Cidade de Belém entre o informal e o vertical
Tive a oportunidade de passar sete dias na cidade de Belém na semana passada, realizando uma série de atividades particulares. Nesta oportunidade, percebi como a chamada metrópole da Amazônia apresenta múltiplos problemas urbanos, morei em Belém no período de 1980 a até princípios de 1989, ocasião em que me mudei para Macapá, de lá para cá, sempre vou à Belém por curtos períodos no máximo de dois dias. Este período de sete dias na cidade de Belém serviu para relembrar uma série de coisas de épocas passadas. A paisagem de Belém vai ficando cada vez mais impregnada de edifícios cada vez mais altos.
Um dos locais mais adensados é a Doca de Sousa Franco, comportando prédios com 40 andares, é possível ver da cobertura de outro prédio no Umarizal, a "selva de Pedra" que se tornou esta região da cidade, nesta hora, cabe à merecida reflexão sobre a questão do Direito à cidade proposta por Lefebvre no começo dos anos 70 e de David Harvey e Castells sobre a apropriação produtiva do espaço urbano. O que será de nossas cidades? O capital enfatizado por Harvey é cada vez mais voraz, sem medir a racionalidade expressa no espaço urbano, tal situação, evidencia como o poder público tem sido serviente quando trata-se da qualidade do espaço urbano.
Belém, é apenas um exemplo categórico que nossas cidades estão "doentes", é perfeitamente possível compreender esta sistemática, um país como o Brasil investiu de forma maciça em décadas somente na indústria automobilística, por força dos interesses dos grandes empresários, se vê diante da imensa necessidade de repensar a cidade do futuro. Na cidade de Belém, chega ser impressionante que mais de 50 linhas de transportes coletivos possam passar em um único ponto, o Ver-o-Peso, outro fator que mostra com propriedade as carências no setor formal, é a indústria da informalização, verifica-se que este fato não é visto somente em áreas centrais como em um passado recente, é comum na paisagem da cidade do centro a periferia, a força deste mercado.
Apesar dos esforços dos últimos anos do próprio governo federal através das políticas e programas para as diversas áreas, não tem sido suficiente para atender as demandas sempre crescentes e elevadas. O espaço urbano está no limite! Belém paga o preço de ser a "porta da Amazônia", existe de tudo em Belém, a cidade está à beira da agonia, também neste período como nos velhos tempos, realizei vários trajetos de ônibus para a Universidade Federal do Pará e para visitar parentes que moram na cidade Nova VIII no município de Ananindeua.
No trajeto para Cidade Nova o tempo de percurso foi de 1 hora e 30 minutos e para a UFPA cerca de 40 minutos, no interior dos coletivos ocorre de tudo, o espaço urbano informal, migrou para o espaço em trânsito, é o comércio das ilusões, das transgressões, e de todos aqueles que de alguma maneira se acham injustiçados, tornou-se algo comum e corriqueiro, os passageiros darem o que não tem sob o olhar a ameaça disfarçada do arrependimento.
Nesta mesma semana, o prefeito anterior de Belém, havia sido condenado pelo mau uso e impropriedade na aplicação dos recursos públicos, prática que virou corriqueira em todo o Brasil. Belém contrastá-se entre a "selva de pedra" com múltiplos edifícios e o cenário empobrecido da paisagem urbana. A imagem da cidade denuncia as fragilidades das políticas urbanas. O centro da cidade, a Praça da República onde fica o portentoso Teatro da Paz é quase impossível caminhar na parte noturna em função dos problemas de segurança.
E a Cidade Velha? Vai perdendo muito rapidamente o caráter da chamada cidade antiga, acelera-se cada vez mais as mudanças e transformações sem perceber a importância do passado, a cidade vai eliminando vestígios da arquitetura de outrora. Como diz o norte americano Mike Davis, vive-se sobre a síndrome dos grandes problemas urbanos, pela perda da qualidade de vida urbana e pelo empobrecimento das ideias para lidar com a dinâmica sobre o espaço.
Nesta jornada, porém, nem tudo pode ser visto como algo negativo como uma antiga fotografia, apesar das inúmeras viagens, sempre curtas, visitei pela primeira vez o Mangal das Garças, local agradável e alternativo, de perceber a nova orla de Belém, e de ter uma visão privilegiada, é um lugar para ser bem cuidado e preservado. Após anos sem ter notiícias encontrei nesta viagem, o meu primeiro cliente como arquiteto, foi uma imensa satisfação em revê-lo, não é algo que ocorre todos os dias e para oportunizar os laços com a nossa própria história na Universidade Federal do Pará encontrei Ronaldo Carvalho, professor do Curso de Arquitetura e Urbanismo, relembramos passagens históricas ocorridas no curso de arquitetura.
Fui convidado pela professora Cybelle do Curso de Mestrado em Arquitetura e Urbanismo para ministrar uma palestra, o título: do projeto português inconcluso ao moderno inacabado na cidade de Macapá. Nesta palestra, relatei aos mestrandos um pouco da experiência adquirida ao longo da vida profissional e o alcance em diversos níveis de desenvolvimento na cooperação local, regional, nacional e internacional. E quanto a estadia em Belém, fica o aprendizado para a nossa cidade de Macapá.
O Amapá pertenceu ao Pará, sempre teve vínculos sociais, culturais, políticos e econômicos intensos, devemos mirar aquilo que não queremos copiar, definitivamente não cabe pensar para Macapá, prédios de 40 andares, de permitir que por falta de investimentos, o mercado informal tome conta dos espaços públicos, e acima de tudo, devemos refletir: que concepção de cidade queremos para o futuro?
Recentemente foi realizado na cidade de Macapá o SOS Cidades, porém, percebo que os principais setores que deveriam absorver os resultados deste evento como algo promissor para o desenvolvimento do lugar não ficaram suficientemente entusiasmados com esta experiência. Por isso, vislumbra-se as lições de todas as viagens que realizamos como algo importante para um aprendizado permanente. Belém evidencia assim, efeitos de uma cidade que está no limite entre o informal e o vertical.
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