domingo, 19 de fevereiro de 2017

AUDIÊNCIAS DE CUSTÓDIA

Audiência de custódia
A barreira dos ‘novos inquilinos’ no sistema carcerário




Mirrelle Rabelo



Não é necessário acompanhar apenas os noticiários para entender o tamanho da violência que os cidadãos vivem por todo País. Nas redes sociais, numa conversa entre amigos no trabalho ou na mesa de um bar, quase todo mundo tem uma experiência desagradável sobre a criminalidade. Furtos, assaltos, latrocínios, homicídios, sequestros e uma série de crimes assustam a sociedade.

Os órgãos de segurança pública montam estratégias de combate ao crime. Na linha de frente, as polícias repressiva e judiciária; na retaguarda, a justiça e no meio de tudo isso, a população. E o que mais preocupa o cidadão de bem é a fragilidade da lei e o relaxamento de prisões, principalmente, nos casos de reincidência com a implantação das audiências de custódia – projeto lançado em 2015 e que já está presente em todas as capitais brasileiras.

O projeto consiste na garantia da rápida apresentação do preso a um juiz nos casos de prisões em flagrante. A ideia é que o acusado seja apresentado e entrevistado pelo juiz, em uma audiência em que serão ouvidas também as manifestações do Ministério Público, da Defensoria Pública ou do advogado do preso. O projeto prevê, também, a estruturação de centrais de medidas alternativas, monitoramento eletrônico, serviços e assistência social e câmaras de mediação penal. Elas serão responsáveis por representar ao juiz opções ao encarceramento provisório.



Como funciona as Audiências de Custódia?
O preso em flagrante deve ser levado à presença de autoridade judicial num prazo de 24 horas para a audiência de custódia, onde o juiz analisa a prisão sob o aspecto da legalidade, da necessidade e da adequação da continuidade da prisão ou da eventual concessão de liberdade, com ou sem a imposição de outras medidas cautelares. O juiz poderá avaliar também eventuais ocorrências de tortura ou de maus-tratos, entre outras irregularidades.
Em primeiro de fevereiro de 2016, entrou em vigor uma resolução que regulamenta tais audiências no Poder Judiciário que estipulou prazo de 90 dias, contados a partir desta data, para que os Tribunais de Justiça e os Tribunais Regionais Federais se adequassem ao procedimento.
O Brasil não tem uma lei que regulamente o tema. Mas, existe um projeto tramitando no Congresso Nacional. Enquanto isso, o Supremo Tribunal Federal (STF) já se posicionou no sentido de ratificar a legalidade da metodologia das audiências de custódia.
Vantagens x insegurança
A audiência de custódia tem vantagens mais para o sistema prisional do que para a sociedade. Pois, enquanto o cidadão sobrevive à insegurança se cercando de cuidados e ‘aprisionado’ dentro de casa, os criminosos tem o amparo legal para não ir para a penitenciária. E, assim, a justiça vai controlando a entrada de novos ‘inquilinos’ nas cadeias e evitando a superlotação dos cárceres - uma realidade de todos os estados brasileiros. É que a audiência de custódia possibilita que a autoridade judicial aprecie a necessidade da prisão preventiva.
Além disso, tem os ganhos em direitos humanos, uma vez que o preso não pode ser submetido a uma reprimenda um pouco mais rigorosa para não caracterizar tortura. Tem, ainda, a economia aos cofres públicos - que pode chegar a R$ 4,3 bilhões com o fim de prisões “desnecessárias”. Pois, um preso custa em média 3 mil reais por mês.
O que diz o cidadão sobre o tema
O tema gera dúvidas e conflitos. Pois, nem todos aprovam a ferramenta já que, do ponto de vista de alguns, é algo que desperta maior interesse ao criminoso. Para outros, é uma forma de agilizar os serviços da justiça poupando gastos.
“O cidadão de bem não procura saber sobre o assunto porque ele não tem intenção de praticar crime algum. Então, é algo que não desperta interesse a toda sociedade. Já o criminoso fica esperto, observando que pode ser mais uma “brecha” na lei pra ele cometer seus delitos”, opinou o empresário Sousa Corrêa.
Para a professora Rosenilda Vilhena, a audiência de custodia é beneficio a todos.  “A justiça é um direito de todos e acredito que antes de ser aplicado, o projeto foi estudado. Sabemos, sim, que existem falhas em nossas leis. Mas, este, pode ser um começo de mudanças, evitando prisões desnecessárias sendo, também, uma forma de desburocratizar o trabalho da justiça e simplificando ações com medidas imediatas”, comentou.
Audiência de Custódia no Amapá
O Tribunal de Justiça do Amapá (TJAP) lançou o programa em setembro de 2015 e até novembro do mesmo ano, ele já havia sido implantado em todos os municípios do estado. Nas comarcas de Macapá e de Santana, o atendimento ocorre na Vara de Penas e Medidas Alternativas e na Vara da Violência Doméstica. Nas demais comarcas, as audiências de custódia funcionam com esquema de plantão.
O Amapá foi o 22º estado a implantar o projeto, encerrando o ciclo de expansão da Audiência de Custódia na Região Norte. Através desse mapa os registros mostram que, de setembro de 2015 a dezembro de 2016, a justiça concedeu por mais vezes a liberdade provisória aos suspeitos.



Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostram que, das 2.561 audiências realizadas, 1.486 (58,2%) dos presos em flagrantes tiverem o beneficio da liberdade provisória. Já outros 1.075 não tiveram a mesma sorte, preenchendo os requisitos de prisão preventiva até o julgamento correspondendo a uma porcentagem de 41,98%.
Outros 90 casos, correspondendo a apenas 3,51%, foram encaminhados ao serviço social. Estas são situações em que não são cometidos crimes graves e a justiça concede uma pena alternativa, na qual o suspeito deve prestar serviços sociais. Os dados revelam ainda, que desde o início do programa, o Amapá não registrou nenhum caso de violência ou maus tratos no ato da prisão.

 `Programa de custódia

O programa de audiência de custódia ainda não é lei. Mas, o Plenário do Senado já aprovou o projeto que regulamenta a prática das audiências de custódia e estipula prazo máximo de 24 horas para que um preso, em flagrante, seja levado diante de um juiz. O Projeto de Lei do Senado nº 554/2011, ainda precisará ser apreciado em turno suplementar, o que deve acontecer depois do recesso parlamentar.
A proposta altera o Código de Processo Penal, estabelecendo que o preso terá direito a realizar exame de corpo de delito e a depor na presença do advogado ou de membro do Ministério Público ou da Defensoria Pública. Se a audiência de custódia não acontecer, o fato deverá ser comunicado ao Ministério Público, à Defensoria Pública ou ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
A audiência servirá para que o juiz verifique se os direitos fundamentais do preso estão sendo respeitados. Ela não poderá ser usada como prova contra o depoente e deve tratar apenas da legalidade e da necessidade da prisão, da prevenção da ocorrência de tortura ou de maus-tratos e do esclarecimento dos direitos assegurados ao preso. A autoridade judiciária deverá, também, se informar se o Ministério Público vai requerer a prisão preventiva ou outra medida cautelar alternativa à detenção.
Violação
O projeto também estabelece que, imediatamente após o registro do auto de prisão em flagrante e se for alegada a violação a direitos fundamentais, a autoridade policial deverá determinar as medidas necessárias para a preservação da integridade do preso. Deverá, ainda, pedir a apuração dos fatos e instaurar inquérito.
Fiança
Se o crime for afiançável e se for verificado que o preso não tem dinheiro para pagar a fiança, o juiz poderá dispensar o recolhimento do valor. No entanto, o detento terá que comparecer perante a autoridade periodicamente e, sempre que intimado, e não poderá mudar de residência sem prévia permissão da autoridade processante ou ausentar-se de casa por mais de oito dias sem comunicar àquela autoridade, o lugar onde será encontrado.
Discussão
O autor da proposta é o senador Antônio Carlos Valadares (PSB-SE) que defendeu o projeto no Plenário, citando estatísticas referentes à prática das audiências de custódia, que existe no Brasil desde 2015. Segundo o senador, já foram realizadas mais de 93 mil audiências nesse período. Elas resultaram na libertação, ao menos provisória, de mais de 43 mil pessoas, o que gerou uma economia de R$ 4 bilhões aos cofres públicos e tirou a pressão da população carcerária brasileira, que é a quarta maior do mundo.
Houve divergências dos senadores Waldemir Moka (PMDB-MS) e Simone Tebet (PMDB-MS). Eles argumentaram que municípios pequenos teriam dificuldade de cumprir a determinação por não terem comarcas próprias e precisariam deslocar parte de seu, já pequeno efetivo policial, para conduzir o preso à outra cidade. Além disso, segundo ela, haveria o risco de impunidade.
“Se aprovarmos o projeto da forma como está, ele garantiria ao preso o direito de ser solto independentemente do crime cometido por não ser levado a juízo em 24 horas. E se ele cometeu um crime hediondo? O projeto merece o meu aplauso, mas acho que está muito solto”, observou a senadora Simone Tebet.

Na opinião dos senadores, o projeto deve prever que, em caso de crime hediondo, o mero atraso na realização da audiência de custódia não implique na libertação do preso em flagrante. No entanto, eles concordaram em fazer esse debate no turno suplementar de votação e aprovaram o projeto como está.

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