Bárbara Costa Ribeiro
Aquilo que faz o
melhor lugar do mundo
Dia desses,
vagueando pela internet, me deparo com a seguinte história: uma loja
australiana começou a cobrar 5 dólares (cerca de 10 reais) a todo cliente que
entrar no estabelecimento e não comprar nada. Os famosos "estou só
olhando". Lá na Austrália, um "showrooming"; aqui no Brasil,
"caroço" (gíria de vendedor).
A dona da loja
alega ter tomado a decisão porque já não podia arcar com o prejuízo de ver
todos os clientes em potencial entrarem, tomarem dicas com ela, pesquisarem
produtos e irem comprá-los em outras lojas ou supermercados, mesmo não
existindo diferença de preço em relação à sua empresa e as demais.
Sob a sombra desse
curioso caso, tenho de admitir que vida de vendedor e de proprietário é mesmo
de lascar. Aturam diariamente clientes mimados, indecisos, outros ainda
grosseiros, pechinchadores extremados, estressados... De fato, lidar com o
humano não é fácil. Sobretudo o humano com carteira. Mas, bem, minha simpatia
pela classe lojista termina aqui.
Pode soar brusco,
mas se trata de uma questão séria, pois minha lista de traumas desencadeados
por eles é longa... Já desenvolvi até um padrão de comportamento angustiante ao
me ver diante de atraentes vitrines, mas não conseguir entrar na loja por saber
que, ao fazê-lo, a mocinha escorada no balcão virá até mim e dirá as palavras:
"Tá procurando alguma coisa em especial?". E eu terei de dizer a triste
verdade: "Não, obrigada, tô só olhando". E a moça se emburrará. E
pensam que irá embora, resignada, liberada para atazanar um cliente mais
acessível? Não! A moça ainda está ali, grudada ao meu calcanhar, enquanto
dou uma olhadinha tímida e acuada às peças. Agora, imagina se a medida da
australiana vira costume e chega ao Brasil... Minha lista de traumas passaria a
ser compartilhada por muitos outros.
Entretanto, existe
um lugar... Um único lugar, um paraíso na Terra, ao qual batizei
"Pasárgada dos pobretões angustiados que estão 'só olhando'", onde os
caroços odiados pelos vendedores podem ser felizes. Adivinhe que lugar é esse.
Uma livraria, claro! Fico impressionada sempre que adentro qualquer uma
delas... Ali, o capitalismo habilmente vestido de cultura e conhecimento não
machuca. "Sessenta reais nessa edição de bolso incompleta? Opa, na
hora!". Ali, você não tenta pechinchar. Ali, sabe que não precisa. Entende
que, ao pagar uma fortuna por um livro, está fazendo feliz a um escritor que
fará você duas vezes mais feliz. Não há ônus.
E o mais
impressionante, o mais poético nesses estabelecimentos, ainda não é o preço
astronômico que você paga sorrindo, como se fosse de fato um valor irrisório;
não é o cheiro de papel novo, das capas ainda não amassadas, algumas ainda
cobertas pelo plástico; nem mesmo contemplar as estantes repletas de
conhecimento inestimável; ou ainda a satisfação condescendente de ver um
Machado de Assis e um José Saramago lindamente ajustados na prateleira entre um
Paulo Coelho e um Ricky Martin biográfico. Não, meus caros. O que há de mais
estupendo, de mais delicioso numa livraria, são os vendedores.
Diferentes dos
demais de sua classe, esses que trabalham com livros parecem ser donos de uma
generosidade e compreensão sem fim. Experimente entrar e caminhar até eles, com
sua cara de universitário esgrouviado, os olhos tristonhos, a escoliose
charmosa, a mochila num ombro só. Eles logo compreendem a sua condição de
falência estudantil. Pode entrar e ficar à vontade. Com eles, nada de
perguntas: "O que tá procurando?". Na verdade, sorriem e não mais se
dirigem a você até que os solicite. Não perseguem sua cauda, não se colam aos
calcanhares, não farejam o seu pescoço. E a melhor parte dessa melhor parte é
que os vendedores não se importam se você quiser ler os livros ali mesmo, de
graça e o quanto quiser!
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