ARLEY COSTA
Extinção
de universidades federais? – Parte 2
Em “Extinção das universidades
federais?” começamos a entender a relação entre o PL 4330 que trata da
terceirização, a ADIN 1923 que trata das Organizações Sociais e o processo de extinção de universidades, hospitais e
órgãos de pesquisa com transferência de suas atividades para uma empresa do
terceiro setor através da publicização.
O “propósito
central do Projeto Organizações Sociais é proporcionar um marco institucional
de transição de atividades estatais para o terceiro setor e, com isso,
contribuir para o aprimoramento da gestão pública estatal e não-estatal”. O
propósito é bonito, entretanto, começamos a vislumbrar no texto anterior como
esse discurso da contrarreforma do Estado, proposta por Bresser Pereira no
governo Fernando Henrique Cardoso e que se estende até hoje, escamoteia um
processo de extinção de órgãos públicos como universidades,
hospitais e órgãos de pesquisa com a subsequente transferência de suas
atividades para uma empresa do terceiro setor.
Vimos como o PL 4330
que tramita no congresso federal e a posição do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADIN) 1923/98 que trata do estabelecimento de
Organizações Sociais (OS), conforme preconizado pela Lei 9637/98, são faces
desse desmonte do Estado. E como, sob o eufêmico termo publicização, a
contrarreforma, hoje capitaneada por Dilma Rousseff, visa retirar o Estado do papel de executor ou prestador de serviços como
saúde, educação, cultura e pesquisa. Para compreender esses preceitos, vamos
destacar trechos do caderno oficial intitulado “Organizações Sociais”
(Secretaria da Reforma do Estado. Brasília: Ministério da Administração e Reforma
do Estado, 1997, Cadernos MARE da reforma do estado, v. 2, p. 18), que aparecem
ao longo deste texto entre aspas, bem como suas implicações.
A proposta de
Organizações Sociais (OS) assume a publicização como estratégia de reforma do
Estado (denominada aqui de contrarreforma por retirar direitos dos cidadãos). Com
a publicização, o Estado transfere para a OS suas atribuições, bem como
recursos, bens e equipamentos, desobrigando-se de prestar o serviço e passando
a ser, simplesmente, um órgão de controle. As entidades (universidades, museus,
institutos de pesquisa...) cujas funções vierem a ser absorvidas por alguma OS,
deverão, em sua maioria ser extintas. A OS ao absorver as atividades de uma
entidade, adotarão a denominação e o símbolo da entidade extinta. Como
entidades de direito privado, “Do ponto de vista da gestão de recursos, as
Organizações Sociais não estão sujeitas às normas que regulam a gestão de
recursos humanos, orçamento e finanças, compras e contratos na Administração
Pública”. Fica aqui uma pergunta, se os recursos do Estado, inclusive com
dotação no Orçamento Geral da União, serão destinados as OS, e estas poderão
usá-los com a liberdade inerente à iniciativa privada, por que as entidades que
serão absorvidas não podem ter um regime de funcionamento que facilite sua
gestão financeira?
É interessante notar que não se trata
da conversão de uma entidade estatal em uma OS, é a extinção do órgão do Estado
e a criação de uma organização social que passa a assumir as funções da
primeira. Isso fica claro no caderno Organizações Sociais ao tratar do processo
de publicização. Segundo o texto: “A
implementação de Organizações Sociais implica duas ações complementares: a
publicização de determinadas atividades executadas por entidades estatais (que
serão extintas); e a absorção dessas atividades por entidades privadas
qualificadas como OS, mediante contrato de gestão. Portanto, é imprópria a ideia
segundo a qual organizações estatais seriam convertidas ou transformadas em OS.
Atividades (não exclusivas de Estado), não entidades, são publicizadas.
Entidades estatais são extintas após a publicização de suas atividades; não
convertidas em OS”.
Então, as OS surgidas após o processo
de publicização, embora mantenham os nomes das entidades das quais assumiram as
atividades, são outras instituições completamente diferentes. Isso deixa claro
que as instituições como universidades federais e entidades de pesquisa
passarão a existir e ser regidas sob outra lógica. O nome Universidade Federal
do Amapá, por exemplo, continuará existindo, mas será outra instituição, agora
uma OS e não um órgão federal e, portanto, não será mais regida pelo Estado.
Este se desobriga dessa atividade e passa a controlar a instituição por meio de
contratos de gestão que deverão ser executados pela ‘OS Universidade Federal do
Amapá’.
A figura “Processo de publicização”
deixa claro que será efetivada a “extinção da entidade estatal”, cujos recursos
serão inventariados e, quando da assinatura do contrato entre o Estado e a OS,
esta receberá daquele recurso, cessão de pessoal, permissão para uso de
patrimônio e sub-rogação de contratos. Entidades como as universidades
federais, por exemplo, deixarão de existir sob a forma pela qual
tradicionalmente as conhecemos. Embora o discurso do caderno OS negue, os
contratos de gestão caminharão para a obtenção de lucro, portanto, é uma
privatização das universidades. Focadas no lucro, encerra-se toda a ideia do
ensino nestas instituições como um direito social e a educação brasileira
caracteriza-se de vez em sua face mercantilista. Mesmo que o passo inicial como
tem sido efetivado em algumas instituições como a Empresa Brasileira de
Serviços Hospitalares (EBSERH) não tenha se caracterizado pela imediata
extinção dos entes públicos cujas atividades ela tem assumido, nada garante que
os movimentos seguintes caminhem para a lógica prevista na contrarreforma de
Estado apresentada por Bresser Pereira.
Militantes sociais e sindicais,
principalmente de movimentos estudantis combativos e de sindicatos de docentes
e servidores técnico-administrativos lutaram arduamente (as greves são parte
relevante desse combate) e conseguiram impedir o processo de privatização da
universidade brasileira até agora. O horizonte próximo que se vislumbra é o de
extinção de órgãos públicos. Extinção de entidades de pesquisa, extinção de
museus, extinção de universidades federais. E você, como se posicionará em
relação à extinção desses órgãos e da universidade que você estudou, estuda ou
pretende estudar? Agora é o momento de posicionamentos! É o momento de lutar!
Participe!
Processo de
publicização. Fonte: “Organizações Sociais”
(Secretaria da Reforma do Estado. Brasília: Ministério da Administração e
Reforma do Estado, 1997, Cadernos MARE da Reforma do Estado, v. 2, p. 18).
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