sexta-feira, 7 de agosto de 2015

PIONEIRISMO


Celerina Cardoso dos Santos


Uma homenagem póstuma + 1934 * 2015

O Bairro Central perdeu um dos seus grandes patrimônios, Celerina Cardoso dos Santos, moradora fundadora do bairro e da Avenida Euclides da Cunha, onde residia a quase quatro décadas. Quatro gerações conheceram essa mulher que diariamente percorria a pé essa rua que começou piçarrenta e alagada, participou das festas juninas de ruas, foi madrinha de muitos jovens que jogavam o futebol de rua, festejava as Copas de Mundo. Tudo era motivo de festa e alegria para a Dona Celé, sua residência recebia todos sem distinção. Os churrascos regados ‘a gelada’ eram feitos na frente de casa. Festas Juninas, aniversários, Natal, Réveillon. Os pratos típicos tinham o toque de Celerina. Criou seus filhos, sozinha, cozinhando para os primeiros governadores do Território Federal do Amapá, que lhe tinham carinho e respeito. Trabalhou com as primeiras-damas no inicio do Abrigo São José, cozinhando para os “seus velhinhos”. Amava a natureza, gostava dos banhos do “Areial”, não perdia uma “farra” com os filhos. A alegria e animação de Celerina eram contagiantes.

Celerina Cardoso e os filhos

Neste domingo (2), cumprindo o presságio de Mês do desgosto, Celerina nos deixou, partiu silenciosamente, a dor veio de surpresa como um tsunami nos nossos corações e abateu uma família que tinha nesta matriarca seu norte de vida, honestidade e amor ao próximo. A saudade será eterna e a presença não poderá mais ser sentida, mas as lembranças dos bons momentos vividos são um ótimo conforto, que permanecerá para sempre conosco. O tempo necessário para toda esta dor ir embora é ainda indeterminado, mas todos os dias em que a coragem de seguir em frente vencer a tristeza devem ser devidamente comemorados.


Uma homenagem do Jornal Tribuna Amapaense a Celerina Cardoso, que o lia aos domingos, não perdia uma edição sequer e torcia pelo nosso sucesso e, sempre que podia colaborava nas reportagens dando seus comentários e participando das matérias. Descanse em Paz.

Acompanhe a homenagem dada a essa guerreira na Edição 160, do TA, em 7 de março de 2009.


Dos bastidores da política para o Abrigo São José


Isabelle Braña

Afuaense, nascida em 1934, mãe de quatro filhos e viúva. À primeira vista essas informações não parecem interessantes. Elas tornam-se comuns, já que são típicas das histórias corriqueiras da comunidade macapaense. Mas é detalhando a passagem de cada ponto citado anteriormente, que a vida de Celerina Cardoso dos Santos ganha um tom interessante e admirável.


Dona Celé, apelido carinhoso dado pelos familiares, era uma mulher vitoriosa. Ela cresceu com os ensinamentos oferecidos pela vida e teve muita força de vontade para continuar o seu caminho. Quando tinha apenas nove anos de idade seus pais faleceram, fato que a levou a ter uma nova visão sobre o mundo. Nessa época ela passou a ser criada por seus familiares, mas foi sozinha que ela teve os grandes ensinamentos. Os anos foram passando e quando Dona Celé completou 16 anos, veio para Macapá, terra que permaneceu até sua morte.
Ela não sabia, mas a capital do meio do mundo viria a ser uma peça importante na sua vida. Quando chegou aqui, a convite de uma prima, ela começou a trabalhar como emprega doméstica. Com a adolescência e o início da independência seus caminhos foram cruzados com o de Venâncio Souza Costa.
Desta união, nasceram os filhos Mário Sérgio, Maricélia, Aluísio e Edson. Com alguns anos de casamento, Dona Celé separou-se e aí as coisas começaram a mudar. Sua paixão pelas comidas a levou a prestar serviços como cozinheira. Era da renda obtida que ela sustentava as quatro crianças, que na época foram assumidas apenas por ela. Com os aprendizados, seus dotes culinários foram se aperfeiçoando e sua fama crescendo e foi então que ela passou a trabalhar na residência oficial do governador da época, Terêncio Furtado de Mendonça Porto. O sucesso de sua comida fez com que Dona Celé permanece ainda nos governos de Luiz Mendes da Silva e Ivanhoé Gonçalves Martins. Foram mais de dez anos cozinhando na residência oficial. Durante esse período ela ganhou muita experiência e mais uma família. Celé casou-se com Antônio Conceição de Souza e teve mais uma filha, chamada Marilene. Foram vinte anos de uma união regada com amor, respeito e carinho. “Sinto saudades dele, éramos muito companheiros e bastante amigos. Fico feliz por ter sido tratada respeitosamente pelos dois maridos que tive”.
Os constantes contatos com importantes autoridades do Estado e da região fizeram com que ela vivenciasse os bastidores da política, ficando a par das principais situações e segredos da década de 50 e 60, época em que a política estava começando a ficar em alta, segundo ela. “Eu vi e ouvi muitas coisas naquela época. Era impossível não ficar sabendo de algumas coisas, mas os funcionários eram muito discretos”. Durante sua estadia na residência oficial ela fez parte da equipe de cozinheiros do presidente Castelo Branco, momento guardado na sua lembrança até os dias de hoje.
Após um longo período cozinhando para os governadores, ela foi transferida para o Abrigo São José. Foi nessa fase que ela se encantou. Servir as pessoas era uma coisa que Celé adorava fazer, ainda mais se tratando “dos velhinhos”, como ela costumava dizer.

Sua entrada para o Abrigo lhe trouxe grandes oportunidades. Foi lutando pela causa deles, que Celé passou a viajar com um grupo de amapaenses todos os anos, o Grupo da Terceira Idade, hoje da Melhor Idade. Conheceu os Estados de cidades brasileiras, como Rio de Janeiro, Bahia, Argentina, São Paulo, Rio Grande do Sul, Paraguai, Santa Catarina, Maranhão e Paraíba foram alguns dos muitos lugares que passou.

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