Certificação – “Área livre de aftosa com vacinação”
Pecuária amapaense terá uma transformação do pasto
ao prato.
Depois de todo o trâmite interno, Brasil pedirá reconhecimento do status do Estado à Organização Mundial de Saúde Animal. |
Criadores se unem
no combate à febre aftosa no Estado que tem o segundo maior rebanho bubalino do
país. Eles apostam nas exportações e na conquista de mercado no centro-sul
Reinaldo Coelho (*)
A erradicação da febre aftosa no Amapá é um compromisso do atual governo
do Estado, desde 2015, que agora será consolidado com a certificação pelo
Ministério de Agricultura como “Área livre de aftosa com vacinação”.
O Estado do Amapá possui pastagens naturais que se estendem por 1,6
milhão de hectares. Infraestrutura de acesso aos mercados nacional e
internacional. Experiência de quase seis décadas de adaptação às condições
climáticas da Amazônia. Detentor do segundo maior rebanho de búfalos do país,
com 280 mil cabeças, o Amapá há tempos reúne condições para ocupar um lugar de
destaque nesse nicho da pecuária nacional. O potencial, porém, nunca se tornou
realidade.
O motivo tem nome e sobrenome: Aphtae epizooticae, a febre aftosa,
doença viral que ataca animais de casco bifurcado e, no caminho, fecha portas
de mercados mundo afora.
Apesar de o último caso da doença ter sido registrado em 1999, desde
então, o Estado nunca alcançou condições sanitárias para sair da lista de áreas
classificadas como sendo de “alto risco” pelo Ministério da Agricultura.
“Faltavam união entre os produtores e ação do poder público”, opina o
produtor Jesus Pontes, cuja família chegou ao Estado há mais 60 anos e foi uma
das pioneiras na criação de bubalinos. “O resultado é que sempre convivemos com
restrições.”
Mudanças
Há menos de um ano, esse cenário começou a mudar rapidamente - e para
melhor. O primeiro passo foi a abertura da Associação dos Criadores do Amapá (Acriap),
que hoje tem 2.200 propriedades cadastradas.
“Reunimos todo mundo para dizer que a aftosa era um problema nosso, não
do Estado. Nós é que não conseguíamos acessar o mercado”, relata Jesus, que se
tornou o primeiro presidente da entidade.
A força concentrada logo deu resultados. Em reunião com o governo, os
produtores defenderam a necessidade de uma troca no comando da Agência de
Defesa e Inspeção Agropecuária (Diagro), onde identificavam um gargalo
administrativo. “Havia um problema de gestão muito grande. As informações sobre
ações de vacinação não eram coletadas ou informadas no prazo correto. Alguns
escritórios sequer produziam os levantamentos. E os anos iam passando, sem nada
mudar”, afirma.
O novo presidente da agência, o médico-veterinário e servidor de
carreira José Renato Ribeiro, ampliou as parcerias com as entidades do setor
privado, com foco nas falhas que, nos anos anteriores, impediam a mudança de
status da pecuária local. “Remodelamos o funcionamento da Diagro em todo o
Estado, com maior controle sobre o tráfego de animais”, diz.
Crescimento do
índice de vacinação
No ano passado, o Amapá fechou a vacinação com o melhor índice de
cobertura de sua história: 95,59% (em 2015, a campanha atingiu 87,6% do
rebanho). “Fizemos coletas de sangue em várias fazendas, investigamos todas as
doenças vesiculares e os resultados foram negativos, ou seja, não temos a
circulação do vírus da aftosa no Amapá”, diz José Renato.
A primeira conquista veio em maio. Por meio de uma instrução normativa,
o Ministério da Agricultura reduziu a classificação de risco para a doença no
Estado de alto para médio. A mudança estabeleceu um patamar inédito para os
produtores locais, que pela primeira vez estão oficialmente autorizados a
alcançar o mercado nacional – desde que os animais sejam submetidos a uma
quarentena de 15 dias antes de deixarem as divisas locais.
A expectativa de todos, porém, está no que ocorreria a partir de agosto,
quando está prevista a resposta, também pelo Ministério da Agricultura, a um
pedido oficial de reconhecimento do Estado como área livre de aftosa com
vacinação. Apesar das dificuldades, alcançamos as adequações no Programa
Nacional de Erradicação da Febre Aftosa (Pnefa), por meio do sistema de
auditorias, de supervisões nas unidades veterinárias locais (UVL) e inquéritos
soroepidemiológicos, tendo um papel preponderante, orientando as adequações e
melhorias necessárias à evolução da condição sanitária”, diz trecho do pedido.
José Renato Ribeiro, da Agência de Defesa e Inspeção Agropecuária (Diagro) |
O presidente da Diagro,José Renato Ribeiro, é otimista em relação à possibilidade de uma nova
qualificação. “Hoje, podemos dizer que atendemos a todas as exigências,
inclusive para a certificação internacional, que iremos buscar ainda este ano”,
avalia.
E esse otimismo foi concretizado,
pois de acordo com debatido em um encontro no Palácio do Setentrião entre a
equipe de governo e
representantes das instituições ligadas ao setor produtivo e de fiscalização da
produção bovina e bubalina no Amapá, com o coordenador-geral de sanidade
vegetal do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), Heitor
Medeiros e o governador Waldez Góes.
Durante o encontro a boa notícia foi transmitida pelo coordenador-geral, Heitor Medeiros,
que anunciou que até o fim deste mês será publicada, pelo Ministério, a
instrução normativa que certificará o Amapá como um Estado “livre de aftosa com
vacinação”.
Heitor Medeiros declarou sua satisfação ao ver os
resultados alcançados pelo Amapá e, principalmente, com a excelente articulação
de todos os entes envolvidos. “Encontramos no Amapá todos os atores necessários
para a conquista deste reconhecimento, muito engajados e compromissados, e essa
é a base para que o trabalho flua com qualidade também após a certificação, pois
este status deverá ser mantido com muito trabalho”, salientou.
Os técnicos do Ministério da Agricultura já estão
percorrendo os municípios do Amapá para avaliar "avanços e ajustes
necessários" para que o Estado possa ser declarado área livre de febre aftosa
com vacinação. O assunto foi discutido com o governador Waldez Góes, para
tratar as ações necessárias.
O coordenador informou, ainda, que o ministério
pleiteia o reconhecimento internacional para o Amapá, junto à Organização
Mundial de Saúde Animal (OIE), que deverá ser efetivado até maio do próximo
ano.
Reconhecimento
nacional
Em nota o Ministério da Agricultura diz que a
Agência de Defesa e Inspeção Agropecuária do Amapá (Diagro) pede a contratação
imediata de quatro veterinários, para os municípios de Laranjal do Jari, Cotias
do Araguari e Porto Grande, e oito auxiliares (técnicos agropecuários). Também
deverão ser adquiridas 14 caminhonetes e um quadriciclo para atuar nas áreas de
várzeas.
O reconhecimento nacional do estado como livre de
aftosa com vacinação está em análise no Mapa. Depois de atendidas às exigências
para o bom funcionamento do serviço veterinário local, deverá ser assinada
Instrução Normativa, com o novo status sanitário do Amapá. Posteriormente o
pedido de reconhecimento de área livre de aftosa com vacinação será encaminhado
à Organização Mundial de Saúde Animal (OIE).
Vacinação
No dia 15 de setembro, o Estado inicia mais uma
campanha de vacinação que deve perdurar até novembro e, segundo o diretor, os
resultados esperados são os melhores possíveis.
Segundo o governador, os trabalhos de vacinação dos
rebanhos seguirão de forma intensa para que o Amapá mantenha o status,
pleiteando para 2019 a certificação de “livre de aftosa sem vacinação”.
Vida nova para os pecuaristas do Amapá
Jesus Pontes, presidente da Associação dos Criadores do Amapá (Acriap) |
Com a reclassificação concretizada, se abre muitas possibilidades para a
pecuária amapaense, que tinha seu crescimento limitado pelo tamanho do mercado
local. “Não adiantava aumentar o rebanho, porque não haveria para quem vender e
o preço iria lá para baixo”, relata Jesus Pontes, cuja família cria 8 mil
cabeças de búfalos em quatro áreas do Estado.
Segundo ele, uma das alternativas será enviar animais para o abate em
frigoríficos de outros Estados. “Esperamos um incremento de 15% a 20% no preço,
pois vamos ter concorrência agora. Vamos poder vender para um frigorífico no
Pará, por exemplo”, diz.
Logística
O Porto de Santana, que está preparado para se tornar um grande polo
exportador de grãos do Centro-Oeste, também poderá ser decisivo nesse novo
mercado. “A intenção é utilizar contêineres sanitários, refrigerados, para
fazer exportação de carnes específicas”, diz o presidente da Diagro.
No Brasil, a carne de búfalo encontra um mercado crescente
principalmente nos Estados de São Paulo e Paraná. Por se tratar de um produto
com baixo teor de gordura, encontra cada vez mais espaço entre os
frequentadores de academias. “É um corte diferenciado, uma iguaria”, define.
De olho na abertura do mercado, a Soreidom, uma trading que atua
principalmente com trigo e milho, já manifestou interesse em transportar a
futura carga em sua frota de navios para até 20.000 toneladas. O abastecimento
de países vizinhos, como a Guiana Francesa, é uma das possibilidades.
O beneficiamento do couro também entra nessa conta. Atualmente, o
produto produzido no Estado é vendido para uma fábrica do Rio Grande do Sul,
onde é curtido, tingido e vendido à Europa para ser utilizado na indústria de
calçados e acessórios.
O florescimento da pecuária local obviamente não passa apenas pela
certificação como área livre com vacinação. O presidente da Diagro lembra que o
consumidor externo exige muito mais do que a erradicação da aftosa.
“O Amapá tem um rebanho bubalino grande e áreas com potencial de
expansão. O que o estudo precisa é de uma transformação do pasto ao prato.
Mudar toda a cadeia produtiva.”
Fontes: Revista
Globo Rural.
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