segunda-feira, 16 de abril de 2012

Sobrevivente: Dona Tereza do Laguinho, um anjo negro entre nós

O Tribuna Amapaense lança a campanha. Vamos dar dignidade à mulher mais velha da Amazônia. Quem quiser ajudar é só entrar em contatos com os telefones 9154 0184 ou 8111 0711.

“Hoje tudo é uma devassidão, meu filho. Ninguém respeita mais ninguém!”
Tereza Rosa dos Santos

 por Roberto Gato

Como pode não ser Anjo uma criatura cândida, que está a cumprir os desígnios de Deus no plano terreno por 107 anos. Um amor. Um mimo de pessoa. Alegre. Lúcida. Lembra da vida bucólica e festiva do Curiaú do início século passado.

Com a memória de uma menina, ela lembra endereços, nomes e fatos. Afinal é mais de um século de vida. Nunca é demais repetir que são 107 anos. Isso não é privilégio dos simples mortais, até porque, esses já partiram para outro plano, mas Tereza não; Tereza teria que está aqui para contar como Macapá passou pelas transformações culturais, sociais e nos falou da forma mais singela de tudo isso.

“Hoje tudo é uma devassidão, meu filho. Ninguém respeita mais ninguém!” Talvez as palavras certeiras e firmes desse Anjo Negro seja a carapuça que nossos políticos precisem colocar na cabeça. E o amor, o respeito que devemos ter pelo cidadão amapaense desapareceu. Tereza evidencia numa introspecção que alcança o saudoso e eternamente querido, Capitão Janary Gentil Nunes. “Tenho saudade do Janary, ele incentivava o Marabaixo. Dava-nos a saia, a blusa e a toalha. As festas eram bonitas, e ele e sua família prestigiavam. Quando o Capitão vinha na estrada do Curiaú e via um de nós andando na estrada e se por um acaso um carro passasse e não desse carona, ele parava e perguntava: por que aquele carro não te levou? Se a resposta fosse que o motorista não quis parar, ele dizia para ficarmos aguardando e ia atrás do motorista, fazia-o voltar e nos dar carona”.

Bem, é claro que Macapá cresceu e hoje não poderia ser tão intimista a relação, porém, com certeza, o respeito pelo cidadão de Macapá foi-se com o crescimento da cidade, mas outra forma de demonstração de respeito para com o cidadão deveria persistir, como por exemplo, a prestação eficiente dos serviços públicos.

"Conversar com Tereza foi um achado.
É gostoso e prazeroso o papo.
Na realidade uma viagem no túnel do tempo".
Conversar com Tereza foi um achado. É gostoso e prazeroso o papo. Na realidade uma viagem no túnel do tempo. Tereza nos conta que mora naquele barraco que ganhou do mano Alceu situado na Odilardo Silva, bairro do laguinho, desde que ele a trouxe do Curiaú e a levou para trabalhar em sua casa. Ela se lembra do Paulo José, Jupiran, que ajudara criar. Teve um casamento com Raimundo Bento dos Santos. Perguntada sobre o inicio do namoro, ela desconversou e entre um breve sorriso, disse: ele ia ao terreno de meu pai e “pólvora perto de fogo, pega”. Não precisava dizer mais nada. Concordam?

Tereza Rosa dos santos é filha de Manoel Inácio dos santos e Maria Rosa dos Santos. Teve nove filhos. Hoje vive com o neto, um bisneto e, contíguo ao barraco dela, mora Maria Tereza, a única filha viva. Maria Tereza é arredia, não quis falar com a reportagem. Respeitamos. Ela está doente, sofrendo do vício do álcool. A situação miserável que vive esta mulher que é, sem dúvida, uma parte viva da história de Macapá, é a prova inconteste de que no Estado a tradição e os pioneiros são pouquíssimos respeitados. Este Anjo Negro, chamado Maria Tereza, deveria receber imediatamente uma ajuda do município de Macapá e do Estado.

D. Tereza e Zé Paulo Ramos,
o "caçador de histórias"
Tereza gosta mesmo é de falar do Marabaixo. Mostrou a reportagem uma relíquia que deve ir para o Museu do Estado ou do Município. Uma saia que ganhou do capitão Janary. Confessa que rodopiou muito com a vestimenta e diz que D. Zefa é a parceria de festa que ainda está viva. Ela se lembra dos bons tiradores de ladrão do marabaixo e cita Julião Ramos, Ladislao, Duca da Otília, João Clímaco, entre outros. Quando pedi para que ela cantasse pra gente, disse que não tinha mais ânimo. Porém, o papo foi ficando animado e eu ensaiei cantar Rosa Branca Açucena Lê Lê. Aí ela me ajudou a completar a música e, de forma espontânea, cantou um verso que João Clímaco, avô de D. Jô, mãe de Zé Paulo, cantava com muita desenvoltura, que dizia assim: “Quando eu vim pro Curiaú, eu passei pelo Curuça, pra cantar o sou eu em terra de Macapá.” Zé Paulo, bisneto do João Clímaco, emocionou-se e abraçou sua amiga e parenta. 

Tereza recebeu também a visita do ilustre desembargador Gilberto Pinheiro, filho de seu Manoel Pinheiro e D. Maria José da Casa Duas Estrelas no bairro da Favela. Ela reconheceu Gilberto e lembrou que lavou roupa durante 13 anos de sua vida para a família de Manoel Pinheiro. Foi mesmo um dia de festa para nossa reportagem, para Tereza e para os ilustres visitantes. Contador e professor Zé Paulo Ramos e o desembargador Gilberto de Paula Pinheiro, que ficaram até escurecer sentados no pátio do barraco de Tereza ouvindo as histórias e lembrando-se de pioneiros que já partiram para outro oriente.

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