Carta de Macapá
Um
‘grito’ das populações amazônidas ao Palácio do Planalto
Mirrelle
Rabelo e Maiara Pires
Oito chefes de estado
da Amazônia Legal estão pedindo mais responsabilidade do Governo Federal na
região. Eles chamam a atenção, especialmente, para o guarnecimento das áreas de
fronteira para fiscalizar e controlar a entrada de drogas e armas no País.
Estas e outras reivindicações foram reunidas num documento intitulado Carta de
Macapá e serão encaminhadas ao Palácio do Planalto depois de dois dias de
discussões no 13º Fórum de Governadores da Amazônia Legal, sediado pela segunda
vez em Macapá (AP), nos dias 26 e 27 de janeiro de 2017.
“A Amazônia Legal
representa 62% do território brasileiro. Esta área faz fronteira com grandes
produtores de drogas, acarretando para a região as mazelas sociais, traduzidas
na violência urbana, nas escolas e no sistema prisional que, atualmente,
protagoniza um cenário caótico para a população e acarreta um enorme prejuízo
aos estados que a compõem”, diz um trecho do documento.
Estiveram presentes
na capital amapaense, os governadores Simão Jatene (Pará), José Melo
(Amazonas), Flávio Dino (Maranhão), Tião Viana (Acre), Marcelo Miranda
(Tocantins), Confúcio Moura (Rondônia) e Suely Campos (Roraima). Aguardado para
o evento, o governador de Mato Grosso, Pedro Taques, não pôde comparecer e
enviou o secretário-adjunto de Gestão Ambiental, Alex Marega, para
representá-lo.
O evento ocorreu em
dois momentos: no primeiro dia, gestores das pastas do Meio Ambiente, Saúde,
Educação, Segurança Pública, Assistência Social à criança e ao adolescente,
Corpo de Bombeiros e Polícia Militar, discutiram temas relevantes e comuns
entre os estados. Os gestores foram divididos em dois locais, na Escola de
Administração Pública do Amapá (EAP) e na Residência Oficial do Governo do Estado.
As discussões serviram de base para a elaboração da Carta de Macapá, que
aconteceu no segundo dia, no Ceta Ecotel, distrito de Fazendinha, onde os
governadores se reuniram para avaliar o que foi tratado pelos gestores
estaduais no dia anterior.
Fórum
Em três anos de
realização do Fórum de Governadores da Amazônia Legal, é a primeira vez que o
tema da segurança pública é tratado pelos governadores. Todos foram unânimes em
cobrar mais financiamento para as forças de segurança estaduais e apoio das
Forças Armadas no combate ao crime. O governador do Amazonas, José Melo, fez
uma fala contundente sobre assunto, assim como o governador do Maranhão, Flávio
Dino.
Antes de discorrer
com as suas considerações, o governador do Amazonas fez um relato do
surgimento, dissidência e avanço de facções nos presídios, para lembrar que a
briga entre os criminosos é pela rota do tráfico de drogas. "No Amazonas,
83% das ocorrências policiais tem relação com o tráfico de drogas" ressaltou
o governador José Melo. Ele considerou, ainda, que o desenvolvimento da
tecnologia na Amazônia pode contribuir com as potencialidades do restante do
país.
O governador do
Maranhão, Flávio Dino, criticou a responsabilização dos estados pelo aumento da
criminalidade. Para ele, não apenas o Executivo, mas o Judiciário e o
Ministério Público também precisam estar envolvidos na busca por soluções para
o enfrentamento da violência.
“O Judiciário e o Ministério
Público monopolizam o poder punitivo do estado. Não é o governo que decide quem
entra e quem sai do sistema penitenciário”, frisou o chefe de estado maranhense,
depois de pedir que fosse incluída na Carta de Macapá, as responsabilidades das
Forças, Armadas, Polícia Rodoviária Federal e Polícia Federal no combate ao
crime organizado. Ele completou dizendo que o tema das facções tem que ser
tratado sem medo pelo estado. “Temos que tomar posição de governo para frear a
violência”, defendeu.
O governador de
Rondônia, Confúcio Moura, por sua vez, criticou a falta de apoio da União aos
estados da Amazônia Legal e disse que os governadores devem ir além de um
documento. "Só seremos atendidos nas nossas reivindicações se formos
pessoalmente ao Palácio do Planalto", considerou.
Um problema comum de
estados fronteiriços é a emigração e imigração de pessoas de estados
brasileiros e países vizinhos, como no caso de Roraima. “A crise política da
Venezuela, também nos atinge. Com as dificuldades do país, muitos venezuelanos
vem se instalar em Roraima ou buscar atendimento médico. E isso tem
sobrecarregado ainda mais nossos sistemas”, lamentou a governadora Suely Campos.
A chefe de estado
pediu que a União tenha um olhar diferenciado para a Amazônia pela dificuldade
de acesso à região. Nesse aspecto, ela se referiu à chegada de mercadorias,
produtos e serviços que oneram, não apenas o bolso do cidadão, como também os
cofres públicos. Ela também reclamou que Roraima ainda não foi integrado ao
Sistema Interligado Nacional (SIN). “Ainda dependemos de termoelétricas.
Fizemos e fazemos tudo o que é necessário para sermos interligados, mas a falta
de vontade política é maior que a necessidade da população”, lamentou.
Já o governador de
Tocantins, Marcelo Miranda, disse que apesar de o estado não fazer fronteira
internacional, a unidade faz fronteira com seis estados brasileiros. “Claro que
isso tem suas vantagens. Mas, também, nos coloca numa rota de atenção,
principalmente, quando se trata de segurança pública”, ponderou.
Falando sobre as
políticas de proteção dos direitos da criança e do adolescente – um tema
recorrente nos fóruns de governadores – Miranda destacou que a implantação da
Escola Militar na rede pública está dando certo no Tocantins. E chamou a
atenção para que os estados se unam às prefeituras para este fim. "Precisamos
trazer pra perto as gestões municipais para dividirmos as responsabilidades com
crianças e adolescentes", sugeriu. Sobre o crime organizado, o governador avaliou
que o crime ocupa o espaço que o estado não ocupa. “Então, vamos ocupar estes
espaços”, convidou.
O governador do Acre,
Tião Viana, também defendeu a criação de um sistema nacional de segurança
pública. Com relação às políticas públicas de proteção à criança e ao
adolescente, ele disse que os acreanos já contarão, em 2017, com a implantação
do Ensino Médio em Tempo Integral. Para o governador, esse tipo de medida
contribui para a ocupação de crianças e adolescentes em vulnerabilidade social.
E o governador do
Pará, Simão Jatene, destacou a importância do ‘fator amazônico’ para a
formulação de políticas públicas de desenvolvimento dos estados. Ele acredita
que as cartas resultantes dos fóruns são documentos válidos para que o Governo
Federal saiba da unificação das propostas e anseios da população amazônida.
“Defendo que a Carta de Macapá diga, enfaticamente, a razão de estarmos aqui
reunidos. E que formatemos uma agenda temática de trabalho” Simão Jatene (PA)
Carta
de Macapá
Antes de os
governadores se manifestarem, foram designados relatores dos temas discutidos
no dia anterior para que pudessem expor aos governadores o que foi tratado.
Após as considerações dos chefes de estado quanto ao teor da Carta de Macapá, é
que o documento foi elaborado. Mas, antes da elaboração da carta, foi
apresentado aos chefes de estado o Consórcio Interestadual de Desenvolvimento
Sustentável da Amazônia Legal.
O Consórcio foi,
então, incluído no documento, como proposta que consolida e efetiva ações
colaborativas para o desenvolvimento dos estados do Amapá, Acre, Amazonas,
Maranhão, Mato Grosso, Rondônia, Roraima, Pará e Tocantins.
Para o chefe do
Executivo amapaense, Waldez Góes, o novo dispositivo é a melhor forma para os
governadores se associarem em busca do desenvolvimento da região. Pois, o
consórcio permite aos estados executarem entre si cooperações, convênios,
associação de serviços, execução de obras, compras públicas, compartilhamento
de serviços e instrumentos, produção de estudos técnicos, intercâmbio
científico, entre outras permissões.
“A função principal
do consórcio é enfrentar a pobreza e reduzir as desigualdades em todos os estados
da Amazônia Legal. Para isso, nós governadores, após o trabalho das equipes
técnicas de governo, elencamos diversas ações em sete eixos, nos quais
identificamos dificuldades e soluções que podem ser trabalhadas em cooperação”,
explicou o governador amapaense. Para a sua implementação efetiva, o Consórcio
Interestadual precisa passar pelas fases de elaboração de estatuto, publicação
e ratificação legal pelas Assembleias Legislativas de cada estado.
Eixos
temáticos
Além da firmação do
Consórcio Interestadual de Desenvolvimento Sustentável da Amazônia Legal, a
Carta de Macapá também destacou a necessidade de a União descentralizar os
recursos para financiamento da segurança pública. Esta medida, segundo a Carta,
resultaria em mais ações nas fronteiras amazônicas para coibir o narcotráfico e
melhorias no sistema carcerário nos estados da região.
O documento também
reconhece as ações do governo federal para implementar a Política Nacional de
Mudanças Climáticas e cobra da União mais celeridade na regulamentação do Art.
41 da Lei 12651/2012, que trata da concessão de incentivos fiscais para os
Estados que adotarem medidas para redução da emissão de gases de efeito estufa,
como a diminuição do desmatamento.
As ações, por eixo,
pelas quais os governos irão buscar apoio do governo federal, definidas na
Carta de Macapá são:
Comunicação
- Criação do Fórum
Permanente de Comunicação Pública Governamental da Amazônia.
- Fomento para a
comunicação voltada ao cidadão (canal direto entre a população e os governos).
Segurança
Pública
- Definir de forma
clara as fontes do Fundo Nacional de Segurança Pública.
- Operação policial
de 90 dias nas divisas e fronteiras dos Estados amazônicos contra o tráfico.
- Atuação permanente
das forças armadas nas fronteiras.
- Construção, pela
União, de 27 presídios de 150 vagas a serem administrados pelos Estados.
- Construção de cinco
presídios federais para condenados faccionados.
- Criação de um Banco
Nacional de Dados sobre o crime organizado.
- Atuação da Força
Nacional, por 90 dias, em apoio a Polícia Rodoviária Federal.
- Definição da
política da União para o combate ao crime organizado na Amazônia Legal.
Saúde
- Ampliar o
atendimento nas fronteiras e divisas entre os Estados.
- Intensificar o
combate ao Aedes aegypti nas fronteiras.
- Ações preventivas
de redução da mortalidade infantil e população indígena.
- Plano conjunto com
a União para reduzir a mortalidade materno-infantil.
- Financiamento
diferenciado para programa de saúde na região amazônica.
- Implantar
consórcios interfederativos para aquisição de medicamentos de alto custo.
Criança
e Adolescente
- Fortalecimento de
uma rede de proteção integral e dos direitos humanos da criança e adolescente,
incluídos os sistemas judiciário e policial.
- Reafirmação da
Agenda da Criança Amazônica do Unicef.
Educação
- Criação de uma
Câmara Técnica Regional Integrada com compromisso das metas da Agenda Criança
Amazônica voltadas ao segmento.
- Subsidiar decisões
políticas considerando o “fator amazônico” para a educação.
Assistência
Social
- Mais políticas de prevenção.
- Cofinanciamento
para as políticas do setor.
- Gestão integrada no
desenvolvimentos da políticas.
- Criação de núcleo
de integração de políticas.
- Fortalecer as
gestões municipais na assistência social.
Desenvolvimento
Sustentável
- Grupo de estudos
para definir a regulamentação do Art. 41 da lei 12651/2012, tendo a
participação do Ministério do Meio Ambientes.
- Maior sintonia
entre os Estados amazônicos e o Fundo Amazônia antes da aprovação de projetos.
- Outras
providências.
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