Bárbara de Azevedo Costa
Mas nem tanto
Eu estava em busca de um
tema para escrever esta coluna e, aproveitando minha estada aqui na casa da
vovó, perguntei à prima Clara, enquanto sossegadamente nada fazíamos no sofá da
casa a contemplar o marasmo das férias, alguma sugestão de ideia para explorar
no texto desta semana. Minha prima veio com sugestão na hora: "Escreve
sobre o que a gente vive... O fato de que nunca vai relaxar".
Pode até parecer absurdo
falar em não relaxar quando estamos bem no comecinho das férias, fazendo nada e
falando besteira pelos cotovelos. Mas acontece que dentro da gente há sempre um
mundo de preocupações em ebulição. As coisas todas sempre jogadas a frente,
para o que virá. A eterna ansiedade e a ocupação com as coisas do futuro, de
modo que, pensando tanto em tudo, e até sofrendo por antecedência, nunca
relaxamos na vida.
Essa é, realmente, a fase
que vivenciamos. Mas quando é que não estivemos nesta fase? Estamos sempre a
buscar um porvir. É a percepção de que, a cada nova etapa que cumprimos, nunca
nos satisfazemos, vêm sempre novos anseios, demandas e esperas.
Minha prima me diz sobre a
ansiedade de terminar o ensino médio, já sentindo a necessidade de ocupar a
cabeça com a próxima etapa, enquanto eu, que termino a faculdade, já me ocupo e
me preocupo também com coisas futuras, demandas que nem sequer me foram postas
à frente, por ora, como urgentes. Mas não é essa a grande questão humana? Não
somos só eu e Clarinha.
Enquanto conversávamos sobre
o assunto, lembrei imediatamente de um livro que li quando era pequena, na
escola, e embora eu já não saiba seu título nem as palavras exatas, recordo que
contava sobre a invenção dos objetos todos que há no mundo, e como um casal,
que moravam numa caverna em épocas pré-históricas, iam construindo coisas em
busca de conforto.
Saíram da caverna,
construíram uma cada, coseram roupas, utensílios domésticos, sempre em busca de
satisfação e felicidade, e sempre encontrando a cada nova meta alcançada um
novo problema.
Cada página com cada
invenção do casal terminava com uma frase que dizia mais ou menos assim:
"E todos estavam finalmente felizes... Mas nem tanto". E vinha em
seguida a necessidade de uma nova criação, necessidade criada pelo próprio
ciclo frenético de invenções do casal. Até que terminam a história de volta à
caverna, com as roupas primitivas, descalços, para simplesmente contemplarem as
estrelas, como faziam antigamente. E nunca foram tão felizes.
Com a lembrança dessa
história, logo me vem, junto à percepção de que vivemos ansiosos de modo geral
desde o início dos tempos, também o reconhecimento da necessidade de
simplesmente parar um pouco a corrida frenética da vida para contemplar um
pouco as estrelas. Olhar as estrelas é viver um dia de cada vez, viver
agora. E deixar que os próprios dias tragam seus desafios, sem que eu os
antecipe. Algumas vezes a única obrigação diária pode ser exatamente a
necessidade de desaprender a se preocupar, pelo menos um pouco, para aproveitar
também o agora.
Nenhum comentário:
Postar um comentário