Todo dia é Natal
Por Lucimara Souza
Dezembro traz o cheiro, as
cores, o espírito do Natal. A chegada desse mês sempre me trouxe alegria, desde
criança. Não falo da alegria de comprar e ganhar presentes ou da comilança nas
ceias. Eu adorava ver minha avó montando o presépio, meus pais enfeitando a
casa e a árvore de Natal. Participar das Novenas Natalinas, da missa da véspera
(mesmo que fosse pra cochilar no colo da minha mãe) e ter minha família reunida
era igualmente delicioso.
Embora minha família tente manter a
mesma tradição, o que eu vejo hoje é uma preparação para o Natal ocupando um
campo extremamente capitalista, indo contra aquele espírito que eu aprendi a
enxergar ainda criança. Os tempos mudaram. As pessoas e os valores também.
Eu acreditei, sim, em Papai Noel. Por
pouco tempo, mas acreditei. É uma figura de sentimento bom, um ser a propagar o
bem. Meus pais nunca me disseram que Papai Noel não existia, entretanto, também
nunca alimentaram a ilusão em mim. Ainda pequena, eu já achava impossível um
homem daquele tamanho entrar pela janela do meu quarto ou em uma chaminé
qualquer por aí. Além disso, eles me ensinaram que presentes poderiam vir em
qualquer época do ano, não me deixando acreditar que Natal é época obrigatória
de se ganhar presentes. Fizeram certo? Pra mim, sim. Isso permitiu que meus
irmãos e eu não ficássemos frustrados se não ganhássemos o presente no dia de
Natal. Nem por isso eu deixei de ser criança, de sonhar, de imaginar.
Hoje, vejo que crianças acreditam
muito mais em Papai Noel do que eu acreditei. Eu acho bonito ver essa inocência
toda. Ainda que essa inocência atualmente tenha vontades demais, gostos caros
demais. Isso assusta um pouco. Aliás, por falar em susto, o que vi estes dias
nos meios de comunicação me fez refletir e confirmou minha opinião acerca da
educação que muitos pais estão destinando a seus filhos, a seus “inocentes”
filhos.
Como em todos os anos, homens,
geralmente idosos, de olhar sereno, e que gostam de crianças, são contratados
ou saem de forma voluntária para fazerem o papel do Papai Noel, a fim de
levarem alegria às pessoas. Saem em suas “carruagens”, passeando pelas cidades,
distribuindo presentes, balas e sorrisos.
Entretanto, para surpresa de um
destes homens, voluntário, representando o Papai Noel, o passeio foi bem
frustrante. O “bom velhinho” foi apedrejado em um bairro, ironicamente chamado
de Porto Seguro, em Itatiba, simplesmente porque as guloseimas que distribuía
acabaram. Apedrejado por um grupo de crianças. Crianças sem limites, crianças
sem educação, crianças intolerantes, que não admitem frustrações, crianças que
nunca souberam o sentido do Natal. Crianças que nunca tiveram pais que os
instruíssem, que os educassem, que transmitissem o valor do respeito ao
próximo.
Se a falta do doce, algo tão simples
e barato, que podia ser comprado em qualquer mercadinho no bairro pelos pais
destas crianças, gerou essa agressividade, fiquei imaginando se o presente
fosse algum objeto de maior valor. Realmente não sei se o Papai Noel estaria
vivo pra contar história hoje.
É muito decepcionante assistir a
atitudes como estas de seres “humanos” ainda tão jovens. Será este o reflexo do
ódio que contamina o país? Quando ouço ou leio: “a criança é o futuro do
país!”, tenho medo de crianças como estas vivendo o amanhã. Alguém precisa
fazer alguma coisa pra mudar a mente dos pais – apenas machos e fêmeas – que só
têm o trabalho de colocar o filho no mundo.
Sabe… Eu vivo dizendo que acredito na
força do amor. Acho que só este sentimento pode salvar o mundo e combater toda
maldade, crueldade e intolerância, mas minha esperança se abala diante dessas notícias…
Ultimamente o Natal ocupa um espaço
muito menos espiritual do que antigamente. A tradição ganhar e somente ganhar,
de comer determinados tipos de comida ou de qualquer outra atitude imposta
culturalmente pelo homem abafaram o legítimo sentido do dia, induzindo pessoas
a se preocuparem com tudo, menos com o menino Jesus.
Não é errado dar presentes, tampouco
recebê-los, no entanto, é preciso saber que tudo o que envolve Natal tem uma
simbologia. O gesto de distribuir balas, pelo Papai Noel, como o de Itatiba,
simboliza a tradição de se oferecer presentes, os mesmos presentes ofertados ao
menino Jesus pelos Reis Magos. É um gesto simbólico, não é uma obrigação.
É triste, mas a chama da fé, ainda
que esmoreça, não pode apagar.
Que estes dias que antecedem a data
sirva de meditação para nós, a fim de que nosso coração se abra e celebre com
alegria um verdadeiro Natal feliz, a real beleza da vida.
De que adianta o presente caro e a
ausência dos valores? De que adianta a mesa farta e poucas pessoas para
dividir? De que adianta a mensagem bonita e a atitude contrária? De que adianta
a casa toda enfeitada e iluminada se o principal da festa nem foi convidado?
Que tenhamos consciência de que Natal
é todos os dias, que todos os dias o Menino Jesus deve nascer em nós, que todos
os dias devemos praticar o cristianismo, que todos os dias devemos propagar o
bem, e que tudo isso deve ser ensinado no berço às nossas crianças.
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