sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Mais professores!
 A mãe vê a filha caçula de 8 anos sentada em um canto. Ensimesmada, olhar distante, parece pensar profundamente em algo importante. Preocupada, a mãe pergunta: - Algum problema, minha filha? Juliana, voltando a si, corre em direção à mãe e lhe diz toda contente: - Já sei o que quero ser quando crescer! Feliz com o alvoroço da filha, a mãe a recebe em um terno abraço e pergunta: - E o que você vai ser, menina? Ao que Juliana responde de pronto: - Professora! Antes que a mãe dissesse algo, o filho mais velho, finalizando o ensino médio e tentando decidir qual curso prestar no vestibular, grita da sala ao lado: - Essa aí tá doida, mãe! E cai na gargalhada.
O Ministro da Educação, Aloízio Mercadante, empolgado com a repercussão e esquecendo os problemas e críticas apontados no programa “mais médicos”, decidiu implantar o programa “mais professores”. A política em princípio é a mesma, levar profissionais para locais onde há carências como os rincões interioranos e as periferias. Mais especificamente, os alvos seriam os municípios com baixos valores no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) ou no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB). O primeiro índice tem vínculo com a qualidade de vida da população de uma localidade, o segundo com o fluxo (relação idade/série) e o desempenho dos estudantes.
Na tentativa de minimizar as críticas e os impactos negativos da proposta governamental, o ministro apresentou o programa como um compromisso em fase de desenvolvimento e aberto às sugestões. Entretanto, os problemas apontados para o “mais médicos” se perpetuam no “mais professores”. Os governantes, intencionalmente, desconsideram que a crise é sistêmica e não se resume a presença ou ausência de profissionais, mas se relaciona com a política empregada na área da educação, a ínfima remuneração paga aos profissionais, os problemas de infraestrutura, a ausência de outros profissionais especializados, a política econômica empregada e a discrepância de condição social existente no país, entre tantas outras coisas. Há, portanto, todo um contexto mantido sob o tapete para escapar aos olhos.
O piso salarial dos docentes, cujo valor alcança ínfimos R$ 1.567,00, não é pago em vários estados e municípios. Os governantes buscam variadas estratégias, bem como recursos jurídicos diversos, para se esquivar de desembolsar este montante. Enquanto isso, enfrentam falta de professores em sala de aula, reclamações de alunos e pais, bem como descontentamento e manifestações por parte dos docentes. O Conselho Nacional de Educação afirma haver uma carência de cerca de 300 mil professores em todo o país, principalmente em disciplinas como matemática, física e química. Mas com a pífia remuneração paga à docência, os poucos profissionais que se formam nestas áreas optam por outras profissões. Avançam para locais em que possam ser melhor remunerados na iniciativa privada ou investem algum esforço para ingressar por concurso público em outra função. É evidente que, enquanto salários irrisórios forem pagos aos trabalhadores da educação, a fuga dos licenciados para outras profissões permanecerá uma constante.
O salário dos profissionais da educação não é a única questão, mas, se não for levado em conta, alguns elementos que poderiam ter alguma relevância no programa “mais professores” serão implodidos no nascedouro. Não adianta distribuir kits de ciências para todos os alunos e ofertar bolsas de estudo para aqueles que ingressarem na área de exatas se estes, ao se formar, desconsiderarem a docência como profissão em razão da desvalorização profissional decorrente da irrisória remuneração. Além disso, investimento em material didático, formação docente e escolas de turno integral estão entre as reivindicações dos trabalhadores da educação, mas demandam recursos e o ministro já disse que a implantação dependerá de orçamento disponível. Como não há previsão de ampliação dos recursos destinados à educação, isso significa que embora essas ideias possam ser profícuas, elas permanecerão no papel.
Atentar para as questões contextuais revela a necessidade de um aumento substancial de investimento na educação, por exemplo, dobrar o valor e alcançar de imediato 10% do Produto Interno Bruto (PIB). Entretanto, aumentar em mais de 5% do PIB os recursos atualmente investidos na educação significa disponibilizar menos valores para a ciranda financeira e isso é algo que este governo rejeita arduamente. O Brasil segue com o discurso de país do futuro, mas se insistir em não investir séria e pesadamente em educação e no salário dos professores, os anos vindouros não serão dos melhores. Enquanto cada Juliana for desencorajada porque o trabalho de professor é desvalorizado, carente de infraestrutura, exaustivo e mal remunerado, os nossos problemas se arrastarão indefinidamente, comprometendo nosso decantado futuro. Docência não é vocação ou voto de pobreza, é uma profissão e, como tal, merece ser remunerada de forma digna. Enquanto isso não for compreendido e defendido como política de Estado, propostas como o “mais educação” serão apenas paliativos que virão para não resolver nada.


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