quarta-feira, 29 de abril de 2015

ANTENADOS



TODOS NUMA SÓ IGNORÂNCIA

A árida falta de ideias e a incontornável obrigação de escrever me deixaram acordada até 2:20 de uma quinta-feira, dia final de entrega deste artigo, já extrapolado mesmo o prazo oficial, que é terça.

Volta e meia falo exatamente sobre a dificuldade de encontrar ideias, pautas interessantes, assuntos que estejam em voga, sejam pertinentes e, ao mesmo tempo, despertem prazer e afinco na hora de escrever. Produzir para um jornal é mesmo um desafio. Extremamente recompensador, quando você encontra o assunto e o tom certos. Mas também extremamente frustrante, quando não sabe muito bem o que está fazendo e por isso mesmo não deveria se propor a conduzir outras pessoas, leitores, rumo ao mesmo caminho de obliteração e desconhecimento.

Movida então por essa pesada consciência de que não posso transformar minha escrita jornalística no estojo depositário de meus interesses pessoais, decidi que, esta semana, para variar, não rabiscaria sobre temas como Literatura, poesia, escrita. Lancei-me então à Internet e fui à caça de pautas variadas das de sempre.

Tive de recorrer a mil sites de atualidades, numa enxurrada de informações que não poderia, nem mesmo se eu me esforçasse muito, ser absorvida em uma única madrugada. Mas fiquei muito grata por esse tanto de coisa existir na rede, à minha espera, mesmo que tardia, porque um dos maiores problemas que enfrento quando escrevo ou quando tenho de me posicionar em certas discussões é, de fato, a alienação.

Você pode estar se perguntando como é que uma jovem universitária se permite a audácia de ser alienada, e o que é que esta geração, outros como eu, farão por este condenado país assumindo uma postura como essa.

Acontece que há muitas formas mesmo de se alienar, de se omitir, ainda que você seja um estudante, um professor, um jurista... E seja por esforço, por preguiça de se envolver ou por deixar-se estar. Eu mesma cuido de meus negócios e vivo uma vida em que raríssimas vezes ligo a televisão, assisto a noticiários, visito sites de jornais, por exemplo, embora esteja sempre lendo sobre coisas de exclusivo interesse meu.

Então, nessa busca da madrugada por assuntos interessantes, deparei-me com um mundo de coisas ainda por mim inexplorado, problemas que conheci só na superfície.

Conflitos na Síria, na Nigéria, o relembrar do genocídio armênio, as estripulias ousadas do Papa, a reaproximação de Cuba e Estados Unidos, grupos religiosos extremistas, terroristas, as ciladas da gestão PT, o prejuízo gigantesco da Petrobrás, meninas sendo capturadas, estupradas e violentadas de todas as formas pelo grupo Boko Haram, a intensa falta de água já prevista para 2050 no mundo todo, a terceirização de setores no Brasil, a sexualização violenta de meninas através da promoção leviana da cultura funkeira, uma infinidade de coisas, o dar-se conta de que existe um mundo muito maior e mais problemático para além dos limites estreitos da nossa visão imediata.

Depois de navegar sobre todos esses assuntos, lendo com considerável voracidade e exasperação, comecei a me dar conta de que, na verdade, a alienação não é um mal só meu e de uns poucos companheiros de combate. Na verdade, todos nós estamos ignorando tudo o que acontece lá fora, tudo o que acontece aqui dentro.

Numa tentativa, sim, talvez, de preservar a própria sanidade, de não enlouquecer. Mas o que é que estamos deixando de debater, de discutir, nesse nosso ingênuo desconhecimento de tudo, e que deveríamos estar debatendo, urgente, agora?
Mesmo aqueles que se orgulham de não perder um só noticiário na TV e acompanhar todas as polêmicas de Facebook, mesmo estes estão vivendo com uma falsa noção de consciência. Verdade é que estamos todos amortecidos, e as informações que nos chegam, a todos, são filtradas. É preciso cavar, cavar, cavar, para se chegar ao cerne da questão, e conhecer dois ou mais lados de um mesmo problema.


E ainda assim não damos conta dele, nunca daremos. A pergunta que fica, portanto, é: até que ponto a alienação salva, até que ponto a alienação mata?

E mesmo quando buscamos conhecer os problemas do mundo através de mil sites na internet, páginas e páginas de jornais, seja como for, o cadáver já esfriou. E o que nos chega é a sombra pálida e amortecida, em linguagem jornalística e opaca, de problemas que, ainda que nos toquem, são esquecidos no apagar das luzes, ao deitar a cabeça no travesseiro, de madrugada.

O que fazer? É preciso encontrar novas formas de contar, novas formas de saber? Onde se esconde a verdade de todas as coisas? E o que se faz com ela, se um dia encontrada?

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