SARAVÁ!
Ao Dia
Estadual da Cultura Afro amapaense
"Sempre que eu abro o terreiro,
eu faço pensando em Deus". Sacerdotisa Dulce Moreira
Reinaldo Coelho
Comemorado em 8 de maio, o Dia Estadual dos
Cultos Afros foi instituído pela Lei nº 0933/2005. A data foi escolhida em
homenagem à Dulce Costa Moreira, a “Mãe Dulce”, uma das precursoras da cultura
afro-religiosa no Amapá e fundadora do Terreiro de Santa Bárbara. Ela teria
tocado pela primeira vez o Tambor de Mina no Estado, no dia 8 de maio de 1963,
depois que veio do estado do Maranhão.
Em relação ao dia 8 de maio, o culto afro já é
celebrado em todos os terreiros amapaense. O objetivo foi fazer com que a data
seja reconhecida pelo poder público, dando garantias de apoio institucional. Socorro Moreira, filha da mãe Dulce, deu
continuidade à missão da mãe, e considera a lei uma conquista para o segmento.
“É o poder público reconhecendo que somos casa
religiosa. É uma grande conquista, ainda falta muito, mas é um início. Ainda
sofremos com tanta discriminação, mas nessa luta diária, uma conquista nos faz
seguir adiante”, falou Socorro.
Como começou
Mãe Dulce contava que começou a desenvolver o
dom desde os 13 anos, aos 27 começou na umbanda. Sofreu com o preconceito que
existia na época, mas nunca deixou de lado sua fé nos santos, nas entidades e
caboclos. Muitas pessoas a procuravam para tratar de doenças, problemas
financeiros e atrapalhos.
Além de negros, filhos de “macumbeiros”, era
assim que os filhos de Dulce Moreira eram taxados. Ela contava na época que
“meus filhos tiveram que aturar ser chamados de ‘filho da macumbeira’ pelos
colegas da escola. Mas eu não deixava isso me atingir".
Novo ritmo
Os trabalhos realizados no terreiro de Mãe
Dulce causaram grande estranheza em quem assistia ao ritual do Tambor de Mina pela primeira vez. O rito prestava homenagens às entidades, pretos velhos e
caboclos.
Até hoje, tradicionalmente, bate-se o tambor
no dia 8 de maio, sempre em homenagem à cabocla Mariana. Os mais populares pais
e mães de santo de outros terreiros, e seus pretos velhos, caboclos e caboclas,
faziam-se presentes no terreiro. Dona Dulce dizia que sempre procurou explicar
que as religiões de origem africana não são um bicho de sete cabeças, e que
nada de ruim pode acontecer a quem as usa com amor e com o pensamento voltado
para coisas boas.
Cultos afro-religiosos
Com mais de 60 anos dedicados aos cultos
afro-religiosos, ela adorava cantar e dançar, e considerava uma importante
vitória para os praticantes de cultos afros o decreto que determina o dia
estadual da causa. "Fui muito perseguida, principalmente pelo povo e por
padres, que não aceitavam nossa religião e cultura. Depois da lei, sabemos que
temos tanta liberdade quanto os evangélicos ou católicos de nos
manifestarmos".
Para as novas gerações de umbandistas a anciã
mandava um recado: "É preciso trabalhar com respeito e muita fé".
Tambor de Minas
Dona Dulce fala que várias pessoas tiveram reações
que causaram grande estranheza em quem assistia ao ritual do Tambor de Mina.
"Muita gente 'caiu' (incorporou) naquele dia e começaram a dizer que eu
tinha jogado feitiço pra que aquilo acontecesse e que o feitiço que causou as
reações neles, vinha da fumaça da minha defumação. Eu expliquei pra eles que eu
não fazia nada, que não era a defumação e que aquilo acontecia porque aquelas
pessoas tinham a predisposição, a sensibilidade e que isso se manifestava
naturalmente.
Atualmente
Para os que tomam conta do terreiro de Mãe
Dulce na atualidade, o dia dos Cultos Afros significa uma oportunidade para que
a população seja convidada a refletir sobre a intolerância, que oprimiu durante
muito tempo as religiões afrodescendentes.
Na Umbanda são realizados os
"trabalhos", geralmente para pedir ajuda às entidades para solucionar
algum problema. Mãe Dulce dizia que os trabalhos mais procurados são os de
sucesso e amor. O Terreiro de Santa Bárbara,
no alto de seu 52 anos de existência, ainda resiste à ignorância daqueles que
desconhecem o valor de uma história de luta contra o preconceito aos cultos
afros-religiosos e que conseguiu através dessa luta, se fazer reconhecer e
aceitar. O Terreiro, conforme a vontade de Mãe Dulce, continua com suas
atividades, sob o comando de suas filhas Socorro de Oxum e Jaguarema de Ogum,
que com muito afinco e responsabilidade, dão continuidade aquilo que Mãe Dulce
acreditava.
Sacerdotisa Mãe Dulce
Dulce Moreira foi casada com João Batista
Moreira, mais conhecido por “Piloto” (falecido). Ambos trouxeram para o Amapá a
hierarquia de São Sebastião, originada da Encantaria do Rei Sebastião da Praia
do Lençol, no Maranhão.
Nossa pioneira era natural da Ilha do Marajó,
Estado do Pará, porém, Dulce Moreira era amapaense de coração. Junto com a
família, instalou em Macapá o primeiro terreiro de Umbanda. Há vários anos presidiu
a Federação Umbandista do Amapá e também era tradicional integrante da Ala das
Baianas da Escola de Samba Maracatu da Favela.
Aos 82 anos, em 2007, sofreu uma queda e veio
a falecer por conta de complicações respiratórias. Recebeu homenagens especiais
no seu enterro. Os brincantes e membros da direção da escola homenagearam a
ex-integrante da Ala das Baianas com toques de tambor e sambas de enredo da
Maracatu. Em seu lugar, como sacerdotisa, ficou sua filha Maria do Socorro, mãe
Socorro de Oxum.
Como mãe-de-santo, Dulce Moreira foi uma
mulher fundamental na afirmação dos cultos afros na sociedade amapaense.
Mãe
Dulce teve 15 filhos amapaenses e continuou trabalhando em prol do Tambor de
Mina e da Umbanda. A Umbanda é uma religião criada em Niterói no final do
século XIX, que tem sincretismo com o cristianismo e o espiritismo kardecista.
Na Umbanda são realizados os
"trabalhos", geralmente para pedir ajuda às entidades em algum
problema. Mãe Dulce dizia que os trabalhos mais procurados eram os de sucesso e
amor.
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