sexta-feira, 8 de setembro de 2017

ARTIGO DO REI



Professor: profissão de risco

Desvalorizado financeiramente e socialmente, resta ao docente um sentimento de abandono. “O professor tem de se virar na sala de aula para ensinar e para tomar cuidado com o que pode acontecer ali dentro”.

Mas antigamente não se via, ou raramente se via, eram professores sendo espancados em plena sala de aula. Em meus dias de tutor, enfrentei discussões com alunos, inclusive com marginais, porém, por sorte, nunca me deram nas ventas.
Em um passado não muito distante o professor era o segundo pai ou mãe, e sua palavra virava ordem sem contestação ou intervenção dos pais. O professor sempre estava certo, não adiantava argumentar.
Atualmente a escola está perdida, literalmente amedrontada, e ser professor virou profissão de risco.
E onde foi que perdemos a mão?
A resposta é simples, porém mexe com feridas abertas por um modelo de vida arriscado que as famílias resolveram assumir: o imediatismo.
No tempo em que a família era uma instituição respeitada o consumo era menor, assim como a ansiedade por ter bens materiais. Logo não se precisava trabalhar tanto. Os pais estavam muito mais atentos com o desenvolvimento das crianças e nisso imperava um respeito enorme por pais e por professores.
Em determinado momento as necessidades materiais se tornaram prioridades em detrimento dos valores morais, tão necessários na formação do caráter da criança. Jogou-se um monte de responsabilidades para os outros e os outros são os outros, e só. Nossa geração é a geração do vácuo. Saímos de uma criação quase medieval para a liberdade absoluta, o pode tudo.
Tínhamos imensa vontade de educar nossas crianças com conceitos novos, onde eles pudessem fazer escolhas por si só. No entanto esquecemo-nos de que as crianças ainda não discernem em idade infantil. E se assim for, o futuro adolescente se achará com plenos poderes para, inclusive, agredir professores.
Essa falta de noção de limites foi dada por pais sem preparo e por escolas também. Não é saudável para nenhuma sociedade privilegiar a preguiça em nome de falsos números.
A tecnologia tem substituído em grande parte as mentes humanas, por isso não há necessidade de uma boa escola que crie pensadores. Manusear máquinas e equipamentos exige apenas que se entenda o manual.
Então temos famílias desestruturadas, jovens com superpoderes e escolas que privilegiam a preguiça. Este quadro gerou esses estudantes bandidos que se julgam donos da sala de aula, da sala de casa, da sala de cinema e de todas as salas. Crianças sem respeito por ninguém e que têm o ECA na ponta da língua. ECA!
A impunidade criou uma sociedade relapsa. A maldade é inerente ao ser humano, porém os limites sociais, as leis, mantêm o homem “controlado”. Quando a lei é conivente o homem se solta, e solto torna-se selvagem, tenta por meio da força alcançar o poder, ainda que seja na sala de aula, mas tenta. Tocar nestas feridas é necessário, sim!
A cada década que deixamos de corrigir nossos erros passados, aprofundamos o problema, tornando-o mais complicado. Não adianta, o homem precisa de controles sérios, que demonstrem aos que não se enquadram as consequências e responsabilidades de seus atos.
Liberdade é uma consequência natural de homens passivos, que pensam, agem e conquistam pelo debate de ideias, pela emanação do bem comum, não por imposição simples e pura.
Num país onde os professores são intimidados, insultados, mal pagos e mal preparados, não se pode esperar nada. De que adiantam números econômicos se não temos moral?
Essa bandalheira que temos é muito conveniente para as forças dominantes, que não representam necessariamente o que pensamos, ou representam?
Estamos realmente isentos da mea-culpa ou culpa-inteira? 
Claro que não. Se a sociedade é um corpo constituído por todos nós, é lógico que temos nossa parcelinha nisso tudo.
Precisamos rever onde estamos e como agimos. Mexer na cicatriz e abri-la se assim for necessário e vai doer muito.
O papel do professor no século XXI passou a ter inúmeras roupagens. Além da escolarização, ele se tornou tutor, mentor, psicólogo, mãe, pai e amigo, muitos papéis para os quais não foi preparado para exercer, pois não são essas suas funções.
Quando assistimos aos noticiários acompanhando os pareceres, a legislação vigente, as deliberações e os projetos de lei que têm assolado quase que diariamente o setor da educação, percebemos que a profissão do professor virou uma grande aventura, uma profissão de risco.
Sim, estamos em perigo.
Pensemos juntos: com a inclusão, as escolas são obrigadas a atender crianças com todos os tipos de síndromes. Muitas vezes, o professor tem em sala 25 alunos e, dentre eles, por exemplo, um agressor severo, um autista, duas crianças com déficit de atenção e outra hiperativa. Em alguns casos, são crianças que perdem o equilíbrio emocional com muita facilidade, muitos sem receber os medicamentos e terapias adequados. Sem esquecer dos alunos que mordem e batem nos amigos.
Esse professor corre perigo, ele está à mercê de uma ocorrência grave a qualquer momento. O perigo pode ser físico e emocional: físico por ser machucado pelo aluno, e emocional por se sentir incapaz perante a situação, pois ele não foi capacitado para lidar com essa realidade.
Pensemos na questão jurídica, que também foi colocada ao professor. Como ele fará uma contenção corpórea neste exemplo que cito? Como justificar perante as crianças e, principalmente, a comunidade escolar que um professor se jogou em cima do aluno para conter sua agressividade para com outra criança?
Quando teremos em nossa nação pessoas que consigam fazer um pensar coletivo de educação para que não estourem dentro das salas de aulas os problemas recorrentes a um educar sem qualidade?
Se tivermos que fazer inclusão severa, sem condições, onde ficará o pedagógico, a aprendizagem, a sistematização? O que fluirá com qualidade e onde ficaremos devendo qualidade?
Podemos também ir mais longe neste pensamento e preocupação. Esta criança de inclusão precisa de atendimento clínico fora da escola, pois a inclusão não existe sem a questão clínica junto ao processo. Muitas vezes a família se nega a levar o filho para atendimento. E se leva ao médico demora muitas vezes um ano para um diagnóstico, pois no setor público encontramos a fila de espera, e no setor privado pesa o alto custo financeiro para as famílias.
Enquanto se aguarda esse processo moroso a criança está em sala de aula, à deriva, perante os amigos junto com a professora que precisa de alguma maneira se virar com a situação. Um problema que é dela, já que o Poder Público não vive o que ela passa em sala de aula.
A questão da inclusão sem precedentes é muito séria e precisa ser estudada, referenciada por todos, independente do cargo ou o que faça, pois hoje tudo gira em torno do pedagogo. Isso precisa ser pensado na qualidade de vida deste ser humano, responsável pelo futuro do nosso país. É na educação que está o segredo do sucesso do país, sentimos isso na Alemanha.
A educação e o planejamento são sérios e devem ser repensados para que o professor possa ter qualidade em seu trabalho, não sendo obrigado a exercer o papel de fisioterapeuta e psiquiatra em muitas situações.
A escolarização normal é para todos, sabemos disso, mas existem situações de inclusão que são extremamente graves e sem possibilidade alguma de serem escolarizados junto a outras crianças. Avaliar a perda dos outros alunos se faz necessária, assim como ter escolas de qualidade para atender crianças com problemas graves, para termos justiça e ética, juntamente com um repensar da inclusão social. Já a inclusão pedagógica é diferente e precisa ser pensada por todas.

Pensar em todos e em tudo, e não simplesmente fazer leis impossíveis de serem cumpridas. Queremos a inclusão de qualidade e não um grande fazer de conta que acontece hoje na maioria dos Estados brasileiros.

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