacinado.
Lidar com as frustrações antes mesmo de elas se
materializarem é quase uma arte, um estudo. O que me amestrou nessa vida foi o
fato de eu estar muito atenta a todas as experiências "Chanel Nº 5"
que tive nessa jornada chamada ser. Chanel Nº 5 é uma categoria formal que eu e
um amigo meu, Alexandre, sistematizamos para catalogar tudo aquilo que é
superestimado, tudo aquilo sobre o que se projeta muita expectativa, e que não
se confirma, tudo o que parece mesmo muito bom, tudo o que promete, tudo o que
encanta e se vende como messias, tudo o que admiramos bastante de longe, mas
que, ao chegarmos perto, revela-se broxante. Frustra. Chanel Nº 5.
Porque, veja, a fragrância da deusa Marilyn nada mais é do
que cheiro de talco e um eflúvio preguiçoso de uma coisa apaziguada, muito
próprio da pele dos velhos. Foi uma decepção quando descobrimos. A deusa não
apenas envelheceu: a deusa não existe.
Essas experiências de fragrâncias metafóricas ensinam a
gente. Nada é tão bom que não possa não ser. Saber assim a vida é ser Poliana
invertida. Não há trauma. Hoping for the OK, expecting the worst - adaptação
minha. Mas uma coisa sobre esta Poliana tornou-se nestes últimos tempos uma
verdade ainda mais forte e pulsante do que o costumeiro otimismo às avessas...
É que me pego sempre dizendo "vai dar certo", "vai dar
certo". É uma das frases que se diz muito aqui em Fortaleza. E isso
juntamente com o "olha aí, as coisas melhorando!" são dos emblemas
mais significativos - e que mais gosto - de uma nova identidade adquirida, que
transporto para a pessimista Bárbara que fui até hoje, modificando-a, ensinando-a
a ter um pouco mais de fé nas coisas.
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