quinta-feira, 29 de março de 2012

O Calvário de Constantino


por Roberto Gato
Superintendente

O autor alemão Franz Kafka tem entre as suas mais festejadas obras o romance “O Processo”. Que deve ser lido obrigatoriamente por todos os acadêmicos de direito e todos quantos presam e lutam pelo estado democrático de direito. Seu livro virou um Best- Seller da literatura mundial por ter retratado uma história com a qual a maioria dos homens já viveu, conhece alguém que tenha vivido ou esteja vivendo.

Em seu romance o autor conta a história de Josef K, um bancário que é processado sem saber o crime que cometeu. Apesar de ser um funcionário exemplar, dedicado, que ascendeu na empresa por merecimento, razão pela qual exerce um cargo de grande responsabilidade fruto de sua competência. A honestidade é predicado que sempre norteou a vida profissional da personagem.

Numa bela manhã, dia em que completaria 30 anos de banco, K é surpreendido por dois guardas que tomam o café que era pra ser dele e o acusam de suborno. Daí pra diante sua vida vira um inferno. Ele trava uma luta titânica contra as forças ocultas da justiça. Não consegue  entender o motivo de ser réu num processo que ele desconhecia literalmente. O fim de K é a morte. Apático e sem força para lutar contra a intolerância e a injustiça, ele contrata dois homens e pede que lhes tirem a vida. Assim foi feito.

O Amapá em pleno século XXI tem o seu Josef K. O juiz Constantino Augusto Tork Brahuna. Vejam as semelhanças entre o romance de Kafka e o calvário de Brahuna. Brahuna, advogado bem sucedido, professor concursado da Universidade Federal do Pará, assessor jurídico do governo paraense, com belos trabalhos realizados, autor da reforma tributária do Pará. Lutou a vida toda para ser um homem probo, honrado. Em 1991 foi aprovado no concurso para juiz do recém criado Estado do Amapá. Nomeado, ao longo de sua vida como magistrado, sua conduta tem se pautado no direito, suas decisões são fundamentadas no seu livre convencimento, na ética e na doutrina e jurisprudência moderna deste País. Brahuna não usa relógio. Assume nas primeiras horas do dia a judicatura e não tem hora para sair. Profundo conhecedor do direito civil, constitucional, administrativo, tributário e agrário.

Próximo da aposentadoria compulsória pela idade, Brahuna carrega no dorso quase quarenta anos de experiência no intrincado mundo do direito, 21 anos só de magistratura. Nada que desabone sua conduta. Um homem que a Amazônia tem orgulho de ter parido e ele de ser filho dessa rica e fausta região. Fez por merecer este privilégio.  Conhece-a profundamente. Deste solo não arredou pé e deitou conhecimento jurídico em prol de sua terra. Abre uma vaga no desembargo. Ele que já havia entrado em anterior lista de merecimento, juiz de carreira, na condição de magistrado volta numa relação de juízes de entrância final e a partir daí começa seu calvário.

A vaga a ser preenchida é por merecimento tendo em vista a aposentadoria do desembargador Honildo Amaral de Melo Castro, único magistrado do norte do País a ser convocado para o Superior Tribunal de Justiça. O ministro convocado em ato simbólico como faziam os romanos, passou sua toga em sessão plenária ao magistrado Constantino Brahuna, que segundo o conceituado jurista não havia ninguém mais preparado do que Brahuna para ocupar o assento que estava deixando de forma imaculada e com grandes trabalhos citados pelos maiores processualista deste país e que estão arquivados nos anais da justiça brasileira.

Os candidatos a vaga, juízes de entrância final que integram a primeira quinta parte da lista de antiguidade do Tribunal. Vamos para o concurso. Oito juízes são listados. Constantino Brahuna Rommel Araújo, Cezar Augusto, Stella Ramos, Sueli Pini, Mário Mazureck, João Lages e Eduardo Contreras.

Critérios de escolha:  Resolução 106-2010/CNJ, artigo 4º  e incisos I - desempenho (aspecto qualitativo da prestação jurisdicional);

II - produtividade (aspecto quantitativo da prestação jurisdicional);

III - presteza no exercício das funções;

IV - aperfeiçoamento técnico;

V - adequação da conduta ao Código de Ética da Magistratura Nacional (2008).
Brahuna venceu os dois processos e o CNJ impede sua posse e aí seu sofrimento agudiza.

Guardadas as devidas proporções entre a ficção e a vida real, há algumas situações no romance de Kafka que se aplicam integralmente ao caso do juiz Brahuna.

Conheça o caso
Sueli Pini, inconformada com a decisão
A Juíza Sueli Pini inconformada com o processo desde o início ingressa no CNJ, contestando o procedimento adotado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Amapá.

Os capítulos que se seguem são estranhos. Estes fatos foram fartamente denunciados neste jornal. Um deles foi o descumprimento do prazo de 40 dias determinado pelo CNJ para realizar a eleição, levando em consideração que Honildo havia se aposentado em 30 de novembro de 2009.

O descumprimento do prazo tinha propósito. Qual? Empurrar a eleição para meados de março data em que Dôglas Evangelista terminaria seu mandato de presidente e em seu lugar entraria Mário Gurtiev.

Sob a batuta do novo presidente e de acordo com a lei de organização do Poder Judiciário de 1991 a escolha do desembargador seria numa lista tríplice pelo presidente. As manobras que acalentaram o sonho de Pini foram os irregulares pedidos de vistas dos desembargadores Luis Carlos e Raimundo Vales ao que segundo as vozes roucas das ruas atendia os interesses palacianos. Assim Pini solicitou no CNJ o arquivamento do Processo de Controle Administrativo – PCA. Sustentava a juíza que todos os seus pedidos foram sanados pelo Tribunal.  Soou mais vez estranho a afirmação da controversa Pini, mas os observadores atentos entenderam sua manobra. Dôglas não era mais presidente.

Constantino pede o prosseguimento do PCA e que o CNJ ponha termo na querela e seja escolhido o mais votado, como determina a Lei Orgânica da Magistratura Nacional – LOMAN. E assim foi feito.  CNJ acolhe o pedido. Segundo afirmam os rábulas de plantão, essa decisão frustrou as pretensões de Sueli, que tinha como certo passar na frente de magistrados mais antigos, como Constantino e Cezar Augusto.

 Mais um capítulo inusitado então viria acontecer. Após sua derrota, com a escolha de Constantino ela volta à carga e reingressa no CNJ com pedido diferente, solicitando a anulação da escolha e sua imediata posse como desembargadora pelo Conselho.

O relator originário depois de meses acolhe a pretensão da juíza Sueli Pini, tira Constantino do desembargo e vota pela sua posse imediata. Chegando ao cúmulo de alterar sua nota do desembargador Raimundo vales de 96,10 para 102,22 pontos, ultrapassando o limite máximo que é de 100 pontos em 2,22 pontos. Erro grasso de aritmética ou um desejo incontido de favorecê-la?

Mas esse não foi o pior dos fatos. Estranhamente um dia antes da divulgação da nota os twiter em Macapá já publicavam que Pini teria sucesso na empreitada. E que bons ventos sopravam de Brasília em favor dela. “A Pereira conseguiu”, Twittou seu filho. A pergunta que não quer calar é: o voto do conselheiro vazou?

 Prevaleceu a sobriedade dos demais membros do CNJ que não embargaram nessa viajem telúrica, psicodélica que fere de morte a Constituição Federal e a própria jurisprudência do Supremo que define que a competência para a escolha dos novos desembargadores é dos Tribunais de Justiça. A Corte de Justiça amapaense cumprindo a risca a determinação do CNJ realiza nova eleição elevando a pontuação de Sueli Pini, porém nem assim ela não conseguiu seu objetivo.

Constantino vence novamente por livre convencimento dos desembargadores e o CNJ através do conselheiro, Neves Amorim, concede uma liminar num fato já consumado que é a posse do desembargador. Pasmem! O absurdo de sua fundamentação é que a posse do Constantino foi em 24h. Ora, posse é um ato natural e conseqüente. Estranho, dizem os entendidos do direito é conceder uma liminar imediatamente sem ao menos ter cautela de pedir uma informação, baseando-se simplesmente em pretensos fatos, no caso, afirmação de Sueli Pini de que o Tribunal tinha mantido a mesma nota.

Constantino Augusto Tork Brahuna luta contra um inimigo que não se combate na ceara jurídica, pois como K, ele não sabe qual o crime cometido para as sucessivas intervenções do CNJ que o impede de assumir o cargo no desembargo amapaense, conquistado por merecimento dentro dos critérios estabelecidos pela Resolução 106/CNJ
A Carta Magna diz que ninguém pode ser condenado por um crime que não cometeu. O delito de Constantino, pra não dizer o seu calvário foi ser um juiz zeloso, competente, brilhante e estudioso e ter a audácia de participar de uma eleição para desembargador pelo critério de merecimento. Bastaria que ele esperasse um ano e meio a mais e seria desembargador por antiguidade. Constantino está quase dois anos como juiz convocado para o Tribunal Justiça e desembargador. Além disso, já passou pelo TRE, foi juiz auxiliar da Corregedoria Geral de Justiça, foi presidente da Turma Recursal.

Como Josef K ao final do Romance “O Processo” de Franz Kafka que preferiu morrer ao ver triunfar a injustiça, Constantino hoje vê sua carreira brilhante na magistratura amapaense ter seu obituário decretado pela fúria das forças ocultas que caminham sorrateiras e invisíveis pelos corredores do Conselho Nacional de Justiça. Brahuna perdeu a condição de magistrado, pois não tem jurisdição. A Vara da qual era titular já foi preenchida. 

A competência, a dedicação, as noites insones de estudos em busca da excelência nas ciências jurídicas. Estes foram os seus erros. Que crime horrível.


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