“Auxílio-moradia do MPE-AP é uma excrescência”,
afirma juiz João Bosco
Régis Sanches
O juiz da 2ª
Vara Federal João Bosco Soares classificou de ‘excrescência’ a forma como se
deu o pagamento generalizado de quase R$ 10 milhões de auxílio-moradia aos 106
promotores e procuradores de Justiça do Estado do Amapá.
“O pagamento do
auxílio-moradia para servidores públicos quem têm casa própria é uma
excrecência. Estou chocado com a crise ética, o apagão de gestão e o déficit
moral em que mergulhou nosso país”, desabafou.
O magistrado
considerou correta a iniciativa do procurador-geral da República Rodrigo Janot,
que mandou investigar os Ministérios Públicos estaduais e Tribunais de Justiça
de todo o país sobre os gastos com auxílio-moradia para promotores de justiça,
procuradores, juízes e desembargadores. O objetivo de Janot é identificar abuso
na concessão do benefício.
“Certamente, a
PGR irá propor uma ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) para que sejam
extintas as leis que permitiram o pagamento excessivo do auxílio-moradia. Assim,
espero que os valores pagos indevidamente sejam devolvidos”, enfatizou.
Excrescência ‘condigna’
O Censo 2010 do
IBGE revelou que Macapá tem um déficit habitacional de 25 mil moradias. Para a
Secretaria Nacional da Habitação são 26.333 as famílias pobres e miseráveis que
não têm um teto para abrigar-se do sol, da chuva e do sereno, na capital.
Longe do
relento, embora possuam residência própria – mais de uma, na maioria dos casos
-, os 106 promotores e procuradores de Justiça do Amapá recebem, cada, R$
7.235,00 mensais de auxílio moradia. Relatório de Auditoria do Tribunal de
Contas do Estado do Amapá (TCE-AP), mostra que em 2011, na gestão de Ivana
Lúcia Franco Cei, o MP-AP gastou R$ 9,2 milhões com auxílio-moradia de seus 106
membros. O valor equivale a quase 7% do orçamento da instituição para 2014, que
é de R$ 138 milhões.
A justificativa
para tal excrescência está impressa na Lei Orgânica Nacional e Estadual do
Ministério Público: “...nas comarcas que não haja residência oficial ‘condigna’ para o membro do Ministério Público”,
os mesmos serão indenizados mensalmente pelo órgão com o auxílio-moradia.
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MP-AP omitiu valores à PGR
O Ministério
Público do Amapá informou à Procuradoria-Geral da República (PGR) que
desembolsa R$ 4.377,00 por mês para os 106 promotores e procuradores de
Justiça. Mas, o relatório do TCE-AP confirma que, na verdade, o MP-AP paga R$
7.235,00 de auxílio-moradia para cada um deles, ainda que eles tenham casa
própria e morem em Macapá. Resumo da ópera: o MP mandou a conta errada para a
PGR, camuflando R$ 2.858,00 que paga a mais do que informou.
Para se ter uma
noção desse absurdo, apenas nove das 27 unidades da Federação pagam
auxílio-moradia aos membros do Ministério Público. Os promotores e procuradores
de Justiça do Amapá estão entre os que recebem o maior benefício, junto com os
de Santa Catarina (R$ 4.377,00) e do Distrito Federal (R$ 5.303,00).
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TAC milionário e polêmico
Damaris Rossi Baggio de Alencar, procuradora da República |
Promotor Afonso Guimarães |
IVANA CEI, PROCURADORA-GERAL DE JUSTIÇA |
O juiz federal
João Bosco Soares voltou a criticar a forma ‘nebulosa’ como foi elaborado e assinado
o TAC (Termo de Ajustamento de Conduta Ambiental) milionário (R$ 6 milhões) entre
a mineradora MMX, posteriormente Anglo Ferrous, hoje Zamin, e os ministérios públicos
Federal e Estadual do Amapá, em 2007.
Em outubro
passado, a Justiça Federal havia mantido a decisão do juiz João Bosco que, em
2008, não homologou o TAC com a MMX por considera-lo lesivo ao interesse
público. A decisão torna ilegal a utilização de R$ 6 milhões.
A decisão do
desembargador federal, João Batista Moreira, do Tribunal Federal da 1ª Região,
complicou ainda mais a situação dos procuradores da República e dos promotores
do MPE-AP. Eles pediam a homologação e, consequente execução do ‘TAC
Milionário, que implicou no gasto de R$ 6 milhões, com o dinheiro passando em
contas pessoais com aquisição de bens e serviços que até hoje tem prestação de
contas duvidosas.
Sem a
homologação, isto é, a autorização para o uso dos recursos, os procuradores e
promotores não poderiam ter feito gastos já que a questão estava judicializada
e, portanto, era imprescindível a homologação judicial, conforme entendimento
do Superior Tribunal de Justiça (STF). A corte determina que se uma questão
está “sub judice”, o acordo entre as partes deve ser referendado pelo
Judiciário. A decisão do TRF complica a situação dos agentes do MP, que devem
responder pelo crime de peculato (desvio do dinheiro público) em uma Ação
Popular movida pelo próprio juiz João Bosco Soares, no intuito de
responsabilizar os agentes públicos.
No entendimento
do magistrado, o TAC contrariava interesses públicos e, sobretudo, por possuir
cláusula contrária ao que determina a Lei de Ação Civil Pública, que
convenciona depositar o dinheiro do acordo em um fundo gestor e,
diferentemente, o TAC convencionava deixar na conta da empresa privada MMX.
Entenda o caso
Em 9 de março
de 2012, João Bosco Soares formalizou denúncias graves de corrupção contra a
procuradora-geral de Justiça Ivana Lúcia Franco Cei e um grupo de promotores e
procuradores da República suspeitos de utilizar o recurso de arbitragem do TAC
para enriquecimento ilícito. O TAC é um mecanismo criado para obrigar cidadãos
e empresas a reparar eventuais danos causados ao ambiente ou ao patrimônio
público.
No início de
julho passado, quatro bandidos invadiram a casa do juiz. Soares foi amarrado,
ameaçado com uma arma na cabeça e espancado na frente da mulher e de dois
filhos pequenos. Para a Polícia Civil, tratou-se de um assalto. A Polícia
Federal, que também entrou no caso, ainda não se pronunciou oficialmente sobre
se houve ou não motivação política no ataque.
Soares meteu a
mão num vespeiro ao encaminhar uma representação contra Ivana Cei, dois
promotores e cinco procuradores federais da República ao Conselho Nacional do
Ministério Público, em Brasília, com base nas ligações do grupo com o
conglomerado de Eike Batista, ex-dono da MMX Mineradora Amapá. Entre 2007 e
2012, afirma o magistrado, a MMX e, posteriormente, a britânica Anglo Ferrous
pagaram R$ 140 milhões à Etecon, empreiteira de propriedade de Glauco Cei,
marido da procuradora. Essa transferência milionária tornou-se legal graças a
um dos TACs assinados por Ivana Cei quando chefiava a Promotoria de Meio
Ambiente do Amapá, em 2007.
Além de Ivana
Cei, outros dois promotores estaduais envolvidos no esquema dos TACs, Afonso
Guimarães e Ricardo Gomes, são alvos de representação no CNMP. De acordo com o
juiz, o trio estava à frente do grupo que aproveitava da existência de Ações
Civis Públicas contra empresas de mineração para forçar a assinatura dos termos
de ajustamento, um de R$ 2 milhões, assinado apenas pelo MP estadual, e outro
de R$ 6 milhões, em parceria com o Ministério Público Federal.
A MMX era alvo
de uma Ação Civil Pública por crimes ambientais e usufruto irregular de lavras
de ouro e ferro, cedidas à mineradora sem licenças. A mineradora atuava na
região de Serra do Navio desde 2.000, quando acabou processada por promover
desmatamentos da Floresta Amazônica, destruição de sítios arqueológicos e
despejo de rejeitos poluentes em diversos igarapés da região.
Em 21 de
dezembro de 2007, graças ao acordo de R$ 6 milhões assinado três meses antes
com os Ministérios Públicos Federal e Estadual, o empresário regularizou a
situação da MMX a tempo de vendê-la à Anglo Ferrous Amapá por R$ 5,5 bilhões. O
grupo inglês assumiu os compromissos da MMX e foi além: contratou para o cargo
de diretor de ‘relações institucionais’ da empresa Bruno Cei, cunhado da
procuradora-geral de Justiça. Uma de suas funções, cuidar dos contratos da
Etecon do irmão Glauco.
Os R$ 6 milhões
foram destinado, em tese, a obras e serviços de compensação ambiental, mas
desde o início se tornou uma operação suspeita. Sem nenhuma norma
preestabelecida e frontalmente contra a lei, parte do dinheiro começou a
circular em contas privadas de promotores e procuradores. Soares detectou um
depósito de R$ 179 mil em uma conta do Banco do Brasil. O dinheiro foi parar lá
graças a uma autorização de Damaris Rossi Baggio de Alencar, procuradora da
República também representada pelo juiz
A
Justiça Federal constatou que Damaris repassou R$ 1,094 a contas bancárias
definidas pelo próprio MP Federal, mas só conseguiu comprovar a movimentação de
R$ 947,1. Ou seja, R$ 146 ficaram sem nenhuma comprovação de despesas.
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