sexta-feira, 17 de novembro de 2017

DIREITO ELEITORAL - BESALIEL RODRIGUES

O COMBATE AO ABUSO DO PODER ECONÔMICO NAS ELEIÇÕES – II
                Como dissemos na oportunidade anterior, a sociedade civil, que compreende os partidos de massa, os sindicatos, as igrejas e demais associações, têm o dever de zelar pela melhor transparência possível dos processos eleitorais, sem prejuízo da vigilância existente no ordenamento jurídico.
               Entidades de classe, como a Ordem dos Advogados do Brasil - OAB, Associação dos Magistrados brasileiros - AMB, associações privadas, instituições como as famílias, escolas, universidades e mídia em geral, têm hoje a obrigação de ofício de combater, dentro de suas esferas de atuação e dentro de suas possibilidades, a corrupção eleitoral.
               Os corruptores eleitorais demonstram-se extremamente peritos em suas práticas delituosas. São profissionais no que fazem, sabem das deficiências do sistema e das brechas das leis; dificilmente caem nas mãos da Justiça, pois, mascaram muito bem seus crimes.
                Assim, exige-se da sociedade em geral uma atuação eficiente, uma evangelização política capaz de fazer com que os cidadãos, na maioria analfabetos e de baixa escolaridade, valorizem o voto, pois a sociedade brasileira anseia por democracia sem distorções causadas, principalmente, pelo abuso do poder econômico.
                Uma pequena ilustração de que a plutocracia infecta nossa vida política de há muito tempo nos é dada por Roberto Schwarz que, estudando a obra de Machado de Assis, concluiu que “(...) pode-se afirmar que, na visão machadiana, o problema fundamental do Brasil não é a Monarquia nem a República, mas, sim, a Oligarquia Absoluta. Este diagnóstico lúcido e atualíssimo é verdadeiramente genial. Monárquico ou republicano, o poder de fato é oligárquico.” (In Um mestre na periferia do capitalismo –  www.academia.org.br/biblio.htm, pp. 17-8).
                Temos, nesta citação, um ponto de reflexão para a sociedade brasileira. Não devemos descansar no combate à contaminação tão nefasta ao nosso povo, causada pelo abuso dos donos do poder econômico.
               Vejamos, agora, o histórico primeiro projeto de lei de iniciativa popular no Brasil contra o abuso do dinheiro nas eleições.
               Procurando não ficar omissa a esse combate, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB, por intermédio de sua Comissão Brasileira de Justiça e Paz -CBJP, em parceria com a Ordem dos Advogados do Brasil - OAB Nacional e outras mais de sessenta entidades representativas de todos os seguimentos sociais, resolveram, a partir de 1997, propugnar a alteração da legislação eleitoral brasileira, no que toca à repreensão mais ágil e objetiva da atuação desmedida do poder econômico no processo eleitoral, através de projeto de lei de iniciativa popular (CF/88, arts. 14 e 61).
                Assim, após alguns estudos preliminares e várias audiências públicas, o projeto de lei foi elaborado por uma comissão, iniciando-se, em seguida, a coleta nacional de assinaturas, que embasaria legalmente a iniciativa, tornando-a admissível no Congresso da Nação.
                Antes do Projeto começar a percorrer o país, foi levado pelo então secretário-geral da Comissão Brasileira de Justiça e Paz, Dr. Francisco Whitaker e pelo na época presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Dr. Reginaldo de Castro, ao então presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Ilmar Galvão, que foi o primeiro cidadão a subscrever a Iniciativa Popular, sendo seguido pelo presidente nacional dos Advogados (Jornal da OAB, de setembro/98).
                A coleta de assinaturas foi efetuada em todo o país, através das igrejas e dioceses, dos centros comunitários, em portas de fábricas, escolas, universidades, nos shoppings, nas feiras, nas ruas e até pela Internet. Por mais de um ano, mais de um milhão de eleitores foram mobilizados e subscreveram o primeiro Projeto de Lei de Iniciativa Popular da história do Brasil.
                Ato contínuo, o então presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, Dom Jayme Henrique Chemello levou o Projeto, com todos os seus requisitos legais, à Brasília, entregando-o nas mãos do então presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer que, por ironia do destino, é hoje o único Presidente da República denunciado por duas durante o mandato exatamente por corrupção e abuso do poder econômico.
                Como no Brasil há um dispositivo constitucional que diz que “a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até 1 (um) ano da data de sua vigência” (CF/88, art. 16, É o conhecido princípio de direito da anualidade), estando o tempo exíguo para o trâmite do Projeto, e mais, tendo de serem checadas todas as mais de um milhão de assinaturas dadas ao Projeto, não havendo tempo suficiente para tal operação, para não prejudicar a tramitação da Iniciativa e nem frustrar os anseios da população, que era ver aprovada as mudanças para vigorarem já no pleito seguinte, um grupo de parlamentares na Câmara Federal assumiu o Projeto.
                Dessa forma, devidamente recebido na Câmara dos Deputados, em históricos quarenta e um dias, o primeiro Projeto de Lei de Iniciativa Popular brasileiro tramitou, foi aprovado pelo Congresso e sancionado pelo Presidente da República, transformado-se na Lei n. 9.840, de 28 de setembro de 1999.
                Toda essa história que acabamos de relatar demonstra o poder que a sociedade tem e quase não é exercitado. Continuaremos na próxima oportunidade.



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