Universidades federais, PL 4330 e
ADIN 1923
O Projeto de Lei
(PL) 4330/2004 que estabelece uma terceirização trabalhista absolutamente desregrada
e alcançando as atividades meio e fim das organizações tem estado sob os
olhares da sociedade. Os receios sobre o PL repousam no fato de que, uma vez
aprovado, significará uma minirreforma trabalhista com ampla perda de direitos
dos trabalhadores brasileiros e precarização do trabalho. Enquanto
comemorava-se a retirada do serviço público do alcance do PL 4330 no congresso,
o Supremo Tribunal Federal (STF) votou a Ação Direta de Inconstitucionalidade
(ADIN) 1923/1998, após 17 anos (isso mesmo, 17 anos!), aprovando-a
parcialmente. Dessa forma, o STF decidiu
pela validade da prestação de serviços públicos de ensino, pesquisa científica,
desenvolvimento tecnológico, proteção e preservação ao meio ambiente, cultura e
saúde por meio de Organizações Sociais (OS).
Claudia
March, Secretária Geral do ANDES-SN, uma das entidades signatárias da ADIN
1923, pondera sobre a aprovação pelo STF neste momento: "Na mesma
semana em que o Congresso está discutindo a flexibilização dos direitos dos
trabalhadores do setor público e privado e em que conseguimos retirar do PL
4330 a possibilidade da terceirização da atividade-fim na administração
pública, uma alternativa se constrói para consolidar isso. O STF viabiliza a
constitucionalidade de uma Lei que estava sendo questionada desde 1998. Isso
não é por acaso". De fato, não é por acaso. Sem recorrer a teorias
conspiratórias, mas apenas aos interesses de acumulação de capital, é possível
entender os movimentos que têm sido realizados no Brasil rumo à redução do
Estado Brasileiro. Mas essa análise ficará para outro momento.
A decisão do STF dá continuidade à
contrarreforma do Estado, além de respaldar e oferecer contornos de
legitimidade jurídica aos ataques desferidos contra aqueles que lutam contra a
precarização das condições de trabalho e em defesa dos serviços públicos de
qualidade. As OS são apresentadas pelos defensores da visão liberal como
mecanismos que assegurarão a eficácia e a eficiência na prestação de serviços
em substituição aos organismos estatais, divulgados como onerosos e
burocráticos. Contudo, diversos estudos têm mostrado que o uso de OS piora o
atendimento ao cidadão, torna mais cara a prestação de serviço para o ente
público, aprofunda a precarização do trabalho e é uma janela aberta à
corrupção, superfaturamento e desvio de verbas.
As
regras estabelecidas para o funcionamento do serviço público engessam sua
atuação e dificultam o atendimento do interesse da população. Para contornar
esses problemas, em vez de estabelecer regras mais claras e simples que
facilitem a atuação dos órgãos públicos, estes são desmontados e privatizados
ou substituídos por OS. Ludimar Rafain, advogado do Sindicato dos Trabalhadores
da Saúde do Paraná, afirmou que: "Órgãos públicos foram extintos para
criar as OS, sem realização de concurso público ou licitação. Essas entidades
receberam estrutura pública, servidores públicos, informações privilegiadas e
prestam serviço para todo o país. Grande parte delas é objeto de investigação
do Ministério Público e dos Tribunais de Conta".
A
forma como as OS são criadas representa uma burla às regras impostas ao serviço
público pela legislação brasileira e segue na contramão dos princípios de
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência previstos no
artigo 37 da constituição federal. Além disso, as OS afetam, direta ou
indiretamente, os concursos públicos e os cargos, empregos, funções e
remuneração dos servidores públicos. No
caso específico das universidades, por exemplo, a partir do posicionamento do
supremo, não será mais necessário incluir o serviço público no PL 4330 para,
entre outras coisas, contratar professores e pesquisadores por meio de OS.
A deliberação do STF
atende os interesses do governo federal e significa, na prática, um processo de
terceirização nas universidades federais. Os professores poderão ser
contratados pela CLT, não mais pelo RJU, que não prevê o regime de Dedicação
Exclusiva, sem a necessidade de concurso público e a partir da gerência da OS
que pode passar por cima da autonomia universitária. A terceirização que já
havia chegado aos serviços de limpeza, segurança e setores administrativos,
agora está livre para alcançar a sala de aula das universidades federais. Esta
é a pá de cal que faltava no processo de desmonte do sistema federal de ensino
superior. Ou a sociedade se levanta agora contra a destruição desse patrimônio
brasileiro ou poderá ser tarde demais!
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