Eu tenho um caderninho preto, de capa dura e folhas brancas, no qual anoto alguns pensamentos desarticulados, delírios literários, desastres cômicos do cotidiano e reflexões não professáveis - seja por seu caráter extremamente bobo ou melancólico.
Há alguns dias, escrevi nesse caderno algumas inquietações que me chegaram acerca da morte. Hoje, tive vontade de compartilhar o que escrevi ali. Muita pessoalidade para uma página jornalística? Pode ser que sim (mas já faço isso tanto...). E enxergo vocês, seres mais ou menos invisíveis que me leem com alguns dias de atraso em relação ao tempo em que escrevo e com muita generosidade, como amigos com os quais vale a pena compartilhar o mais íntimo. Sombrio falar sobre morte, é claro, mas a morte é uma espécie de mistério, e todo mistério é digno de investigação. O texto que escrevi no caderno começava assim: "A morte é uma coisa tão estranha...".
Sim, é estranho o deixar de existir, o estar suspenso no vazio, cair no vácuo, não ter mais consciência de si. Num instante se está, e no outro, não se está mais. E não importa - porque você não sabe que já não mais é. Você simplesmente deixou de ser, porque os pulmões esvaziaram-se, o coração brecou, o cérebro cansou de vez, pifou. Mas algo mais se perdeu. E o que é? Que essência é essa que partiu? Acredito que a alma. Acredito que seja o momento em que Deus toma a alma e a faz dormir sem sonhos, à espera do fim final.
E, antes disso, do não mais ser, você ali, sendo. Sem imaginar. Quem não sabe que vai morrer? Todo mundo sabe (talvez não as crianças pequenas, mas a elas isso não importa tanto, porque a morte não lhes apavora, e nem mesmo deveria). E, mesmo assim, a gente não pensa no momento em que o fim nos chegará.
Vai-se vivendo os dias, planejando os planos, sonhando os sonhos, irritando-se com o trivial, deixando passar o imediato, sem perceber que a sua hora está ali, à espreita.
A morte, ao longo da vida, quase sempre nos é uma noção agônica, mas vaga, quando na verdade deveria ser doce, mas precisa, nunca ignorada. Ao mesmo tempo, não sei... Pensar agora na morte é sofrer por antecedência uma dor que, depois da vida, não se sentirá, já que se está morto. Profundo e lancinante mistério. O não saber, para alguns, o que será da alma. E saber exatamente o que será do corpo - adubo. E de pensar que essa casca abrigou tantos pensamentos, tantas raivas, tantas disputas, tantas sensações, tantos não-ditos!... Agora, vazia. O pânico do instante da morte está nesse profundo silêncio, a certeza de que não haverá um instante posterior para se relatar como foi a experiência.
Mas, saibam (e aqui tudo fica ainda mais íntimo): o que mais castiga meu coração é pensar nas pessoas - que amo, e até nas que não amo, ou sou indiferente, ou não conheço, enfim, toda uma grande parcela da humanidade - que terão um destino ainda mais triste e doloroso depois desse grande vazio que abrigará todos nós. Porque professo uma fé - cristã, evangélica, protestante, como queiram chamar - que crê na seguinte certeza: aqueles que morreram crendo em Jesus serão salvos. Às vezes, não precisa muito. Um último pensamento, um último reconhecimento, um mísero "sim, Ele existe" já vale. Essas pessoas terão um bom fim, depois do vazio da espera. Mas, e os que não acreditam?
Sei que existem muitas crenças, muitos credos, muitos não-credos. Contudo, o meu credo é sofrer aqui neste mundo por pensar naqueles que não creem. É tudo tão complicado e exaustivo e argumentativo e belicoso... Entretanto, algumas vezes, tudo o que eu queria dizer a todas as pessoas com as quais convivo e com as que cruzo na rua é: "Jesus te ama muito, não morra sem antes dedicar pelo menos um pensamento a Ele". Tudo, tudo o que eu queria dizer, num momento, se resume nisto: "Sua vida é tão preciosa... A única coisa que pode destruí-la é o seu coração de gelo morno". A teimosia é morna. O ego no centro também.
Pensar na morte me entristece e me cansa por saber de todas essas pessoas que morrerão sem paz, segundo creio. Por isso, peço a Deus que Ele não me deixe conhecer qualquer pessoa sem pelo menos, em algum nível, tocá-la, e que esse toque seja o suficiente para que ela queira conhecer o que me move, que é meu Salvador-Senhor-amigo.
Bem, se você mesmo não acredita, mas até aqui ficou, não ria, apenas leia: o vazio e vácuo da morte são perturbadores, sim, e muito, mas existe uma dor pior ainda que é a da incerteza de não se saber para onde se vai depois desse curto tempo de nada em que se está dormindo sem sonhos, à espera do destino final... Tudo o que eu quero é te encontrar, depois do vazio, na paz, o Paraíso. Para isso, tudo o que eu peço é: não morra sem antes pensar, e que seja agora, no seu destino, no que você quer para depois do sono. Escolha bem. Basta um pensamento. Uma confissão baixinha, tímida, sem grande plateia...
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