Artigo
O Fim Da
Mobilidade Social Ascendente,
José Eustáquio Diniz Alves.
As economias avançadas são aquelas que apresentaram grande
crescimento econômico no século XX. Estas economias de alta renda viabilizaram
um processo de mobilidade social ascendente, com cada nova geração ficando mais
rica e com melhores indicadores de desenvolvimento humano do que as gerações
precedentes.
A maioria das pessoas que cresceram em economias avançadas desde a
Segunda Guerra Mundial passaram a ter uma vida melhor do que a de seus pais.
Com exceção de um breve hiato na década de 1970, o dinamismo do crescimento
econômico e a melhora do nível de emprego possibilitaram que a maioria das
famílias experimentassem aumento dos rendimentos, tanto antes como depois dos impostos
e transferências. Ainda recentemente, entre 1993 e 2005, 98% das famílias, em
25 economias avançadas, tiveram aumento da renda real, segundo estudo da
McKinsey Global Institute.
Mas o quadro mudou no século XXI. Os rendimentos reais de cerca de dois
terços das famílias nas 25 economias avançadas do estudo ficaram estáveis ??ou
caíram entre 2005 e 2014. O relatório da McKinsey constata que, entre 2005 e
2014, os rendimentos reais nessas mesmas economias avançadas ficaram estáveis
??ou caíram para 65 a 70% das famílias, ou mais de 540 milhões de pessoas. E
depois das transferências governamentais e com menores taxas e impostos a
situação foi atenuada, mas assim mesmo até um quarto de todas as famílias teve
a renda estagnada ou em declínio na década.
Estes resultados fornecem uma nova perspectiva para o debate sobre a
desigualdade de renda que vem preocupando os políticos das economias avançadas.
O relatório da McKinsey detalha o aumento acentuado na proporção de agregados
familiares e grupos de renda que simplesmente não estão avançando, fenômeno que
afeta pessoas em todas as esferas da distribuição de renda. E os mais atingidos
são os jovens, os trabalhadores menos instruídos, levantando o espectro de uma
“geração perdida”, que está crescendo mais pobres do que seus pais.
O impacto econômico e social desta situação é potencialmente corrosivo.
As pessoas cujos rendimentos não estão avançando estão perdendo a fé em
aspectos do sistema econômico global. Quase um terço daqueles que não estão
avançando disseram a situação pode ser ainda pior com seus filhos. Isto gera
ansiedade, raiva e opiniões negativas sobre o livre comércio e a imigração.
Se o baixo crescimento econômico da última década continuar agravando o
quadro de estagnação secular, a proporção de domicílios em segmentos de renda
constante ou em declínio poderia subir tão alto quanto 70 a 80% do total de
famílias, durante a próxima década.
Este quadro reforça situações como a do Brexit e o crescimento de
líderes populistas e o avanço do bairrismo e da xenofobia. O empobrecimento de
amplos setores das economias avançadas também afeta as economias do Terceiro
Mundo e dificulta o caminho para a erradicação da pobreza e a melhoria da
qualidade de vida global. Talvez com a exceção de alguns países do leste asiático,
poderá ser também o fim da mobilidade social ascendente entre os países.
José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e
professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e
Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE;
Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail:
jed_alves@yahoo.com.br
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