sábado, 4 de novembro de 2017

‘Ratos D’águas’


‘Ratos D’águas’
Navegação na Amazônia à mercê da criminalidade

Um soldado do Grupamento Tático Aéreo do Amapá (GTA-AP) patrulha um canal próximo ao Porto de Santana Foto - Dado Galdieri-The New York Times
Patrulhar os rios e igarapés da Amazônia em busca de piratas parece um jogo de gato e rato. Os ataques de piratas aos navios e outros tipos de embarcações ocorrem com maior incidência no Estreito de Breves, que fica situado em território paraense e serve de ligação fluvial entre os estados do Pará, Amapá e Amazonas.


Reinaldo Coelho


Por atalaia gigante
Ou por sinal de defesa,
Do granito mais possante
Levanta uma FORTALEZA
Negras muralhas ao Sul.
Outrora, adornadas de aço,
Faziam troar o espaço
Dos canhões seus co o fracasso,
no vasto horizonte azul.

A fortaleza homenageada nesta estrofe do poema Macapá, publicada na Revista Educação e Ensino do Pará, em Agosto de 1889, é a de São José de Macapá, escrita pelo poeta Alexandre Vaz Tavares, que também foi prefeito da cidade em 1920. O forte foi construído pelos portugueses, no período colonial, para combater os invasores e os piratas caribenhos que percorriam a costa brasileira.
E infelizmente a era dos piratas não acabou nas águas amazônicas. Ela apenas mudou de rota: da costa brasileira foi para os rios da Amazônia. Em vez de olho tapado e espadas, eles usam capuz, metralhadoras e fuzis AR 15. Para comunicação, sistema de rádio VHF. Também chamados de “ratos d’água”, os piratas atuam sempre em grupos. Eles ficam de tocaia e, usando rádios, articulam o ataque. O alvo predileto são embarcações que transportam combustível e eletrônicos, além de passageiros e turistas.

Os rios da região Norte são parte integrante da vida dos habitantes dessa região do Brasil. A característica dos rios amazônicos é favorável à navegação, pois muitos são extensos e volumosos e suas águas fluem lentamente. Tal condição faz com que os rios sejam uma importante via de transporte para os seus habitantes.


O transporte hidroviário é praticamente a única alternativa de transporte, tendo em vista que as rodovias são bastante restritas e as que existem não possibilitam o trânsito, como por exemplo, a transamazônica.

Essa característica típica amazônica, onde os rios, igarapés e furos são as vias de transporte dos moradores ribeirinhos e como acontece nas ruas e avenidas das cidades, existem criminosos de tocaia para cometerem os crimes, assaltos, roubos e latrocínios contra esses indefesos cidadãos brasileiros.
Enquanto as ruas das cidades têm iluminação e policiamento, mesmo precário, e recursos tecnológicos, como o sistema telefônico de chamadas emergenciais, os ribeirinhos, contam com a sorte e suas próprias defesas, pois os piratas dos rios ou como são conhecidos mundialmente “Ratos d’agua’ estão agindo atacando as embarcações e as comunidades ribeirinhas.
A medida que a população da região cresce e os traficantes de drogas ampliam a influência, aumentam os ataques de homens mascarados armados com rifles nos rios da Amazônia. Esses piratas não são exclusividade da Amazônia, pois agem em todos os países onde o fluxo de embarcações comerciais ou de turistas ricos os atraem.
Embarcações de diferentes tamanhos têm sido alvos de criminosos (Foto Adneison Severiano-G1 AM)

Aqui são os barcos que transitam repletos de gêneros alimentícios, eletrodomésticos, peças de tratores e automóveis, material de construção, medicamentos e muitas outras coisas, são os “tesouros”, por eles ambicionados. Além das mercadorias, há diariamente um grande fluxo de pessoas, o que lhes possibilita conseguir dinheiro em cache.
São milhares de ações, que não constam das estatísticas policiais, pois acontecem sua maioria em locais isolados, onde nem a polícia conhece. Roubam desde as canoas quanto assaltam as embarcações com passageiros. Atacam as residências isoladas, onde levam as rendas dos pescadores e pequenos agricultores.

Ações criminosas atingem estrangeiros

Um fato que atraiu os holofotes internacionais em 2001, foi o que aconteceu com navegador neozelandês Peter Blake "Senhor dos Mares", assassinado em Fazendinha. A mais nova noticia internacional foi o da família americana vítima de piratas no Pará é já localizada e estão retornando a seu país.  Adam Harris Harteau, de 39 anos, e Emily Faith Harteau, de 37, e as duas filhas, foram encontrados por ribeirinhos perto do rio Jacaré-Grande, de acordo com pescadores.
 
O caso

A família viajava pelo Pará estava na balsa com seu moto-hoje, onde vivem já faz cinco anos, quando a embarcação foi invadida por assaltantes, conhecidos como “piratas”. Eles e outros passageiros tiveram pertence roubados.
Após o crime, a polícia fez buscas perto do local e conseguiu reaver alguns objetos. Entre eles, um notebook da família americana, usado para portar fotos da jornada pela América Latina. As imagens eram compartilhadas nas redes sociais, onde os Harteau têm mais de 120 mil seguidores.
Ao retornar até a balsa para entregar o computador, a família americana não foi encontrada. Segundo a Segup, no automóvel que Adam e Emily conduziam na balsa, havia uma pequena quantidade de maconha. “Não se sabe realmente o porquê eles saíram da embarcação. Se saíram motivados do susto em decorrência do fato, ou talvez com medo da atuação da polícia dentro da situação. Não se sabe se o medo era porque estavam com certa quantidade de droga, que teria sido apreendida em Macapá pela Polícia Federal. O fato é: após a polícia sair para fazer as diligências, eles saíram da embarcação”, concluiu Cunha.

Os crimes no Amapá

Os furtos, roubos e ataques de piratas a embarcações na Região Norte do Brasil preocupam o setor de transporte fluvial de cargas e passageiros. Os principais alvos dos criminosos são as embarcações, que navegam nos rios que banham os estados do Amazonas, Pará, Amapá e Rondônia. Casos de latrocínios – roubos seguidos de mortes – são registrados nessas regiões.
No Amapá, esses fatos são recorrentes e já estão atingindo até os pecuaristas, que possuem pessoal para proteger seus patrimônios, mas, vem sofrendo com as ações desses criminosos. 
O município de Santana por ser uma cidade portuária essas ações acontecem constantemente, os roubos acontecem nas embarcações aportadas nos portos, o que não é muito diferente do que acontece na Somália, onde os piratas aguardam a passagem dos grandes navios para os abordarem e os “limparem” dos produtos.
Os piratas dos rios amazônicos gostam de atacar quando a noite cai, usando máscaras de esqui, invadem as embarcações enquanto dezenas de passageiros dormem nas redes. De repente, eles acordam com rifles apontados para suas cabeças.
Os homens armados levaram dinheiro, joias, smartphones, combustível e até comida, forçando todos a ficarem deitados de bruços no convés. Depois, desapareceram em lanchas pelas via navegável em plena escuridão.

 

"Todo capitão de barco fluvial sabe estar à mercê desses desgraçados", disse o capitão Paiva, de 41 anos, que cruza os rios das florestas tropicais brasileiras desde que era adolescente. "Tivemos sorte de não ter sido pior", ele acrescentou que o pior é quando acontece ataques nos quais passageiros foram estuprados, torturados ou mortos.
Os piratas costumam usar lanchas, obtendo uma rapidez e uma agilidade desconhecidas pelos grandes barcos fluviais. Os piratas costumam vir de áreas urbanas pobres ou de vilarejos ribeirinhos distantes, atacando moradores da floresta que se valem de barcos para comprar alimentos, visitar parentes ou procurar assistência médica nas cidades amazônicas.

A população amazônica a mercê


Barcos de pesca perto de uma doca em Santana, próximo à capital Macapá Foto- Dado Galdieri-The New York Times

São mais de 25 milhões de habitantes da Região Amazônica e desse número mais de 5 milhões são moradores ribeirinhos que vivem em comunidades isoladas e sãos os mais atingidos e os que estão alarmados em relação à pirataria.  A Amazônia também é uma das regiões mais pobres do Brasil, e o crime organizado se espalhou, alimentando uma sensação de desrespeito à lei na grande bacia do rio. Em vilas ribeirinhas remotas, os moradores reclamam que os barcos da polícia raramente se aventuram pelos igarapés onde ocorrem muitos dos ataques piratas.

"Não existe lei no Rio Amazonas", afirmou Odete Souza França, de 49 anos, cuja família ganha a vida pescando e cultivando açaí.
Ela descreveu um ataque recente no qual os piratas abordaram a canoa de seu filho de 17 anos, amarraram-no e roubaram seu aparelho de GPS e um botijão de gás de cozinha. Sua descrição foi publicada no jornal “The New York Time”.



 Ações da polícia amapaense

Os piratas agem e as forças policiais lutam para conter o crime, que culminou em uma série de eventos recentes que apavoraram as tripulações e os passageiros dos barcos.
Porém, existe um aspecto legal, quando as ações da polícia, a jurisdição, a Polícia do Amapá que recebe as denúncias dos moradores das ilhas paraenses, não podendo agir, pois, é área de responsabilidade da polícia paraense.
No 16º Fórum de Governadores da Amazônia Legal e representantes de 23 estados defenderam a criação de um Sistema Nacional de Segurança para combater o narcotráfico. A proposta foi apresentada durante o Encontro de Governadores do Brasil pela Segurança e Controle das Fronteiras – Narcotráfico, uma emergência nacional, que ocorreu na capital acreana, Rio Branco e que virá ajudar a solucionar os problemas de combate à criminalidade praticada pelos piratas em rios da Amazônia.
Pois, mesmo sendo um caso de polícia estadual, muitas vezes acontecem crimes que passam para orbita federal como os casos de estrangeiros atingidos por esse tipo de criminalidade.
É o caso lamentável (e constrangedor para os brasileiros) a perda de Blake há 16 anos e não foi suficiente para que medidas de segurança fossem tomadas para melhorar o policiamento das águas amazônicas.
Agora, diante da escalada dos casos de crimes cometidos contra barcos de transporte e de turismo nos rios da Amazônia, parece que há uma iniciativa de aumentar a fiscalização e a presença das autoridades policiais e da Marinha nas águas, mesmo não sendo responsabilidade desse órgão nacional de defesa.

O episódio nos faz retornar a um tema fundamental. O Brasil precisa ter uma Guarda Costeira, que haja na segurança da navegação no nosso litoral, rios e hidrovias. O Brasil deve ser o único país com grande extensão de águas navegáveis a não contar com uma Guarda Costeira.

A polícia faz o possível
"Pegar piratas é como combater guerrilheiros. Eles são inimigos evasivos que tiram proveito do conhecimento das correntes fluviais, da geografia e da topografia", comparou o capitão Lúcio Lima, chefe da unidade de operações especiais da polícia do Amapá que caça bandidos pelo rio.

Aqui em Macapá, cidade com 370 mil habitantes, um esquadrão de elite de policiais camuflados do Batalhão Ambiental patrulha regularmente o Rio Amazonas em busca de piratas, chamados de ratos d'água na região. O batalhão ambiental do Estado do Amapá é composto por 135 membros.

Um píer para ajudar no combate aos “ratos d’água” deverá ser construído no distrito da Fazendinha, a 9 quilômetros de Macapá, informou a Secretaria de Estado da Justiça e Segurança Pública (Sejusp). O projeto ainda está em formatação e a licitação deve acontecer até o fim de 2017, confirmou a instituição.
No local devem aportar embarcações de órgãos da segurança pública, que atuarão de forma integrada, como a Polícia Militar (PM) e a Marinha do Brasil. A construção e a conclusão da obra não têm previsão para acontecer.
“Estamos na fase de estruturar os nossos projetos e um deles é construir um píer integrado de órgãos da segurança pública na Fazendinha, para nos ajudar na patrulha em nossos rios, com a polícia das embarcações e a Marinha, que pode nos ajudar muito com a logística”, disse o titular da Sejusp, Ericlaudio Alencar.
De acordo com o secretário, os ataques têm acontecido principalmente na rota de rios entre Macapá e Belém (PA). A ideia do píer é de atuação preventiva e ostensiva nos rios do Amapá.
“Os ataques têm acontecido principalmente em embarcações que fazem o trajeto Macapá-Belém, por esses rios. Geralmente os ataques acontecem nas águas sob jurisdição do Pará, mas cabe a nós nos precavermos aqui também. A Marinha dispõe de tecnologia para nos ajudar com informações e monitoramento”, falou Alencar.
Segundo a Sejusp, o píer deve ser construído com uma emenda federal de R$ 90 milhões repassadas ao estado em fevereiro, com destinação à segurança pública. A previsão é de que a licitação aconteça ainda em 2017.


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