TEXTO REVISADO – Ok
O Brasil vive uma guerra civil diária
O
Brasil vive uma guerra civil não declarada, com a violência vitimando não
apenas jovens e adolescentes, em sua maioria negros e pobres, mas também
policiais civis e militares. Essa foi uma das afirmações do representante da
Associação Nacional de Praças (ANASPRA), cabo Elisandro Lotin de Souza, durante
a audiência pública interativa promovida pela CPI do Assassinato de Jovens há
dois anos na CPI do Assassinato de Jovens do Senado.
No
país que se orgulha da índole pacífica e hospitaleira de seu povo, a sociedade
organizada ou não para esse fim promove a matança impiedosa e fria de crianças
e adolescentes. Pelo menos sete milhões de menores, segundo estudos do Fundo
das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), vivem nas ruas das cidades
brasileiras.
Mas
quanto a afirmação de que o Brasil está em uma verdadeira Guerra Civil, a
resposta é: Não. O Brasil não está em uma situação de guerra. Mas temos um
problema sério. Qual é? Eu entendo que seja um problema de delinquência
crônica, no sentido que ela atinge toda a sociedade, na esfera moral, prática,
política e espiritual. Não de um jeito religioso, mas no equilíbrio das
emoções.
Um
dos elementos mais pobres desse diálogo seria a tentativa de explicar a escala
da violência como uma situação semelhante a uma guerra. Embora existam taxas
altas de criminalidade, as estatísticas não refletem os números reais de um
conflito. Também não ajuda muito a repetição de cenas de sangue em programas de
televisão, o que aumenta a sensação diária de insegurança.
Lendo
uma matéria sobre o assunto, destaco aqui a conclusão que chegou o paulista
André Liohn (40), um reconhecido fotógrafo de conflitos armados no mundo. Nos
últimos dez anos fez a cobertura de acontecimentos brutais e da situação de
refugiados em países da África e do Oriente Médio, produzindo reportagens para
revistas e jornais de peso.
Em
dezembro de 2011 foi um dos primeiros jornalistas a cruzar ilegalmente a
fronteira entre a Turquia e a Síria para documentar a então recente guerra
civil. Pouco depois, desembarcou na explosiva Líbia para cobrir os desdobramentos
da Primavera Árabe.
Sua
cobertura cravou seu nome na fotografia como o primeiro brasileiro a ganhar o
desejado prêmio ‘Robert Capa’, pela série de imagens dos confrontos da cidade
sitiada de Misrata, na Líbia, que deixou centenas de mortos. “Ali eu vi pessoas
que são (pessoas), não serem mais”. Abalado com o sofrimento de perder amigos
assassinados (inclusive jornalistas), Liohn foi cobrir um projeto de ajuda
humanitária no Congo, na África. Em 2013 pegou uma forte malária e voltou ao
Brasil para tentar se recuperar.
“Nesse
momento as pessoas me perguntavam sempre: o que é pior? A guerra lá fora ou a
guerra que nós temos aqui dentro? Sempre achei a pergunta descabida porque a
pessoa não sabe o que é uma guerra”, conta Liohn.
Ele
decidiu testar a hipótese de que o Brasil vive uma guerra velada,
“O
Brasil tem números de mortes comparáveis às de uma guerra? Mentira. A Síria tem
uma população de 22 milhões de pessoas e 210 mil pessoas já morreram na guerra.
Se a gente for pegar que o Brasil tem pelo menos 10 vezes a população da Síria,
deveríamos ter tido mais de 600 mil mortes.
Apesar
disso a violência pode acontecer a qualquer um. “Eu entendi que realmente num
caso de delinquência crônica existe alguma semelhança com a situação de guerra.
A principal é que vivemos constantemente sob a ameaça de uma morte violenta,
independente de classe, sexo, religião ou visão política”.
O
assalto. A polícia. O tiro. A facada. O preconceito. A emboscada. O medo. Para
muita gente o simples ato de sair de casa é uma situação de alerta. Pode ser
paranoia. Pode ser uma realidade. A verdade é que as pessoas não se sentem
seguras na rua.
Ao
falar sobre os efeitos psicológicos desse estado de alerta permanente, Liohn
acredita que o mais evidente é que “adotamos comportamentos violentos
preventivamente para nos defender da morte violenta”. O pensamento é parecido
com o do filósofo Jean-Paul Sartre, para quem a violência sempre se faz passar
por uma resposta à violência alheia.
Tudo
isso pode estimular uma “blindagem” em relação ao sofrimento do outro. Em uma
situação em que vivemos a possibilidade de morrer, a gente vai assumir uma
posição de que se isso for acontecer, que aconteça longe de mim. Não comigo ou
com pessoas que eu amo. Isso é uma semelhança entre delinquência crônica e
estado de guerra. (continua)
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