– Direito & Cidadania –
Supremo Tribunal “terrivelmente evangélico”?
Dr. Besaliel Rodrigues
Em mais de cem anos de existência, o STF – Supremo Tribunal Federal brasileiro já teve quase duzentos ministros. Nenhum evangélico, a não ser o ministro Villas Boas, no final da década de 1950, quer era batista, mas não foi escolhido por este motivo, pois era amigo pessoal de Juscelino Kubitschek.
Que o Presidente da República Jair Bolsonaro foi eleito com o maciço apoio da comunidade evangélica brasileira e defendendo as principais bandeiras do ideário cristão nacional, cremos que ninguém tem dúvidas. Então, depois que tomou posse, o Presidente passou a fazer uma promessa pós-eleição em quase todos os eventos evangélicos em que é convidado: nomear um ministro evangélico para a mais alta Corte de Justiça do país, o STF – Supremo Tribunal Federal.
Tal promessa passou a ser reiterada acompanhada de um “mantra”: “vou escolher um ministro terrivelmente evangélico”. A partir de então, a oposição, a imprensa e a comunidade evangélica começaram a tentar decifrar o que queria dizer a frase “ministro terrivelmente evangélico”.
Os mais apressados foram logo afirmando que seria a escolha de alguém “cheio do poder espiritual”, no estilo dos pregadores que ministram falando em “línguas estranhas” do início ao fim da mensagem. Outros, mais moderados, disseram que seria um pastor-jurista, a ser colocado no STF para defender os interesses temáticos das igrejas cristãs. E outros, mais céticos, defenderam que tal promessa presidencial seria uma bravata ou, no máximo, que a futura escolha pode recair sobre algum jurista estratégico, de perfil evangélico e discreto. As expectativas ficaram no ar.
Então, com a aproximação da aposentadoria constitucional compulsória do decano da Corte, ministro Celso de Melo, vários candidatos ditos “evangélicos”, “pastores”, começaram a aparecer, dentre eles alguns oportunistas que ninguém nem imaginava serem crentes, quiçá pastores. Até listas tríplices feitas por lideranças eclesiásticas e por jornalistas de plantão circularam pelas redes sociais, pela imprensa e pelos corredores de Brasília.
Ao surgir a primeira vaga no STF, Bolsonaro surpreendeu a todos, indicando o anônimo Kássio Nunes Marques, desconhecido desembargador do TRF1, com apenas 11 (onze) anos de carreira, magistrado oriundo do quinto constitucional da OAB. Diversas ilações surgiram sobre o ocorrido, até aquela de que foi uma escolha para agradar o Centrão!!!
E a indicação do tal “ministro terrivelmente evangélico”, como ficou? Confrontado, o Presidente disse para terem paciência, que as coisas não são tão fáceis em Brasília e que a próxima vaga seria do tão esperado “ministro terrivelmente evangélico”.
Mas, o que o Presidente quer dizer com esta frase enigmática? Bem, nós, seres humanos, não têm onisciência, mas podemos fazer uma “leitura” do contexto e tentar traduzir tal frase.
A ascensão de Bolsonaro ao poder inicia com a sustentação incisiva de suas opiniões radicais contra a criminalidade, por ser militar, e o apossamento das bandeiras conservadoras e caras à sociedade brasileira, uma sociedade majoritariamente cristã, defensora da vida, da família, da pátria, dos bons costumes etc. Eleito e empossado, continuou a defendê-las com “unhas e dentes”.
Por outro lado, a atual geração de ministros do STF foi escolhida por governos de esquerda, progressistas, defensores de teorias contra majoritárias, para as quais as minorias devem ser pelo Judiciário tuteladas. Na opinião dos atuais ministros, valores cristãos não devem se sobrepor aos de minorias simpatizantes de comportamentos, a exemplo de uso de drogas, prática de aborto, relações homoafetivas etc. Mesmo que o Parlamento Nacional, representante máximo do povo brasileiro, “se manifeste em sentido oposto”, os atuais membros do STF defendem que possuem em suas mãos o poder de “contra majoritar” a vontade popular.
Diante deste contexto, o Presidente da República foi desafiado a confrontar ou, em palavras populares, a “peitar” a Suprema Corte. Prudente, tendo exercido por sete vezes o mandato de deputado federal e conhecedor das entranhas do poder nacional, Bolsonaro respondeu que não se muda um país dando um “cavalo de pau”, ou seja, com atitudes radicais, colocando em xeque a democracia.
Assim, quando o Presidente sustenta que indicará um “ministro terrivelmente evangélico”, pensamos ser uma forma verbal, didática e acessível de dizer que será alguém de direita, conservador, de conduta ilibada e notório saber jurídico e que, também, possua formação sólida com base nos valores cristãos, aceitos e professados pela maioria da sociedade brasileira, um país majoritariamente católico e evangélico. O Presidente quer indicar um ministro que não seja adepto de teorias contra majoritárias, mas de teorias engendradas no respeito à pessoa humana, ou seja, sem nenhuma acepção ao usuário de drogas, ao adepto do sexo livre, sem discriminação aos homossexuais etc., pois todas estas pessoas precisam de justiça, de dignidade, de consideração humanitária, de proteção do Estado etc., sem necessidade de afrontar e de desrespeitar a fé da maioria daqueles que, por motivo de crença, não comungam das mesmas opções de vida.
O futuro “ministro terrivelmente evangélico” é uma forma de dizer que a composição da Corte Suprema da Nação não pode ser assimétrica. A Suprema Corte do país deve refletir a imagem do povo, de forma, harmônica, temperada, calibrada, protegendo as opções das minorias e respeitando os anseios da maioria. Os pratos da balança da Justiça devem estar alinhados. Pensamos ser isto o que o Presidente da República quer dizer com a frase “ministro terrivelmente evangélico”.
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