sexta-feira, 8 de setembro de 2017

Aphtae epizooticae

Certificação – “Área livre de aftosa com vacinação”
Pecuária amapaense terá uma transformação do pasto ao prato.

 
Depois de todo o trâmite interno, Brasil pedirá reconhecimento do status do Estado à Organização Mundial de Saúde Animal.

Criadores se unem no combate à febre aftosa no Estado que tem o segundo maior rebanho bubalino do país. Eles apostam nas exportações e na conquista de mercado no centro-sul


Reinaldo Coelho (*)
A erradicação da febre aftosa no Amapá é um compromisso do atual governo do Estado, desde 2015, que agora será consolidado com a certificação pelo Ministério de Agricultura como “Área livre de aftosa com vacinação”.
O Estado do Amapá possui pastagens naturais que se estendem por 1,6 milhão de hectares. Infraestrutura de acesso aos mercados nacional e internacional. Experiência de quase seis décadas de adaptação às condições climáticas da Amazônia. Detentor do segundo maior rebanho de búfalos do país, com 280 mil cabeças, o Amapá há tempos reúne condições para ocupar um lugar de destaque nesse nicho da pecuária nacional. O potencial, porém, nunca se tornou realidade.

O motivo tem nome e sobrenome: Aphtae epizooticae, a febre aftosa, doença viral que ataca animais de casco bifurcado e, no caminho, fecha portas de mercados mundo afora.
Apesar de o último caso da doença ter sido registrado em 1999, desde então, o Estado nunca alcançou condições sanitárias para sair da lista de áreas classificadas como sendo de “alto risco” pelo Ministério da Agricultura.
“Faltavam união entre os produtores e ação do poder público”, opina o produtor Jesus Pontes, cuja família chegou ao Estado há mais 60 anos e foi uma das pioneiras na criação de bubalinos. “O resultado é que sempre convivemos com restrições.”
Mudanças
Há menos de um ano, esse cenário começou a mudar rapidamente - e para melhor. O primeiro passo foi a abertura da Associação dos Criadores do Amapá (Acriap), que hoje tem 2.200 propriedades cadastradas.
“Reunimos todo mundo para dizer que a aftosa era um problema nosso, não do Estado. Nós é que não conseguíamos acessar o mercado”, relata Jesus, que se tornou o primeiro presidente da entidade.
A força concentrada logo deu resultados. Em reunião com o governo, os produtores defenderam a necessidade de uma troca no comando da Agência de Defesa e Inspeção Agropecuária (Diagro), onde identificavam um gargalo administrativo. “Havia um problema de gestão muito grande. As informações sobre ações de vacinação não eram coletadas ou informadas no prazo correto. Alguns escritórios sequer produziam os levantamentos. E os anos iam passando, sem nada mudar”, afirma.
O novo presidente da agência, o médico-veterinário e servidor de carreira José Renato Ribeiro, ampliou as parcerias com as entidades do setor privado, com foco nas falhas que, nos anos anteriores, impediam a mudança de status da pecuária local. “Remodelamos o funcionamento da Diagro em todo o Estado, com maior controle sobre o tráfego de animais”, diz.

Crescimento do índice de vacinação
No ano passado, o Amapá fechou a vacinação com o melhor índice de cobertura de sua história: 95,59% (em 2015, a campanha atingiu 87,6% do rebanho). “Fizemos coletas de sangue em várias fazendas, investigamos todas as doenças vesiculares e os resultados foram negativos, ou seja, não temos a circulação do vírus da aftosa no Amapá”, diz José Renato.

A primeira conquista veio em maio. Por meio de uma instrução normativa, o Ministério da Agricultura reduziu a classificação de risco para a doença no Estado de alto para médio. A mudança estabeleceu um patamar inédito para os produtores locais, que pela primeira vez estão oficialmente autorizados a alcançar o mercado nacional – desde que os animais sejam submetidos a uma quarentena de 15 dias antes de deixarem as divisas locais.
A expectativa de todos, porém, está no que ocorreria a partir de agosto, quando está prevista a resposta, também pelo Ministério da Agricultura, a um pedido oficial de reconhecimento do Estado como área livre de aftosa com vacinação. Apesar das dificuldades, alcançamos as adequações no Programa Nacional de Erradicação da Febre Aftosa (Pnefa), por meio do sistema de auditorias, de supervisões nas unidades veterinárias locais (UVL) e inquéritos soroepidemiológicos, tendo um papel preponderante, orientando as adequações e melhorias necessárias à evolução da condição sanitária”, diz trecho do pedido.
José Renato Ribeiro, da Agência de Defesa
e Inspeção Agropecuária (Diagro)
O presidente da Diagro,José Renato Ribeiro, é otimista em relação à possibilidade de uma nova qualificação. “Hoje, podemos dizer que atendemos a todas as exigências, inclusive para a certificação internacional, que iremos buscar ainda este ano”, avalia.
E esse otimismo foi concretizado, pois de acordo com debatido em um encontro no Palácio do Setentrião entre a equipe de governo e representantes das instituições ligadas ao setor produtivo e de fiscalização da produção bovina e bubalina no Amapá, com o coordenador-geral de sanidade vegetal do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), Heitor Medeiros e o governador Waldez Góes.


Durante o encontro a boa notícia foi transmitida pelo coordenador-geral, Heitor Medeiros, que anunciou que até o fim deste mês será publicada, pelo Ministério, a instrução normativa que certificará o Amapá como um Estado “livre de aftosa com vacinação”.
Heitor Medeiros declarou sua satisfação ao ver os resultados alcançados pelo Amapá e, principalmente, com a excelente articulação de todos os entes envolvidos. “Encontramos no Amapá todos os atores necessários para a conquista deste reconhecimento, muito engajados e compromissados, e essa é a base para que o trabalho flua com qualidade também após a certificação, pois este status deverá ser mantido com muito trabalho”, salientou.
Os técnicos do Ministério da Agricultura já estão percorrendo os municípios do Amapá para avaliar "avanços e ajustes necessários" para que o Estado possa ser declarado área livre de febre aftosa com vacinação. O assunto foi discutido com o governador Waldez Góes, para tratar as ações necessárias.

O coordenador informou, ainda, que o ministério pleiteia o reconhecimento internacional para o Amapá, junto à Organização Mundial de Saúde Animal (OIE), que deverá ser efetivado até maio do próximo ano.
 
Gráfico da evolução do combate a Febre Aftosa no Amapá
Reconhecimento nacional

Em nota o Ministério da Agricultura diz que a Agência de Defesa e Inspeção Agropecuária do Amapá (Diagro) pede a contratação imediata de quatro veterinários, para os municípios de Laranjal do Jari, Cotias do Araguari e Porto Grande, e oito auxiliares (técnicos agropecuários). Também deverão ser adquiridas 14 caminhonetes e um quadriciclo para atuar nas áreas de várzeas.

O reconhecimento nacional do estado como livre de aftosa com vacinação está em análise no Mapa. Depois de atendidas às exigências para o bom funcionamento do serviço veterinário local, deverá ser assinada Instrução Normativa, com o novo status sanitário do Amapá. Posteriormente o pedido de reconhecimento de área livre de aftosa com vacinação será encaminhado à Organização Mundial de Saúde Animal (OIE).

Vacinação

No dia 15 de setembro, o Estado inicia mais uma campanha de vacinação que deve perdurar até novembro e, segundo o diretor, os resultados esperados são os melhores possíveis.
Segundo o governador, os trabalhos de vacinação dos rebanhos seguirão de forma intensa para que o Amapá mantenha o status, pleiteando para 2019 a certificação de “livre de aftosa sem vacinação”.





Vida nova para os pecuaristas do Amapá
Jesus Pontes, presidente da Associação dos Criadores do Amapá (Acriap)

Com a reclassificação concretizada, se abre muitas possibilidades para a pecuária amapaense, que tinha seu crescimento limitado pelo tamanho do mercado local. “Não adiantava aumentar o rebanho, porque não haveria para quem vender e o preço iria lá para baixo”, relata Jesus Pontes, cuja família cria 8 mil cabeças de búfalos em quatro áreas do Estado.
Segundo ele, uma das alternativas será enviar animais para o abate em frigoríficos de outros Estados. “Esperamos um incremento de 15% a 20% no preço, pois vamos ter concorrência agora. Vamos poder vender para um frigorífico no Pará, por exemplo”, diz.
 Logística
O Porto de Santana, que está preparado para se tornar um grande polo exportador de grãos do Centro-Oeste, também poderá ser decisivo nesse novo mercado. “A intenção é utilizar contêineres sanitários, refrigerados, para fazer exportação de carnes específicas”, diz o presidente da Diagro.
No Brasil, a carne de búfalo encontra um mercado crescente principalmente nos Estados de São Paulo e Paraná. Por se tratar de um produto com baixo teor de gordura, encontra cada vez mais espaço entre os frequentadores de academias. “É um corte diferenciado, uma iguaria”, define.
De olho na abertura do mercado, a Soreidom, uma trading que atua principalmente com trigo e milho, já manifestou interesse em transportar a futura carga em sua frota de navios para até 20.000 toneladas. O abastecimento de países vizinhos, como a Guiana Francesa, é uma das possibilidades.
O beneficiamento do couro também entra nessa conta. Atualmente, o produto produzido no Estado é vendido para uma fábrica do Rio Grande do Sul, onde é curtido, tingido e vendido à Europa para ser utilizado na indústria de calçados e acessórios.
O florescimento da pecuária local obviamente não passa apenas pela certificação como área livre com vacinação. O presidente da Diagro lembra que o consumidor externo exige muito mais do que a erradicação da aftosa.
“O Amapá tem um rebanho bubalino grande e áreas com potencial de expansão. O que o estudo precisa é de uma transformação do pasto ao prato. Mudar toda a cadeia produtiva.”
Fontes: Revista Globo Rural.


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