sexta-feira, 4 de maio de 2018

ENTREVISTA João Bosco Soares um juiz diferente


ENTREVISTA

João Bosco Soares um juiz diferente



O juiz federal João Bosco Soares é responsável pela 2ª Vara da Justiça Federal no Amapá, e sua atuação no Estado tem se destacado com tomadas de decisões judiciais de importância social que beneficiam diretamente a população amapaense. Em uma conversa com a editoria do Tribuna Amapaense falou sobre algumas ações importantes no judiciário federal amapaense, como as ações civis públicas que visam a universalização da água tratada e da rede de esgoto em Macapá e Santana, que ele considera ser sua principal contribuição. E também fez uma avaliação de sua vida no Amapá, falou sobre política, conflitos com membros do MP, e de sua atuação nas ações que visam beneficiar os amapaenses.


Acompanhe...

TA – O senhor nasceu em outro Estado, e assim como outros brasileiros decidiu morar no Amapá. Em que circunstâncias o senhor veio morar aqui e em que ano? 


JB – Vim para o Amapá no ano de 1998, como juiz federal substituto. Nessa condição, juiz federal substituto, fiquei até o ano de 2002. Logo em seguida fui transferido para Goiânia, capital do Estado de Goiás. Regressei ao Amapá, como Juiz Federal titular da 2.a vara federal, no ano de 2005, e estou até a presente data. Fiquei porque tive e tenho uma identificação afetiva muito grande com este lugar, para o qual dei o melhor de minha vida laboral.

TA – Qual o papel atual do Juiz na sociedade? 


JB – Eu, ao menos em matéria de ações coletivas, penso que os magistrados se constituem em agentes de profundas transformações sociais e econômicas, embora ainda existam colegas com pensamentos bastante conservadores.

TA – Quais os casos o senhor lembra que julgou que mais lhe marcaram e beneficiaram a sociedade amapaense?


JB – Há muitas situações: 1) universalização do saneamento básico ( a- Macapá, pelo PAC 2, caminha para a universalização da água, que hoje só atinge 47 por cento da cidade; b- Macapá e Santana já estão sendo beneficiadas pela elaboração de um projeto executivo, via do qual se pretende construir redes de esgoto para 100 por cento das duas cidades; c- todas as cidades do Estado-membro do Amapá terão um Plano Municipal de Saneamento Básico num prazo máximo de 2 anos ); 2) viabilização do início das obras de pavimentação do trecho sul da BR 156, que liga Macapá a Laranjal do Jari; 3) viabilização da implantação do programa Luz para Todos no Amapá, que numa etapa inicial irá atingir 17 mil famílias e, em sua fase final irá atingir um total de 25 mil famílias, universalizando a entrega de energia para todos os pequenos produtores, agricultores e pecuaristas do Amapá; 4) Colaboração decisiva para viabilizar a construção de 4400 unidades habitacionais no residencial Macapaba e também na construção de mais 5 mil unidades habitacionais que compõe o residencial Miracema, o qual já possui 1000 unidades já aprovadas pelo Ministério de Estado das Cidades. Há muitas outras coisas que me orgulho...


TA – Fale um pouco sobre os empecilhos burocráticos que impediam a pavimentação do trecho sul da BR 156, que liga Macapá a Laranjal do Jari. Todos já foram resolvidos a contento? 


JB – Através de uma ação civil pública ajuizada pelo município de Laranjal do Jari resolvemos os principais gargalos que impediam o começo da obra de pavimentação dessa rodovia. Por exemplo, suprimos, no curso da ação, todas as falhas do PBA (Plano Básico Ambiental), como, por exemplo, deficiência dos estudos arqueológicos, campana de fauna, inventário florestal, sem o qual o Ibama não expede a licença ambiental para o início das obras. Tudo isso foi viabilizado sob a coordenação e batuta da Justiça. A previsão é que essa obra de pavimentação irá começar a ser executada ainda no início do verão deste ano, 2018, ou seja, no mês de julho. Isso também me orgulha muito. Fez valer minha devoção pela magistratura.

TA – O senhor determinou que fosse retomado o projeto da obra da ponte sobre o Rio Jari, no município de Laranjal do Jari, distante cerca de 260 km de Macapá. A construção da obra, que ligaria os municípios de Laranjal do Jari (AP) e o distrito de Monte Dourado, no Pará (PA), iniciou em 2002, mas está paralisada desde o ano de 2009, devido às suspeitas de desvio de recursos destinadas a obra. Já aconteceu uma Audiência Pública naquele município, e em que conclusão chegou, vai ter continuidade a obra da ponte? 


JB – Já fizemos uma primeira Audiência Pública. Inclusive, a pedido do próprio município de Laranjal do Jari, já determinamos que, doravante, tal obra será executada pelo DNIT. Creio que até o ano que vem, 2019, poderemos ter a retomada da obra da ponte sobre o Rio Jari, que liga, por terra, o Amapá ao Para e, portanto, o Amapá ao resto do Brasil, através da cidade de Santarém. Já estamos articulando, na mesma ação civil pública, com o Ministro de Estado dos Transportes, a pavimentação do trecho compreendido entre Laranjal do Jari e Santarém, no Pará. Isso, de fato, ligará o Amapá ao restante de todo o Brasil.


TA – E o Hospital Metropolitano de Macapá? Continua a obra parada e está sendo depredado?


JB – Boas notícias também quanto a essa obra, pois a Justiça Federal articulou um termo de cooperação entre o município de Macapá e o Estado – membro do Amapá, pelo qual irá haver uma atualização do projeto executivo. Em seguida, o município irá licitar e concluir a obra, que será mantida pelo Estado – membro do Amapá. Calculo que até 2021 essa obra será entregue à população amapaense e, dentre outros benefícios, contribuirá para descongestionar o Hospital de Emergência.


TA – O Amapá não tem creche. Macapá é a única capital sem essas instituições. A cidade tem duas creches prontas e não estão funcionando há mais de cinco anos. Como o senhor pode agir para isso ser resolvido?


JB – Nesse caso, nada podemos fazer na justiça federal, pois não houve judicialização, seja pelo Ministério Público Federal, seja pela Defensoria Pública da União, seja por qualquer outra entidade ou mesmo por algum cidadão.

 
TA – A paralisação da execução do programa federal Luz para Todos teve nas suas decisões o destravamento burocrático. Esse programa estava praticamente morto no Amapá e foi ressuscitado pela intervenção da Justiça Federal?


JB – De fato, o Luz para todos estava paralisado no Amapá desde o ano de 2010 e, por uma articulação coordenada pela Justiça Federal foi reavivado no Amapá, de maneira que, ainda neste ano, até dezembro, 17 mil famílias de pequenos produtores, agricultores e pecuaristas serão beneficiados.


TA – Com o crescimento do Estado, o que resultou no aumento das demandas judiciais, qual a importância da construção da nova sede da Justiça Federal no Amapá, que é considerada a infraestrutura mais bonita e funcional do nosso país e que veio contribuir para uma Justiça federal amapaense ainda mais célere?


JB – A construção da nova sede da justiça federal deve ser um motivo de muito orgulho para os amapaenses. Algo que ficará para sempre. Mas não podemos nos esquecer que tanto a Bancada Federal, então sob coordenação do ex-Senador Gilvan Borges e o Conselho da Justiça Federal, então presidido pelo ex-Ministro Ari Pargendler, foram fundamentais. O Ministro Ari Pargendler foi alguém que, verdadeiramente, mereceu o título de cidadão honorário amapaense, pois foi nosso verdadeiro amigo. Isso o tempo mostrou. Com a nova sede dobramos o número de varas federais, ou seja, saltamos de 3 para 6 varas federais, só na capital. Ora, isso melhorou substancialmente a qualidade da nossa prestação jurisdicional.


TA – O Senhor teve atuação determinante para a vinda de mais 3 varas federais, que agiliza brutalmente o andamento e julgamento das ações que tramitam pela Justiça Federal do Amapá, porém estão ameaçadas de serem extintas por decisão do corregedor nacional de Justiça, ministro João Otávio de Noronha, de remanejar para Brasília as varas federais de Oiapoque e Laranjal do Jarí e a 4ª Vara Criminal de Macapá. Como está esse imbróglio no CNJ?


JB – Esse é um fato tão injusto e dolorido que, no momento, não vejo nenhuma conveniência em comentar.


TA – A questão habitacional e a fixação de cidadãos em áreas insalubres, sempre foram uma preocupação para o senhor como magistrado e seu desempenho em processos judiciais coletivos que resultaram e ainda resultarão na construção de milhares de casas populares na cidade de Macapá, pelo programa ‘Minha Casa, Minha Vida’ estão a contendo ou precisa de mais ações?

JB – Eu só enxergo um caminho para o Amapá, vale dizer, remanejar das áreas de ressacas todas as famílias, através de programas habitacionais apoiados pela União, Ministério de Estado das Cidades. Qualquer alternativa fora disso é desumana. A ocupação das ressacas ofende regras de direito ambiental e também de saúde e segurança pública, logo, não podem subsistir moradias nesses locais. Quanto a isso, faço também ácidas críticas à incapacidade dos municípios de Macapá e Santana em fazer um bom Plano Diretor que planeje humana, racional e tecnicamente a ocupação do espaço urbano, pois estamos crescendo a esmo, sem rumo algum, de forma absolutamente desordenada e irresponsável. Pagaremos um alto preço no futuro pelos erros no presente.


TA – O seu relacionamento político-partidário é abrangente?


JB – Não tenho e nunca tive relacionamento político-partidário, ao contrário, primo pela imparcialidade e pelo interesse público.


TA – Seus críticos dizem que suas atuações estão fora do âmbito de um magistrado, que o senhor pretende alcançar poder político. Como o senhor avalia?


JB – Meus críticos não estão familiarizados com modernas doutrinas jurídicas, sobretudo as que dizem respeito ao controle jurisdicional de políticas públicas, onde se torna indispensável a judicialização da política. Na verdade, cumpro, dentro das leis e da Constituição, o meu papel de magistrado.


TA – O senhor chegou a ter um conflito com membros do MPF no Amapá. Como é sua relação atual com os procuradores?


JB – Com membros do MPF amapaense tenho um bom relacionamento e, no que depender de mim, continuará dessa forma. Quanto ao Ministério Público Estadual é sabido de todos que já denunciei corrupção de alguns de seus membros. Não só eu como também muitos amapaenses, de bem, aguardam até hoje uma investigação que, infelizmente, não houve, já que o Conselho Nacional do Ministério Público preferiu engavetar e, desse modo, optou por preservar o esquema criminoso denunciado formalmente.

TA – Sua presença é constante nos acompanhamentos técnicos das obras sociais no Amapá, esse é um diferencial seu? Pois a maioria dos magistrados permanecem nos gabinetes, porém isso já lhe trouxe complicações junto a Corregedoria Geral do CNJ, a ministra Eliana Calmon em 2013, considerou haver indícios suficientes para a deflagração de processo administrativo disciplinar contra “descumprimento reiterado das determinações impostas pela Corregedoria Regional da 1ª Região, especialmente no que se refere à abstenção de participação ativa do magistrado em solenidades de conotação política (…)”. O que resultou? 


JB – São fatos já superados, pois fui absolvido quase que, por unanimidade, pelo CNJ, o qual, inclusive, reforçou o acerto do meu procedimento, enquanto magistrado.


 
TA – Uma das suas últimas decisões foi suspender por 90 dias a execução do reajuste de energia elétrica pela CEA, esse prazo acaba no fim de maio, a pedido da Fecomércio, que sustenta que a revisão tarifária realizada pela CEA, em novembro do ano passado, sob a autorização da Aneel, provocou grave atentado à ordem econômica e de mercado. Como caminha o cumprimento judicial?


JB – Prefiro não responder a essa pergunta, pois essa questão está judicializada.
 
TA – Quais os planos para o magistrado e para o cidadão João Bosco? O senhor pretende continuar morando no Amapá?


JB – Quanto ao Poder Judiciário, já me sinto realizado por tudo que fiz e venho fazendo na condição de juiz de primeira instância. Aliás, ao Amapá serei eternamente grato, por ter me permitido construir uma identidade profissional, bem ainda por ter me permitido fazer, realizar, concretizar coisas de profundo alcance socioeconômico.


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