‘Uma cidade refém da chuva’
Chuva constante e consistente afunda Macapá
Reinaldo Coelho
Mais uma vez a cidade sucumbiu a um temporal.
Na última semana milhares de moradores de Macapá, Santana e localidades
adjacentes estão convivendo com as consequências das fortes chuvas que têm
caído sobre o Estado do Amapá.
A culpa não é da chuva e sim da falta de
planejamento das administrações municipais, que não conseguem implementar a
execução de um projeto de saneamento básico e principalmente de galerias de
escoamento de águas pluviais e acabar com o assoreamento dos principais canais
de Macapá e Santana, assim como as áreas de ressaca que cercam a capital
amapaense.
São crianças, adultos e idosos que precisam
atravessar um verdadeiro aguaceiro para simplesmente entrar ou sair de suas
próprias casas. É preciso pôr os pés dentro da água suja, cheia de lixo e
dejetos de animais, sob o risco de contrair diversas doenças. Eles já estão
cansados de viver o mesmo transtorno todos os anos, durante o inverno
amazônico.
Desde o último domingo (17), as fortes chuvas
que caem provocam estragos em várias regiões da capital. Prejuízos se acumulam
com os alagamentos que invadem com frequência casas e comércios.
Na última terça-feira (19) a Defesa Civil
registrou vários pontos de alagamento, com algumas famílias desalojadas pelo
fato de terem suas casas invadidas pelas águas. O Centro comercial foi uma das
áreas mais atingidas. Em alguns locais carros ficaram parcialmente submersos.
Os prejuízos ainda estão sendo contabilizados. Em um trecho da Av. Cora de
Carvalho, no Centro da capital, um morador usou um caiaque para sair de casa. O
vídeo acabou viralizando na internet.
Apesar disso, o município informou que muitos
pontos foram considerados críticos. Frentes de trabalho atuam para desobstruir,
principalmente bueiros, que estão tomados por lixo. O trabalho de drenagem
dessas áreas é feito por uma força-tarefa de trabalhadores da Prefeitura de
Macapá.
Tanto a Defesa Civil Municipal – responsável
pela primeira resposta – quanto a Defesa Civil Estadual mantém equipes nas ruas
e de sobreaviso.
A Companhia de Eletricidade do Amapá (CEA)
também mantém o plantão reforçado para atender as interrupções provocadas por
queda de árvores e outros sinistros.
Na altura da Ponte Sérgio Arruda o canal do
Jandiá transbordou alagando parte do início da Avenida Mato Grosso. Alguns
motoristas tiveram que fazer o retorno para acessar o Centro da cidade e
bairros da Zona Sul pelo bairro Pantanal.
Falta de planejamento leva a caos
Essas situações tem culpados, mas não a
natureza. Há alguns que dizem que somos reféns do clima, mas as chuvas não tem
culpa de termos as cidades impermeabilizadas e sem sistema eficiente de
drenagem.
A impermeabilização da cidade é um dos
principais motivos para o caos. O brasileiro tem a cultura de impermeabilizar
até o quintal de casa e sem espaços de infiltração natural na terra. E as grandes
imobiliárias constroem garagens nos subsolos. Para onde a água vai escoar?
Mas isso não justifica o caos verificado nas
ruas. Até porque a cidade tem de estar preparada de janeiro a janeiro. É certo
que a capital amapaense e o município santanense estão localizados a beira do
Rio Amazonas e são cortados por milhares de Igarapés e de pequenos canais que
abastecem as milhares de ressacas que dominam o cenário ambiental das duas
grandes cidades do Estado do Amapá.
E isso desde a sua fundação, em 1758, e nunca
foi feito nada para aliviar a força da natureza, ao contrário, aterraram os
igarapés que ali existiam e os transformaram nas principais vias da Macapá.
Porém a natureza retoma o que é seu, e com força, e isso vem acontecendo,
considerando que as medidas paliativas não vem resolvendo, resultando no
dinheiro jogado nos canais de drenagem.
Isso não está acontecendo somente na cidade
antiga, os novos bairros estão sofrendo ainda mais, pois não possuem sistema de
drenagem fluviais e as que tem são ineficientes, e não suportam uma chuva
normal, alagam rapidamente.
Um dos principais problemas é o lixo.
A cidade de Macapá, cortada por igarapés e
banhada por um dos maiores rios do mundo, está enfeitada de lixo. Toneladas e
mais toneladas de dejetos são retiradas todos os meses da orla da cidade e dos
igarapés. As ruas são tomadas de todo tipo de lixo, que são atirados das
janelas dos carros, pelos pedestres e até das janelas das casas.
Não se trata de conscientizar a população,
como se ouve falar desde que o mundo é mundo. Falta criar na população um
sentimento de pertença, para que as pessoas
tenham a legitimidade à sua individualidade, ao seu desenvolvimento e
crescimento. A cidade precisa ser encarada como a casa
de cada cidadão. Assim sendo, é necessário que se estabeleçam regras e punições
para aqueles que as desobedecem. Jogam-se colchões velhos, restos de sofás,
carcaças de fogões e geladeiras, pedaços de móveis nos igarapés e ninguém é
responsabilizado por isso.
À época em que não existiam garrafas pets
toda a população comprava refrigerante com as garrafas de vidro retornáveis.
Havia um comércio de garrafas escuras, responsável, às vezes, pelo sustento de
famílias. Algum iluminado criou as garrafas descartáveis para aumentar o lucro
das empresas, mas ninguém se deu conta de que causariam um prejuízo ambiental
de largas proporções, como vem ocorrendo atualmente. Está na hora de mandar a
conta para quem ganha dinheiro com esse lixo: as indústrias de plástico e de
bebidas.
E finalmente é preciso atacar o problema da
poluição das águas. Em Macapá, e nos demais municípios amapaenses, centenas de
milhares de toneladas de esgoto são despejadas nos leitos de rios e igarapés. Falta
tratamento de esgoto. Porque países com poucos recursos hídricos conseguem
tratar seus esgotos e o Brasil não consegue avançar nesse propósito?
Tratar o esgoto e retirar os canos que
despejam dejetos nos igarapés é uma medida importante para convencer o cidadão
a não jogar lixo nos cursos d’água. É caro? Não tenha dúvida, mas é
infinitamente mais barato do que os gastos com saúde para tratar uma população
que vive às voltas com as doenças provocadas pela falta de saneamento básico.
Para que isso possa um dia acontecer é
necessário que todos botem a mão na massa, mas o poder público deve tomar as
rédeas, senão nada vai mudar.
Ações da Prefeitura de Macapá
Mesmo com fortes chuvas, trabalhos de limpeza nos canais
continuam.
Seguem os trabalhos de limpeza dos canais de
Macapá feitos pela prefeitura da capital, dando continuidade à programação do
Plano de Inverno. A ação envolve a retirada de lixo e a desobstrução, que evitam
transbordamento dos canais. Mesmo com a chuva intensa, nesta terça-feira (19),
os serviços de limpeza e remoção de entulhos estão concentrados no canal do
Nova Esperança, na Travessa José Gomes Bezerra.
Até o momento foi retirado aproximadamente 10
toneladas de lixo. São carcaças de máquina de lavar, garrafas PET, cadeiras de
plástico, dentre outros. As atividades estão concentradas em toda extensão do
canal e seguirão o cronograma para o canal do Jandiá. A manutenção da limpeza é
feita periodicamente pela Secretaria Municipal de Manutenção Urbanística (SEMUR)
e de acordo com o secretário Augusto Almeida essas ações estão sendo
intensificadas para que a população não seja ainda mais prejudicada.
“É uma programação que seguirá, não iremos
parar. Porém a população precisa fazer a sua parte, não jogando lixo nos
canais. Isso dificulta nosso trabalho, e tanto a população quanto nós perdemos,
se essas práticas continuarem. Vamos zelar pelo que é nosso”, explica o
secretário.
A limpeza dos canais é imprescindível para a
circulação e o equilíbrio das águas, pois eles permitem a determinação da
pressão dos leitos fluviais primários e orientam o escoamento e o trânsito das
águas interiores e superficiais com o rio Amazonas.
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