QUANDO CHEGUEI EM MACAPÁ: A EXPERIENCIA DO HOSPITAL S. CAMILO
Por JARBAS ATAÍDE
Vamos continuar relembrando minha trajetória de vida na profissão médica, na série: “QUANDO CHEGUEI EM MACAPÁ”, há 34 anos.
Lembro de minha chegada na cidade “joia da Amazônia”, no final da década de 80, naquele sábado,30.01.1987, vindo do Oiapoque, numa viajem no avião “búfalo” do Exército. Iniciante na profissão (2 anos), mas com a experiencia da fronteira amazônica, endêmica das arboviroses, Malária e Leishmaniose, que aprendi a tratar nas enfermarias sombrias da Santa Casa de Misericórdia, em Belém.
Iniciei pela Politec (DPT) em 1987, como Médico Legista, vendo e examinando corpos frios, marcados pela violência e o submundo do crime. Só senti o impacto, quando, já em maio de 1987, fui realizar uma exumação justamente donde tinha vindo: do Oiapoque, ou seja, desenterrar da cova um corpo em decomposição, vítima de morte violenta. Minha esposa disse que fiquei estranho e mofino, como diz o caboclo nortista.
Depois das condições mínimas enfrentadas no meio da floresta amazônica e nas enfermarias da Formação Sanitária de Clevelândia do Norte, tive o privilégio de agora atuar no primeiro hospital privado de Macapá, o Hospital São Camilo, que iniciou sua construção em 1964, em plena época do golpe militar, pertencente à Fundação Marcelo Candia. Fui admitido em abril de 1988, já começando no Pronto Atendimento.
O construtor do Hospital, o farmacêutico e industrial Dr. Marcelo Candia, que dedicou sua vida às obras humanitárias, a convite do Bispo Aristides Piróvano, empregou sua herança e doações generosas na edificação dessa grande construção, que tinha o cunho humanístico de atender os mais humildes e pobres moradores da cidade.
Mesmo estando numa transição do governo militar para o civil, na gestão interina de Jorge Nova da Costa (1986-1989), após a sofrida morte de Tancredo Neves e a posse do vice, José Sarney, percebi que não houve declínio na assistência. O atendimento básico era feito nos poucos postos de saúde, que cobriam vários bairros em formação, como Congos, Laurindo Banha e Zerão.
As gestantes faziam o pré-natal, preventivo e a assistência materna; as crianças acompanhavam o crescimento e desenvolvimento; os programas do Ministério da Saúde eram atuantes, acompanhando hipertensos, diabéticos, hansenianos, tuberculosos e outros, com retornos programados.
Quando faltava o Ginecologista, fazia o 1º atendimento da gestante, obtendo o reconhecimento da pioneira Drª. Eucléia. Poucos eram os casos transferidos para os hospitais (MML, PSOC e H. Geral). Fazíamos também a cobertura das urgências/emergências, com pequenas cirurgias, desbridamentos e suturas. Como vemos, o atendimento era eficiente e resolutivo, sem transferência de responsabilidade, como está acontecendo hoje.
Com o mínimo de exames de rotina no Laboratório (fezes, urina, hemograma, glicemia, hemoscopia e algumas sorologias), conseguíamos acompanhar os pacientes, tendo o retorno com cura e melhora das patologias. Hoje, com a ampliação dos exames, inclusive com recursos tecnológicos de imaginologia (raio x, USG, mamografia) e várias equipes do Programa de Saúde da Família, verificamos que houve declínio da assistência primária. Ao longo dos últimos 18 anos (2003-2020) tivemos um sucateamento e falta de investimento na atenção básica, em todos os sentidos.
Com 28 anos, em plena juventude e recém-casado com Marcia Ataíde, com quem casei em ago/87. Morei nas Av. Goitacazes, Caramuru e Tupiniquins. Em 1988 mudei para o recém-criado bairro do Congos, onde morei 12 anos. No meio dos mais necessitados, que moravam na beira da ressaca, financiei a construção do Centro Comunitário “Marcelo Candia”, onde instalei o Posto Médico do “Barreiro”, que atuou por 5 anos (91-95). Foi um período de militância na ação católica, nas CEBs, na Pastoral da Saúde, e de grande crescimento espiritual na Igreja Mãe da Igreja, ainda em construção pelo padre italiano João Belli.
As lembranças fluem. Isso sem falar nos cansativos plantões noturnos e de final de semana na Polícia Técnica, Pronto Socorro e Hospital S. Camilo. Foi assim, repletos de decisões e relatos, que aconteceu “Quando cheguei em Macapá”. 04.02.2021 (263 a de Macapá). JARBAS ATAÍDE.
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