Aqui vai um texto de caráter altamente confessional. Se você é um daqueles que não tolera a subjetividade num espaço jornalístico, vire a página agora, ignore, esqueça. Mas se, caso contrário, for um desses apaixonados pelos mistérios humanos, então fique, puxe uma cadeira, suspenda os pés e me ajude a entender as incoerências da maturidade...
Essa minha grande dúvida começou em meio a uma visita à livraria. Estava eu entre as esplendorosas estantes de volumes lustrosos e juvenis quando de repente me dei conta de que aqueles títulos meigos, tantas vezes clichês, e capas fosforescentes já não significavam nada para mim. E houve tempo em que tudo o que eu queria era me render aos dramas românticos de Nora Roberts e Danielle Steel, à efusão da literatura feminina ("chick-lit") e à gama vasta de best-sellers forçosamente sentimentais... (Não critico nenhum desses gêneros. Não é isso. Só estou assustada com o modo mordaz pelo qual meus olhos passaram a enxergá-los!).
Bem, a juventude é um período extenso e vagaroso, ao qual vamos vivenciando sem realmente nos dar conta de que ele está aqui, passando. Tudo acontece sem grandes anunciações. Você sabe que é jovem, entretanto mal percebe as gradações dessa fase, não discerne muito bem as mudanças e nuanças, as quais vão se tornando cada vez mais sutis, aglutinando-se tacitamente. Você simplesmente é jovem - e saber disso parece ser suficiente.
Todavia, o fenômeno é muito mais turbulento e profundo do que parece. Só nos damos conta disso quando uma revelação súbita vem bater à nossa porta bruscamente, estando nós numa livraria, na privada, contemplando a estrada, esperando o ônibus, ou tentando engolir embargos universitários, não sei.
A questão é a seguinte: Passado o ácido período hormonal da adolescência, a juventude prossegue sorrateiramente, como se nem estivesse ali. Ou melhor, como se fosse uma condição eterna, e nenhuma demanda mais coubesse ao jovem indivíduo. No entanto, quando você está bastante confortável em sua situação de eterno mancebo, a vida passa-lhe uma rasteira e grita ao pé do seu ouvido: "Ei! É agora! Cresça, cresça!".
Eu, contemplando volumes coloridos, moderninhos, percebi, de algum modo, que tinha maturado. A certeza do amadurecimento me abateu com o ciência de meus gostos literários habituais já não serem os mesmos. Fato simples? Não...
A coisa se torna complicada quando considerada inteiramente: Sua casca está deixando de ser verde, até o seu interior começa a maturar, mas você não sabe o que fazer em seguida. Eu, ali, na livraria, não queria mais as mesmas páginas de sempre. Entretanto, ao mesmo tempo, não sabia realmente o que queria, ainda desconheço esses meus novos quereres. Em meu ouvido, aquela voz: "Cresça! Cresça!". E eu: "Caramba, cresci!", mas sem saber precisamente o que é crescer, que escolhas fazer e como reagir.
De toda a juventude, talvez o episódio mais difícil seja essa tomada de consciência. A maturidade está aí, pronta para nos envolver e nos amolecer totalmente, e ainda assim nosso coração hesita, e nossa mente titubeia... Porque, na verdade, continuar a ser verde também é muito bom!
As responsabilidades são menores, e a maioria delas diz respeito só a você mesmo. Seu maior comprometimento? Com o cabelo. Seu relacionamento mais íntimo? Com o vídeo game. Noites sem dormir, rindo, brincando, comendo, conversando com os primos, com os amigos... Dias e tardes de diversão na escola, de matar aulas chatas, de furar a fila do lanche como se não houvesse amanhã...
Então, puf!, adeus escola, adeus misto-quente com Pitchula, adeus camaradagem com professores, adeus Meg Cabot, adeus noites insones de diversão... Aterrorizante!
Ao mesmo tempo... Essa vontade de crescer, de extrapolar a casca, de implodir, de suplantar, de ir além, de deixar velhos hábitos, literários ou não, de ser levado mais a sério, de não ser subestimado, ou pré-julgado.
Enfim, é sempre necessário abrir mão de algo, em qualquer escolha. Inevitavelmente, maturamos. E nossa vida sazonada perde um pouco o brilho e a firmeza de quando éramos verdejantes, molhados de muita vida e muita gana.
Mas também, quem sabe, esta nova fase amarelo-cor-de-rosa traga consigo outras surpresas. Não vai ser sempre uma aventura gostosa e confortável, nem sempre desafio cheio de diversão e possibilidades... Contudo, agora que expus essa queixa dorida, penso eu que, talvez, trocar Sidney Sheldon por Gabriel García Márquez será experiência válida.
E pode até ser possível conciliar múltiplos arroubos, múltiplas paixões, duas etapas diferentes da vida... Há quem vista a casca da maturidade e guarde em si todo o frescor da juventude... Essa é uma coisa boa a se manter em mente.
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