BARBARA COSTA
Tragicomédia
do segundo turno
No
segundo turno das eleições brasileiras, testemunhamos o que parece ser a perda
total das poucas ideologias intactas que ainda nos sobravam. Fica a
impressão de que todos os ideais políticos se reduzem à odiosa dicotomia do
desempate arbitrário.
Mesmo que
o eleitor não se identifique com nenhum dos candidatos que restaram para serem
votados, é obrigado a escolher um deles, pelo raciocínio da exclusão: dos
males, o pior; antes aquele nome que pareça apresentar menos risco ao futuro da
nação do que "deixar" o "vilão" verdadeiro ganhar.
E aí vem
o torturante movimento, a tragicômica batalha: pessoas que antes abraçavam
propostas e campanhas tão divergentes passam a vender suas convicções pela
noção de sairem menos prejudicadas, defendendo agora no segundo turno um ou
outro lado que na verdade nem representam a essência do que o sujeito
acreditava primeiramente.
Mas
talvez o maior prejuízo nesse contexto não venha das brigas que surgem entre as
facções resignadas, as quais outrora defendiam outros argumentos em árduos
debates, e sim seja exatamente a defesa resiliente de uma política que não nos
representa por medo da abstenção.
Esse tipo
de democracia que pregamos é uma ilusão, já que você se vê forçado a votar por
temor de um estigma, uma vez que o voto branco ou nulo é marginalizado, mal
visto na sociedade brasileira, como uma espécie de manobra suicida ou
ignorância, burrice política.
Parece
que, assim, anulando o voto, tudo o que você faz é se omitir e mais nada, e, de
acordo com essa lógica, estaria ajudando a desconstruir um perfeito regime
democrático.
Mas que democracia é esta que não encara com olhos neutros a própria escolha do não-voto?! Deveríamos compreender que autonomia política é escolher também não votar em ninguém, se as ideologias postas à mesa não se afinam às que você acredita serem melhores para a sua comunidade.
Mas que democracia é esta que não encara com olhos neutros a própria escolha do não-voto?! Deveríamos compreender que autonomia política é escolher também não votar em ninguém, se as ideologias postas à mesa não se afinam às que você acredita serem melhores para a sua comunidade.
Quem acha
que o ato de votar encerra todo o papel de direito e dever de um cidadão está
enganado. A política vai além dos anos de eleição, de um mês e um ou dois dias,
vai além do digitar em urna eletrônica. Fazemos política com o engajamento de
consciências, e esse engajamento pode se manifestar também na não rendição às
únicas opções existentes. Entender isto seria menos exaustivo e muito mais saudável
do que empreender enfadonhos debates de segundo turno na tentativa de promover
o menor dos males, e acabar assim pisando nos legítimos ideais primeiros.
A
atividade política está sim em constante movimento e renovação, e as alianças
entre partidos e candidatos são algumas vezes justificáveis, mas se alguém não
as reconhecer, e as recusar, não há motivos para marginalizar tal criatura.
Isto é também consciência política.
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